domingo, 28 de dezembro de 2008

Sete Vidas

Exagero

Nos últimos anos, Will Smith vem tentando mudar sua imagem. Ator de enorme sucesso, seguramente o que leva mais espectadores às salas de cinema hoje, ele tem procurado se mostrar não apenas como uma estrela, mas também como um ator capaz de interpretações realmente significativas e consistentes. Exemplos disso são filmes como “Eu Sou A Lenda” o qual, em que pese tratar-se de uma ficção científica repleta de ação, dá espaço para que Smith trabalhe seus dotes interpretativos; e, principalmente, “À Procura da Felicidade”, longa que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de melhor ator.

E foi lembrando do sucesso obtido tanto artisticamente quanto comercialmente por “À Procura da Felicidade” que Smith resolveu apostar na mesma parceria com o diretor Gabriele Muccino. Aliás, decidiu não só repetir a parceria com o diretor como também o tom dramático da narrativa. “Sete Vidas”, o resultado desse novo trabalho em conjunto, é, tal como o anterior, um daqueles filmes para fazer você chorar, cheio de manipulações e elementos postos no roteiro para fisgar o espectador. Além de, neste caso, uma certa dose de exagero.

A trama fala de Ben Thomas (Smith, competente, embora já tenha tido atuações melhores), um auditor da Receita Federal dos EUA que busca ajudar sete pessoas. No entanto, para que elas recebam tal ajuda, ele investiga se as mesmas são merecedoras, se são ou não bons seres humanos. Muito embora esta premissa não seja corriqueira, ela, desde já, mostra-se bastante presunçosa. Afinal de contas, trata-se de um ser humano julgando outros como merecedores ou não de serem ajudados. Mas quem é Ben Thomas para se atribuir tal missão? O novo Jesus Cristo? Deus?

À parte essa discutível questão ético-filosófica, o roteiro (escrito por Grant Nieporte, em seu primeiro trabalho no cinema) é bastante eficiente em esconder, nos primeiros momentos, quais a verdadeiras intenções de Ben e suas motivações. Até mesmo pela narrativa em flashback, que inicia com o protagonista tentando suicídio em uma banheira e ligando para o serviço de emergência para informar justamente sobre o seu estado. Além disso, mostra-nos um personagem inconstante, que não nos desperta uma simpatia imediata, já que alterna momentos de agressividade com outros igualmente afáveis.

Aos poucos, Ben conhece os personagens com quem travará uma relação mais próxima no decorrer do longa, entre eles Ezra (Woody Harrelson, em boa atuação), um cego que trabalha em um serviço de atendimento por telefone, e Emily, uma mulher ainda jovem que sofre de um grave problema cardíaco que pode levá-la à morte a qualquer momento. Interpretada de forma inspirada por Rosario Dawson, Emily se mostra a personagem mais interessante da projeção. A aproximação entre ela e Ben, aliás, apesar de algumas nuances que parecem forçadas no início, é o que há de mais interessante em toda a trama. A carência da personagem, compreensível pelo seu grave estado de saúde, é mostrada sem exageros, na medida certa, e a química do casal funciona muito bem.

Contudo, à medida que avança para o seu desfecho, o filme embarca no piegas e melodramático de forma irremediável e também previsível (muitos matarão a charada algum tempo antes da mesma ser solucionada na tela). E, além do piegas, o longa envereda pelo exagero, o que faz lembrar que, ao produzir e atuar em um projeto como esse (e também a julgar pelas características dos seus últimos personagens), Smith talvez esteja querendo se passar por um novo Cristo ou algo do tipo. Melhor procurar apenas imaginar que seu personagem está sofrendo de uma depressão irremediável e que por isso comete os atos que comete. Afinal de contas, Will Smith parece ser um cara legal e não um chato pedante que quer salvar o mundo fazendo cinema.

Obs. O título em inglês, “Seven Pounds”, remete a “O Mercador de Veneza”, peça de William Shakespeare, e traduz uma situação em que alguém é levado a pagar uma dívida de forma inteiramente desproporcional.

Cotação: **1/2 (duas estrelas e meia)
Nota: 6,0

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Filmes Para Ver Antes de Morrer


A Felicidade Não Se Compra
(It's A Wonderful Life)


"Quem tem amigos nunca é um fracasso"


Há algum tempo, às vésperas do Natal, eu aguardava receber um telefonema que, naquela época, seria de grande importância. Eu estava muito interessado em uma garota e, por uma série de razões que levariam muitas linhas para explicar, receber uma ligação dela naquele momento poderia significar uma aproximação ainda maior entre nós dois. Então, precisamente no dia 23 de dezembro, o meu celular toca no momento em que eu estava assistindo a um filme que há muito vinha querendo assistir. Quem me conhece sabe que detesto ser interrompido quando estou vendo algum longa (daí minha eterna preferência por ver filmes na sala escura do cinema) e levantei para atender o telefone bastante irritado. Qual não é a minha surpresa quando vejo o nome dela na tela do aparelho e, de repente, senti-me invadido por uma onda de alegria.

O filme a que eu estava assistindo era justamente “A Felicidade Não Se Compra”, clássico absoluto do cinema norte-americano dirigido por Frank Capra, um dos mais importantes diretores de Hollywood. E talvez este seja seu longa definitivo, aquele que representa melhor o seu cinema otimista imbuído dos melhores valores que caracterizaram o sonho americano.

Hoje um tanto quanto esquecido, Capra foi um dos diretores mais populares durante o período da grande depressão e da segunda grande guerra. As pessoas costumavam aguardar ansiosamente as suas estréias, sendo seus filmes grandes sucessos de público e crítica, tais como “A Mulher Faz O Homem” e “Do Mundo Nada Se Leva”. Todavia, “A Felicidade Não Se Compra”, seu primeiro filme do pós-guerra, acabou não obtendo o sucesso esperado, principalmente junto à crítica, que o considerou exageradamente otimista num tempo em que se buscavam obras com caráter mais realista e menos “manipulador”. Ao longo dos anos, entretanto, e felizmente, o reconhecimento deste belo filme foi crescendo cada vez mais. Devido a uma série de meandros jurídicos que aqui se tornam inteiramente dispensáveis, o longa caiu em domínio público de forma prematura, o que acabou levando várias emissoras a exibirem-no durante as festas de fim de ano. Fato que, por sinal, transformou-se em algo quase religioso nos EUA. Em todo Natal ele é exibido, o que o coloca como um dos filmes mais populares em todos os tempos na terra do Tio Sam. E, é bom dizer, com todos os méritos.

A narrativa trata da vida de George Bailey, personagem interpretado por um dos atores mais carismáticos do cinema, James Stewart. George é um bom homem, querido por todos em Bedford Falls, pequena cidade onde vive desde a infância. Apesar do amor que sente pela comunidade, George tem um espírito aventureiro e sonha em viajar pelo mundo. Todavia, as obrigações e seu senso de responsabilidade parecem sempre impedir a concretização de seus desejos aventureiros. Após a morte do pai e seu casamento com Mary (Donna Reed), George passa a administrar a cooperativa habitacional de Bedford Falls, tornando-se alvo do inescrupuloso Sr. Potter (Lionel Barrymore, perfeito no papel do vilão), poderoso empresário local que pretende se tornar uma espécie de dono da cidade e, obviamente, os Bailey se tornam um obstáculo neste sentido. Fazendo de tudo para atingir seus objetivos sórdidos, Potter leva George a uma situação quase inescapável, um beco sem saída. George então vai até a ponte da cidade tentar o suicídio, em uma noite de Natal, quando Clarence (Henry Travers), um anjo de segunda classe que ainda precisa ganhar suas asas, salva Bailey, muito embora não consiga demover a sua idéia de que era melhor que nunca tivesse existido. Para convencê-lo de que está errado, o anjo faz com que George veja como seriam as vidas das pessoas que o cercam caso ele, de fato, nunca tivesse existido.

Esta alegoria do “O que aconteceria se...” mostra-se extremamente eficaz e emocionante. Copiada muitas vezes ao longo dos anos, ela revela o quanto as ações de um ser humano, por mais banal que a vida deste possa parecer, podem afetar a vivência de outras pessoas. Ademais, Capra parece extremamente preocupado com a importância dos pequenos sonhos. Afinal, Bailey tem lá seus devaneios aventureiros, mas é naquela comunidade e no seio de sua família que ele de fato se realiza, se torna um homem feliz.

É interessante também perceber o viés crítico que Capra demonstra com relação a certos elementos do capitalismo que viriam a se tornar dominantes nas décadas seguintes, mormente na sociedade americana. O personagem de Potter representa claramente aquilo que a América viria a ser: o símbolo do dinheiro como um fim em si mesmo, ideário que se mostrou um fracasso diante da atual crise mundial do sistema. Contrapondo-se a isso, temos o personagem de Bailey, o qual representa o que poderíamos chamar de “capitalismo ideal”, em que o individual não suplanta o coletivo. Neste aspecto, é mais interessante ainda notar que o filme realmente não envelheceu, permanecendo bastante relevante (curioso como o sonho da casa própria continua sendo tão difícil depois de décadas). Cabe também destacar que o longa muitas vezes se mostra como uma comédia de costumes, tendo várias tiradas de conotação sexual.

Além de suas matizes temáticas, “A Felicidade Não Se Compra” mostra-se uma aula de cinema em seus aspectos técnicos. Com uma interessante narrativa em flashback, a qual nos mostra a infância e juventude de George até chegarmos ao momento crucial de seu desejo de suicídio, Capra demonstra como contar uma boa história prendendo o espectador do início ao fim, com um roteiro primoroso (suas eventuais elipses devem ser creditadas à edição que chegou aos nossos dias, que não é a mesma da original). As atuações também são impecáveis. James Stewart está brilhante e Lionel Barrymore, como ressaltado acima, empresta uma caracterização perfeita para o vilão Sr. Potter, mesmo que possam alguns taxá-la de caricatural, o que neste caso não é um problema. A intenção de Capra é mesmo colocar o preto-no-branco. Seus personagens são arquétipos sociais e estão postos ali para compreendermos claramente a mensagem que o diretor pretende passar.

Bem, o mais importante ao concluir esta resenha é afirmar: este é um filme realmente emocionante, daqueles capazes de fazer chorar o mais cético dos corações. Se você não se emocionar, talvez seja porque está faltando algo de humano em sua pessoa. Uma obra para a posteridade, para ser vista através de gerações, o tipo de filme que gostaríamos de ter a oportunidade de mostrar para os nossos filhos. Portanto, se você está procurando um filme “família” para ver neste Natal, não tenha dúvidas: “It’s a Wonderful Life” é insuperável neste quesito. Garanto que no próximo Natal todos desejarão revê-lo.

Ah, mas e aquela história que eu contei no início da resenha, como terminou? Bem, deu tudo errado. Hoje, praticamente nem nos falamos mais, trocando no máximo frios cumprimentos “por educação”. Mas... o que realmente importa é que naquele dia tive a real sensação de que a felicidade, verdadeiramente, não se compra (por mais clichê que isso possa parecer). Nenhum dinheiro do mundo compensaria a alegria daquele telefonema...

Obs. Frank Capra, em visita ao Brasil alguns anos depois do lançamento do filme, acabou se surpreendendo com o título brasileiro, considerando-o melhor que o original. Creio que ele tinha razão. ;)

Cotação e nota: Obra-prima.

________________________________________

Um ótimo Natal e um 2009 repleto de realizações para todos!

Um abraço do tamanho de sua felicidade!

Fábio Henrique Carmo!

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Indicados ao Globo de Ouro

Foi divulgada hoje a lista de indicados ao Globo de Ouro 2009, o mais importante prêmio da indústria norte-americana depois do Oscar. Na minha última postagem, noticiei que a campanha de marketing da Warner para a premiação póstuma de Heath Ledger começava a gerar seus frutos. E aqui temos mais uma prova: o falecido ator encontra-se entre os finalistas na categoria melhor ator coadjuvante-drama. Mas aqui também vai uma crítica: não só o Globo de Ouro, como alguns outros prêmios de gabarito (por exemplo, o da Associação de Críticos de Nova York) vêm ignorando solenemente "O Cavaleiro das Trevas" em outras categorias, como filme, à exceção da Associação de Críticos de Los Angeles, que colocou Batman em segundo lugar entres os melhores filmes de 2008 (perdeu para Wall-E) . E eu só posso atribuir essa atitude a puro preconceito com os filmes baseados em HQs de super-heróis. Como também me parece preconceito a ausência de Benício Del Toro nessas premiações. Talvez premiar uma interpretação de Che Guevara ainda seja demais para os americanos.

Bem, mas falando especificamente do "Globo de Ouro", que está em sua 66ª edição, os filmes com mais indicações na categoria drama foram "O Curioso Caso de Benjamin Button" , de David Fincher, "Frost/Nixon", de Ron Howard, e "Dúvida" de John Patrick Shanley. Na categoria comédia, destaca-se "Vicky Cristina Barcelona", com 4 indicações, que já resenhei aqui no blog (confira mais abaixo). Por sinal, a Penélope Cruz está papando todos os prêmios até agora como atriz coadjuvante. Confira a lista completa dos indicados na área de cinema (não me venham pedir séries, por favor):

Melhor filme - Drama
Apenas um Sonho
O Curioso Caso de Benjamin Button
Frost/Nixon
The Reader
Slumdog Millionaire

Melhor filme - Comédia ou musical
Na Mira do Chefe
Mamma Mia!
Queime Depois de Ler
Simplesmente Feliz
Vicky Cristina Barcelona

Melhor diretor
Danny Boyle (Slumdog Millionaire)
Stephen Daldry (The Reader)
David Fincher (O Curioso Caso de Benjamin Button)
Ron Howard (Frost/Nixon)
Sam Mendes (Apenas um Sonho)

Melhor atriz (drama)
Anne Hathaway (O Casamento de Rachel)
Angelina Jolie (A Troca)
Kristin Scott Thomas (Il y a Longtemps que je T'aime)
Meryl Streep (Dúvida)
Kate Winslet (Apenas um Sonho)

Melhor ator (drama)
Leonardo DiCaprio (Apenas um Sonho)
Frank Langella (Frost/Nixon)
Sean Penn (Milk – A Voz da Igualdade)
Brad Pitt (O Curioso Caso de Benjamin Button)
Mickey Rourke (The Wrestler)

Melhor atriz (comédia ou musical)
Rebecca Hall (Vicky Cristina Barcelona)
Sally Hawkins (Simplesmente Feliz)
Frances McDormand (Queime Depois de Ler)
Meryl Streep (Mamma Mia!)
Emma Thompson (Last Chance Harvey)

Melhor ator (comédia ou musical)
Javier Barden (Vicky Cristina Barcelona)
Colin Farrell (Na Mira do Chefe)
James Franco (Segurando as Pontas)
Brendan Gleeson (Na Mira do Chefe)
Dustin Hoffman (Last Chance Harvey)

Melhor filme estrangeiro
The Baader Meinhoff Complex (Alemanha)
Everlasting Moments (Suécia)
Gomorra (Itália)
Il y a longtemps que je t’aime (França)
Waltz with Bashir (Israel)

Melhor filme de animação
Bolt - Supercão
Kung Fu Panda
Wall-E

Melhor atriz coadjuvante
Amy Adams (Dúvida)
Penelope Cruz (Vicky Cristina Barcelona)
Viola Davis (Dúvida)
Marisa Tomei (The Wrestler)
Kate Winslet (The Reader)

Melhor ator coadjuvante
Tom Cruise (Trovão Tropical)
Robert Downey Jr. (Trovão Tropical)
Ralph Fiennes (A Duquesa)
Phillip Seymour Hoffman (Dúvida)
Heath Ledger (Batman – O Cavaleiro das Trevas)

Melhor roteiro
O Curioso Caso de Benjamin Button
Dúvida
Frost/Nixon
The Reader
Slumdog Millionaire

Melhor trilha sonora
O Curioso Caso de Benjamin Button
Defiance
Frost/Nixon
Slumdog Millionaire
A Troca

Canção

“Down to Earth”, música de Peter Gabriel, letra de Peter Gabriel e Thomas Newman) - Wall-E
“The Wrestler” música e letra de Bruce Springsteen - The Wrestler
“I Thought I Lost You”, música e letra de Miley Cyrus e Jeffrey Steele - Bolt - Supercão
"Gran Torino", música de Clint Eastwood, Jamie Cullum, Kyle Eastwood, Michael Stevens, letra de Kyle Eastwood, Michael Stevens - Gran Torino
"Once in a Lifetime", música e letra de Beyoncé Knowles, Amanda Ghost, Scott McFarnon, Ian Dench, James Dring, Jody Street - Cadillac Records

Para concluir: 1) Tom Cruise indicado como coadjuvante por "Trovão Tropical"...????; 2) Não confiem no Globo de Ouro como termômetro para o Oscar. Já faz um tempo que isso deixou de ser verdade. A entrega do prêmio está marcada para 11 de janeiro.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Já Começou


A campanha promovida pela Warner para que Heath Ledger seja premiado postumamente pelo seu desempenho em "Batman - O Cavaleiro das Trevas" já começou a dar seus frutos. Ele foi escolhido como melhor ator na premiação da AFI, o instituto de cinema australiano, em uma categoria que engloba atores de todo o mundo. Ele foi aplaudido de pé enquanto sua irmã, Kate, lhe representava recebendo o prêmio. A Warner vem até pagando anúncios nas principais revistas de cinema para promover a candidatura de Ledger ao Oscar. Pelo que podemos vislumbrar, a próxima edição da premiação da Academia de Hollywood será disputadíssima no quesito melhor ator. Além de Ledger, serão possíveis indicados Benício Del Toro, por Che; Clint Eastwood, por Gran Torino e Mickey Rourke, por The Wrestler. Mas é provável que Ledger seja indicado como coadjuvante, (como denuncia a imagem acima, um dos anúncios) o que praticamente lhe garantiria a láurea. Aguardemos.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Dica de Livro


Esta semana adquiri um exemplar do livro "1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer". É bastante interessante o apanhado realizado nesta obra, trazendo filmes dos primórdios do cinema, como "Viagem à Lua", até obras contemporâneas como a trilogia "O Senhor dos Anéis". Todavia, o que mais me chamou a atenção foi o fato de, mesmo em uma lista com 1001 filmes, ainda ocorrerem grandes injustiças e até absurdos. O mais notável neste quesito é a ausência "O Grande Ditador", um dos filmes mais famosos de Charles Chaplin, genial e até inquestionável e "Um Dia Muito Especial", de Ettore Scola, um dos mais belos filmes da história do cinema. Contudo, também fiquei espantado com a quantidade de filmes brasileiros presentes, até porque entre os críticos responsáveis pela seleção não há um brasileiro sequer. Recomendo a todos, tanto aos iniciantes quanto aos graduados. Essas listas sempre servem como referência e o preço é bem em conta (principalmente se levarmos em consideração a quantidade e qualidade de suas páginas).

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Vicky Cristina Barcelona


Esse inconstante ser humano...

Créditos iniciais com fundo preto, letras brancas e elenco disposto em ordem alfabética. Assim, sem nenhuma pompa ou estrelismos começam todos os filmes de Woody Allen, o genial diretor nova-iorquino, um dos grandes autores do cinema contemporâneo. Pode parecer estranho, mas foi a primeira vez que acompanhei esses créditos em uma sala de cinema. Todos os filmes anteriores de Allen tinha visto em casa, seja através de vídeo/DVD, seja nos canais de televisão. Interessante que a minha primeira experiência com a obra de Allen na tela grande tenha sido justamente com seu filme mais latino, com aquele tom “caliente” tão comum a nós, mas um tanto distante do que ele costuma apresentar em seus filmes, onde normalmente o sexo é muito mais falado que mostrado.

Não que haja exatamente cenas de sexo em “Vicky Cristina Barcelona”. Não há, pelo menos não nos padrões explícitos do cinema atual. Mas existe um incomum clima de sedução, ameno e, ao mesmo tempo, constante (tal como a trilha sonora peculiar) que permeia toda a trama, em contraste com os relacionamentos neuróticos tão comuns na obra do renomado cineasta. Todavia, tais relacionamentos neuróticos também se fazem presentes neste novo Allen. Ou seja, o velho Woody conseguiu respirar novos ares sem deixar de lado os antigos. O resultado é que temos um filme que soa atípico em sua obra, mas cheio de notas que fazem com que reconheçamos imediatamente tratar-se de um filme seu.

Tudo começa quando as amigas Vicky (Rebecca Hall, bela e talentosa) e Cristina (Scarlett Joahansson, linda, porém um tanto “bibelô”) chegam a Barcelona para uma temporada de 3 meses em que a primeira se dedicará a um curso sobre cultura catalã. Ambas partilham gostos e interesses, mas divergem em um ponto fundamental: o que esperam do amor. Vicky vê o amor de maneira tradicional. Ela está noiva de um homem que também se pode dizer tradicional ou “fabricado em série”, como diz Cristina. Já esta não sabe exatamente o que quer, o que esperar do amor, só sabe exatamente o que não quer: aquilo que pode ser definido como tradicional.

E é em Barcelona, com seu clima cheio de tempero, que as duas conhecem o artista Juan Antônio (Javier Bardem, esbanjando talento, como de hábito), um boêmio sedutor que se interessa pelas duas e as duas acabam se interessando por ele. Enquanto Vicky, a comedida e conservadora, tenta resistir às investidas do pintor, Cristina não vê qualquer problema em se entregar rapidamente ao mesmo. Juan Antônio, por sua vez, saiu de um casamento tempestuoso, com um divórcio mais tempestuoso ainda, em que sua esposa, Maria Elena (Penélope Cruz, bela e visceral) tentou matá-lo esfaqueado. Todavia, Juan Antônio ainda a ama, e o triângulo amoroso inicial torna-se um quadrado com o retorno de Maria Elena.

É interessante como Wooy Allen sabe transportar para seus tipos a atmosfera das cidades onde suas tramas de desenvolvem. Ele consegue transformar o ambiente em mais um componente essencial da trama, um verdadeiro personagem. Caso clássico é encontrado em “Manhattan” e, para citarmos um exemplo recente, Londres também se mostra uma verdadeira personagem em “Match Point”. E aqui não é diferente. O ambiente de Barcelona, alegre, boêmio e ensolarado, estimula a sensualidade dos seus moradores e visitantes e seria difícil vermos personagens tão abertos em uma cidade friorenta e macambúzia. O maior exemplo disso é Vicky, cujo temperamento comedido não resiste às novas experiências vividas na capital da Catalunha.

Suas certezas anteriores, quais sejam, um bom casamento, desenvolvimento profissional ou aquisição de um bom imóvel como sinais de felicidade caem por terra ao conhecer Juan Antônio, o pintor sedutor que lhe traz uma nova expectativa do amor. Já Cristina, que nunca teve certeza do que queria, apenas do que não queria, vive experiências que sempre ansiou por viver até descobrir que estas também não era exatamente o que ela queria... Mesmo aqueles que encontram exatamente o que querem, como Maria Elena, têm de lidar com a dura constatação de que esta satisfação é momentânea.

Já havia algum tempo que Allen não criava personagens tão ricos e também longe de apenas representarem suas neuras. Claro que suas inquietações estão lá, principalmente representadas através das personas de Vicky e Maria Elena. Contudo, as mesmas não se limitam a isso, possuem vida e elementos próprios. De se destacar a atuação de suas intérpretes que com certeza contribuíram muito para a riqueza das personagens. Rebecca Hall traz uma aura de verdade para Vicky que impressiona, além de possuir uma beleza não óbvia que faz Scarlett Johansson tornar-se uma boneca de comercial. Claro que Scarlett é sexy, mas às vezes sua beleza um tanto clara demais acaba prejudicando, principalmente porque ela parece , nos últimos filmes, estar utilizando isso como muleta para momentos pouco inspirados de atuação. O oposto de Penélope Cruz, a qual sabe usar sua sensualidade a favor de seus papéis. Já Juan Antônio, nas sempre ótimas atuações de Javier Bardem, parece representar aquilo que Allen gostaria de ser e não é. Ou melhor, o que talvez todo homem gostaria de ser: um sedutor, capaz de atrair as mais variadas mulheres, dominando-as ao mesmo tempo que as ama. Curioso que Juan Antônio me fez lembrar do personagem de Nick Nolte em “Contos de Nova York”. Os dois parecem depender da presença feminina para produzirem enquanto artistas. O que lembra logo a idéia de que um homem fica meio perdido no mundo sem as mulheres (com certeza há algo de verdade nisso...).

Assim, com uma paleta viva de cores poucas vezes vista em sua obra (Barcelona com certeza inspira...) e um narrador em off que dá aquele tom de “conto de verão”, o velho Woody nos lembra que não existe nada que defina o amor; apenas não conseguimos viver sem ele. Assim como somos todos inconstantes, eternos insatisfeitos que não sabemos exatamente o que desejamos da vida. Por mais que tentemos planejá-la, ela nos traz grandes surpresas que nos desafiam. As certezas existem apenas para um dia descobrirmos que não eram tão certezas assim.

Obs. Allen tem, neste filme, seu momento Hitchcock, aparecendo rapidamente em uma das cenas. Tente descobrir qual é.

Cotação: ****1/2 (quatro estrelas e meia)
Nota: 9,5

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Tragédia em Santa Catarina


Amigos e visitantes do Cinema com Pimenta,

Mais uma vez abro uma exceção neste espaço para deixar de falar sobre cinema. Nestes últimos dias, acredito que todos vocês devem estar acompanhando através da mídia (seja TV, internet, revistas ou jornais) a situação caótica em que se encontra Santa Catarina, principalmente o Vale do Itajaí. Pois bem, não é apenas porque tenho amigos que moram nessa região (até porque esses amigos, graças a Deus, não perderam entes queridos ou seus bens na enchurrada), mas principalmente porque devemos lembrar que somos todos brasileiros e, antes de tudo, seres humanos, que escrevo aqui este apelo para aqueles que possam e desejem contribuir com o auxílio às vítimas naquele Estado tão famoso por suas lindas praias e mulheres idem, mas que agora precisa de nossa ajuda. Abaixo, segue o número da conta bancária aberta para as contribuições:

Banco do Brasil
Agência: 0095-7
C/C: 400.000-5
(PMB – Calamidade Pública)

Também vi no Jornal Nacional de hoje que todas as Escolas técnicas do país estarão recebendo doações para os flagelados da enchente.

Um abraço a todos!

sábado, 22 de novembro de 2008

[Rec]


Romero + A Bruxa de Blair

Desde que George A. Romero criou o chamado “filme de zumbis”, ao longo dos anos acompanhamos várias e várias novas versões da temática nas telas de cinema. O próprio Romero retomou o mote em diversas oportunidades, além de outros diretores, sempre procurando colocar em seus longas um contexto de acentuada crítica social. [Rec], longa espanhol atualmente em exibição nos cinemas brasileiros, se apresenta como mais um dos herdeiros desta tradição, muito embora não se possa designar exatamente suas ameaças como “zumbis”.

Seus humanos-monstros lembram muito aqueles de “Extermínio”, produção inglesa dirigida por Danny Boyle que se tornou cult (e também mais um dos herdeiros da tradição dos filmes de zumbi). Trata-se de uma variação moderna, em que pessoas são transformadas em monstros devido a vírus, bactérias ou outras espécies de microorganismos alterados em laboratório. Outro aspecto bem presente nos filmes do gênero que também se faz presente neste é o clima claustrofóbico, de confinamento. Quase toda a ação se passa dentro de um edifício residencial, assim como em “Madrugada do Mortos”, de Zack Snyder, quase tudo acontece dentro de um shopping center. Interessante notar que [Rec] também se mostra sucessor do gênero “realidade”, o qual teve em “A Bruxa de Blair” um de seus precursores (e recentemente representado por “Cloverfield”). Afinal, [Rec] mostra a gravação de um programa de TV chamado “Enquanto Você Dorme”, onde sua apresentadora, Ângela Vidal (Manuela Velasco, gatinha espanhola), mostra o trabalho daqueles que varam as madrugadas, tal como sugere o título. Acompanhada do cinegrafista Pablo (o próprio diretor de fotografia Pablo Rosso, que nunca aparece em cena), ela acompanha o corpo de bombeiros em uma chamada durante a madrugada. Em um condomínio residencial, uma senhora idosa está causando pânico entre os vizinhos com seus gritos assustadores. O que parecia uma ocorrência fácil, apenas uma mulher com desequilíbrio mental, vai se transformando, aos poucos, em uma situação escabrosa, a qual colocará em risco a vida de todos os presentes no edifício.

Esse estilo “realidade” é sempre uma via de mão dupla. Se, por um lado, acaba passando ao espectador a sensação de que aqueles fatos estão realmente acontecendo, por outro necessita eliminar certos elementos cinematográficos que podem ser muito úteis na construção de um clima macabro ou de suspense. O mais notável destes ingredientes extirpados é a trilha sonora. Ultimamente este importante recurso vem sendo utilizado de forma sofrível pelas produções de terror. Os diretores do gênero possuem uma tendência à histeria, colocando o volume no máximo, no rumo “quanto mais invasiva a trilha melhor”. Contudo, se bem utilizada, a trilha pode ser um ótimo elemento para compor a tensão, como bem mostrava o mestre Alfred Hitchcock em suas inesquecíveis obras (alguém é capaz de imaginar a famosa cena do chuveiro em “Psicose” sem a sua famosíssima trilha?). O resultado naturalístico obtido pelo estilo “Bruxa de Blair” de filmar soa sempre, pelo menos para mim, um tanto “meio-termo”: falta alguma coisa.

Outra característica marcante do dito estilo deixa sua marca em “[Rec]”. Como era de se esperar, a câmera trêmula na mão percorre toda a projeção e talvez seja o melhor do longa. A câmera, não é exagero afirmar, torna-se o principal personagem de toda a narrativa, da qual só vemos os acontecimentos enquanto o aparelho de Pablo está ligado. E isso é algo que realmente valoriza este produto. Quem costuma ler minhas resenhas já deve saber o quanto eu admiro o que se pode chamar de “cinema total”, ou seja, o cinema que utiliza a imagem como base para todo o desenvolvimento da ação, relegando o texto a um plano menor. Cinema é imagem e, mais uma vez repito, costumo me irritar com diretores que confundem a arte cinematográfica com o teatro (há grandes filmes “teatrais”, mas isso não significa que devamos aceitá-los como regra). E, no presente caso, os diretores Paco Plaza e Jaume Balagueró foram muito felizes em fazer da imagem o principal elemento de sua narrativa. E eles também não esqueceram de incluir bons momentos de crítica social, fazendo lembrar os longas de Romero.

Com relação às atuações,vale dizer que Manuela Velasco se mostrou bastante convincente no papel, muito embora não se possa afirmar se ela está interpretando ou apenas representando a si mesma (ela é estrela na TV espanhola). Os demais não têm muito a fazer, a não ser Pablo, o câmera-man, do qual, como já mencionado, só ouvimos a sua voz.

É certo que o filme fez muito sucesso na Espanha, tanto que Hollywood (como sempre) já comprou a idéia e levou adiante sua adaptação, que deve estrear em breve em terras tupiniquins com o nome “Quarentena”. Mas, fico com a minha afirmação mais acima: o terror-suspense-realidade gera sempre a impressão de que algo está faltando. Esperava levar mais sustos...

Obs. Não é que em alguns momentos o filme me lembrou “Ensaio Sobre a Cegueira”? Imagino que os mais atentos vão perceber o porquê.

Cotação: *** (três estrelas)
Nota: 7,5



terça-feira, 18 de novembro de 2008

Satisfação e revolta (parte III)


Uma notícia que me trouxe satisfação e revolta: "Vicky Cristina Barcelona", o mais novo exemplar do gênio Woody Allen teve uma excelente estréia em terras brasileiras neste último fim de semana. O filme arrecadou R$ 1,09 milhão em seus três primeiros dias de exibição, ficando em segundo lugar na arrecadação (perdeu apenas para 007, que já está chegando aos R$ 10 milhões arrecadados) e obteve, ainda, a melhor média de público por sala. Nunca imaginei que um filme de Woody Allen fosse se sair tão bem, mesmo com o elenco contando com nomes pesos-pesados como Penélope Cruz, Scarlett Jahansson e Javier Bardem. O longa, que está sendo considerado um dos mais sensuais da carreira de Allen, trata das relações amorosas estabelecidas entre duas turistas americanas (Rebecca Hall e Johansson) com um pintor (Bardem) e sua desvairada esposa (Penélope). Vale dizer que ele também vem recebendo elogios unânimes da crítica.

Mas, peraê, e a revolta do título deste post? A revolta fica por conta novamente dos exibidores de Natal, os quais mais uma vez engoliram mosca (como já havia acontecido em "Ensaio Sobre a Cegueira") e nós é que ficamos a ver navios... Paciência, é preciso ter paciência...

domingo, 16 de novembro de 2008

Recorde para Bond

007 - Quantum of Solace chegou neste fim de semana aos EUA e obteve a sua maior estréia em todos os tempos. Foram US$ 70,3 milhões, uma das maiores arrecadações para o mês de novembro. Só para se ter uma idéia, a aventura anterior de Bond, "Cassino Royale", obteve 40 milhões de dólares com uma estréia também em novembro. É, parece que os novos ares assumidos pela série fizeram muito bem à mais longeva franquia do cinema.

sábado, 15 de novembro de 2008

Clint novamente

Recentemente postei aqui no blog uma notícia sobre "Gran Torino" o próximo filme de Clint Eastwood. Pois bem, este ainda nem teve sua estréia e o senhor de 78 anos já está programando o próximo. Trata-se de um suspense ao estilo "O Sexto Sentido", segundo informações publicadas pela Variety. A Dreamworks, ainda antes da cisão com a Paramount, adquiriu os direitos sobre o roteiro de Peter Morgan intitulado "The Hereafter". E não é só: ele também estará no filme "Remembering Mark Twain", sobre a vida do famoso escritor de "As Aventuras de Tom Sawyer", não apenas dirigindo, mas também atuando. Esse homem é um exemplo! Tem toda a minha admiração.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Filmes Para Ver Antes de Morrer


Aproveito a estréia do novo 007 para recomendar a todos (mesmo para aqueles que não são fãs ou não são muito chegados em filmes de ação) a aventura anterior do famoso espião. Um clássico instantâneo! Abaixo segue a resenha que escrevi à época de seu lançamento no circuito brasileiro.


007 – Cassino Royale

Senhoras e Senhores: reservem seus lugares no cinema! As cartas estão na mesa!

Quem nunca assistiu a um filme de 007? Ao longo dos últimos quarenta e poucos anos, é bastante difícil encontrar alguém, mesmo com um mínimo de interesse por cinema, que nunca tenha assistido a pelo menos uma das aventuras do agente secreto britânico Bond, James Bond! Sua imagem se tornou um ícone pop, uma referência de masculinidade, o protótipo do macho: inteligente, frio, irônico, boa pinta, conquistador, humor refinado... Além de proteger a Inglaterra e o mundo dos mais inescrupulosos vilões.

Apesar de todo o peso que carrega por, como já disse, se tratar de uma referência pop, o personagem vinha sofrendo um enorme desgaste nos últimos anos. Após uma boa recuperação nos longas “Goldeneye” e “O Amanhã Nunca Morre”, estrelados por Pierce Brosnan, os produtores pareceram perder o controle ao exagerar na dose de parafernália “modernosa” e de situações inverossímeis colocadas no roteiro, até carros invisíveis surgiram (putz!). Assim, se “O Mundo Não é o Bastante” já se mostrou um fracasso, o episódio seguinte, “Um Novo Dia Para Morrer” se tornou um verdadeiro desastre, quase matando a franquia.

Mostrou-se, portanto, premente a necessidade de realizar uma renovação do personagem, adequando-o aos novos tempos. A guerra fria acabou. Ademais, a idéia de vilões megalomaníacos com vontade de dominar ou destruir o mundo já soa bastante absurda e também datada.

Os produtores tiveram, então, uma feliz iniciativa. Decidiram “zerar” a série, algo semelhante ao que foi feito com o personagem do Homem Morcego em Batman Begins. O personagem de Bond poderia, além disso, ser mostrado de uma forma mais fria, seca e direta, fazendo jus aos dois zeros que o identificam e que significam “permissão para matar”. Nos dias de hoje, o público já aceita a idéia de um herói valer-se de métodos violentos para atingir seus objetivos, vez que a agressividade muitas vezes se torna elemento de sobrevivência em um mundo tão individualista e frio.

E é sob esta nova perspectiva que nos é apresentado “Cassino Royale”, o 21º longa metragem do agente 007. Desde o início da projeção já notamos algumas diferenças. Com a imagem em preto e branco, vemos Bond assassinando friamente dois homens, feitos que o levariam, como mostrado logo após a seqüência de créditos, a adquirir o status de “00”. Até mesmo o famoso tiro em direção ao espectador, presente em todos os seus filmes, aparece renovado aqui (quem assistir perceberá de imediato a diferença). E mais: a referida seqüência de créditos mostra-se ainda inovadora. Foram-se as silhuetas de belas mulheres nuas ou seminuas e entraram animações do agente lutando contra inimigos cercados por elementos de jogos de cartas (ases, valetes, paus, damas etc.), bem de acordo com o desenvolvimento da trama (de altíssima qualidade esses créditos, com canção de Chris Cornell).

O filme, uma adaptação do primeiro romance de Ian Fleming com o personagem, dirigido por Martin Campbell (o mesmo de Goldeneye) narra toda a inexperiência, arrogância e inconseqüência de Bond (Daniel Craig) quando novato, características que o levam a cometer vários erros, os quais acabam servindo de fio condutor para a trama. Seu comportamento impulsivo deixa de cabelos em pé sua chefe, M (Jude Dench). E esse ainda inexperiente Bond terá de enfrentar um vilão adequado aos novos tempos: Le Chiffre (muito bem interpretado, sem tiques, pelo dinamarquês Mads Mikkelsen), um financiador do terrorismo e de grupos paramilitares ao redor do mundo. Um vilão sem ideologias ou convicções a defender, diga-se de passagem, tendo como único objetivo ganhar dinheiro (vale aqui mencionar que isso é metáfora direta do grande vilão dos dias atuais: o capital despersonalizado, sem pátria, aliado a indivíduos inescrupulosos).

A forma encontrada pelo serviço secreto britânico para desarticular a quadrilha seria Bond vencer Le Chiffre em um jogo de pôquer em Cassino Royale, casa de jogos que dá o título à produção. E o dinheiro que Bond necessitará será fornecido por Vesper Lynd, uma belíssima contadora do governo interpretada pela Deusa (assim mesmo, com letra maiúscula) Eva Green. Aqui cabe um aparte: a renovação da franquia foi tão abrangente que não se restringiu apenas à trama, mas até mesmo às Bond Gilrs. Se Caterina Murino ainda lembra o velho estilo, surgindo de biquíni montada em um cavalo (Aaaaaahhh, Caterina...), Eva Green imprime uma total renovação ao conceito das amantes de Bond. Culta, inteligente, dona de uma sensualidade diferenciada, invulgar, com uma beleza profunda que parece diferenciá-la dos demais simples mortais, Vesper Lynd está longe, muito longe, de ser apenas um corpo esguio, com uma bunda proeminente ou seios fartos. Ao mesmo tempo lindíssima e de personalidade forte, logo compreendemos porque Bond deixaria todas as outras mulheres para ter apenas Vesper. Os diálogos entre os dois são ótimos e muito mais interessantes do que outros que rolam em vários filmes românticos por aí. Aliás, o filme tem uma das cenas mais bonitas que já vi em filmes de ação, disputando lugar até com outras de filmes direcionados aos apaixonados (não quero contar para não perder a graça, mas acho que todos perceberão qual é ao assistirem).

Mas todo esse processo de amadurecimento dos personagens e das tramas é acompanhado por um detalhe muito importante em filmes de 007: ação vertiginosa!!!!! Em nenhum momento o roteiro (um dos autores é Paul Haggis, de “Crash” e “Menina de Ouro”) perde o ritmo. E detalhe: um dos pontos altos é o jogo de pôquer no Cassino Royale. Alguns críticos andam dizendo por aí que quem não entende de cartas pode se sentir entediado. Que bobagem! Eu mesmo, confesso, não entendo nada de baralho e fiquei totalmente vidrado nas seqüências de jogo. E a primeira grande seqüência de ação da produção, em que Bond persegue um traficante de armas em Madagascar, é brilhante. Uma perseguição a pé muito superior a qualquer racha automobilístico que se vê em outros filmes. Ah, existe ainda uma cena de tortura que vai fazer todo mundo se remexer na cadeira (ou melhor, as meninas nem tanto), além de, por mais paradoxal que possa parecer, gerar boas gargalhadas.

E, por fim, uma última questão deve ser abordada: Daniel Craig. Muitos questionaram sua escolha. Não era possível que escolhessem um Bond loiro e, ainda por cima, feio. Mas é necessário dar a mão à palmatória: o cara arrebenta. Criou um 007 que reúne características de vários outros e, ao mesmo tempo, surge totalmente novo. Um Bond frio, irônico, mas que ao mesmo tempo, sabe demonstrar seus sentimentos quando necessário. Só achei “bombado” demais, mas isso é de menor importância. No fim, saí com a sensação de que Craig é o melhor James Bond desde Sean Connery. Os produtores foram felizes na decisão e os críticos queimaram a língua.

Cassino Royale, desta forma, dá uma grande e bem-vinda repaginada na franquia. Deverá, sem dúvida alguma, conquistar novos fãs para a série, além de reaproximar os antigos. Ah, se todos os filmes blockbusters seguissem sempre este padrão qualidade... Vida longa ao novo 007 e que venha o próximo (segundo algumas informações que circulam pela net, ele já está previsto para novembro de 2008). Vale à pena conferir, mesmo para os que não são fãs da série.

Resenha escrita por Carmo. Fábio Carmo.

Cotação: ***** (cinco estrelas).
Nota: 10,00.

domingo, 9 de novembro de 2008

007 - Quantum Of Solace

Em time que está ganhando...

Em 2006, Martin Campbell dirigiu Cassino Royale, longa que promoveu uma revolução na franquia mais longeva do cinema. James Bond, o famoso agente 007, agora interpretado por Daniel Craig, uma escolha que a princípio tinha se mostrado estranha (um Bond louro?), adquiria novas características que o tornariam mais adequado ao século XXI. Bond, ao mesmo tempo em que se mostrava mais frio, fechado, duro, também passou a carregar uma aura mais humana e sensível. Apaixonou-se pela espiã Vésper Lynd (interpretada pela belíssima Eva Green) e, de quebra, ainda contou com um novo estilo de narrativa e ação, bastante influenciadas pela franquia “Bourne”, mais realistas e diretas. Empolgante, inteligente, sem deixar de lado o bom humor em momentos muito bem escolhidos, “Cassino Royale” se transformou em um dos melhores filmes de ação dos últimos anos, um clássico instantâneo que com certeza atraiu uma nova geração de fãs para o personagem.

Sucesso de público e crítica, a idéia de mais um episódio para a série surgiu quase que imediatamente. A premissa era de justamente retomar e até aprofundar os elementos que fizeram o sucesso do anterior. “Quantum Of Solace” (não sei o porquê de manter o título em inglês) é o resultado dessa nova empreitada, mas, embora desenvolva algumas nuances apresentadas na aventura anterior, ele se mostra um tanto abaixo do genial “Cassino Royale”.

O principal elemento desabonador deste episódio é o roteiro (escrito por Paul Haggis, Robert Wade e Neal Purvis). Confuso, traz um excesso de informações e um certo exagero em estabelecer links com o filme antecedente. O número de informações dependentes de um prévio conhecimento por parte do espectador dos acontecimentos pretéritos é tão grande que desaconselho aqueles que não viram “Cassino” a assistirem a este “Quantum”. A trama começa praticamente do fim da anterior, com um Bond sedento de vingança, procurando os responsáveis pela morte de Vésper Lynd. Nesse rumo, acaba esbarrando em uma organização criminosa tão secreta que nem mesmo agências como a M16 e a CIA sabem da sua existência, a tal Quantum do título. Ela tem como seu principal mentor Dominic Green (o sempre ótimo Mathieu Almaric, de “O Escafandro e a Borboleta”), o qual pretende lucrar com catástrofes ambientais geradas artificialmente em países sul-americanos, no caso do filme a Bolívia. Existe ainda uma subtrama política, já que os EUA pretendem apoiar um golpe de Estado em andamento, golpe este que facilitaria os planos de Green (ele receberia uma área desértica na Bolívia). Em paralelo, o agente 007 esbarra com Camille (a bela Olga Kurylenko, a ucraniana mais latina do mundo), uma outra agente em busca também de vingança. A verdade é que o filme se revela curto (apenas 105 minutos, um dos episódios mais curtos da franquia) para o desenvolvimento eficaz de um roteiro cheio de meandros, que muitas vezes lembra os chamados “filmes de máfia”, sempre repletos de nomes e acontecimentos que deixam o espectador confuso, e ainda com o “plus” já mencionado de sempre estarmos fazendo conexões com o longa de 2006 para compreendermos os objetivos de Bond.

Esse desenvolvimento ainda resta mais atropelado pela incompetência do diretor Marc Forster (de “O Caçador de Pipas” e “A Última Ceia”) em filmar cenas de ação. Quase todas as seqüências de ação possuem uma edição muito rápida, além de uma câmera trêmula, o que dificulta a compreensão da platéia, fazendo com que ela não se envolva muito com o que vê na tela. Símbolo disso é a seqüência de abertura pré-créditos, uma da mais fracas da série, sem dúvida, quando Bond destrói logo de cara um Aston Martin ao fim de uma perseguição que não entendemos muito bem. Mesmo a cena da ópera, que poderia render uma seqüência antológica, acaba insatisfatória, mostrando-se também confusa. Mas, ainda falando sobre este aspecto, nem tudo soa medíocre. A passagem da luta nas cordas de sinos é muito boa, bastante inteligente.

Por outro lado, alguns pontos positivos devem ser destacados. Daniel Craig avançou ainda mais na composição de Bond, mostrando uma introspecção ainda maior do agente que o leva inclusive a uma brutalidade e sede de vingança sem precedentes (o rastro de sangue que 007 deixa nesse episódio é algo talvez nunca visto antes). Craig, sem dúvida, já pode disputar o título de melhor agente 007 com Sean Connery, tamanha a sua adequação ao papel, além da renovação que conferiu ao personagem. Da mesma forma Jude Dench está ótima mais uma vez na pele de M, a chefe imediata de 007 no serviço secreto britânico, assim como Mathieu Almaric faz o que pode com o seu limitado vilão (não está entre os mais marcantes da série). Já Olga Kurylenko, mesmo bela, parece sofrer com sua personagem por dois motivos: o primeiro é que ele é fraco, nem de longe lembrando a enigmática Vésper de “Cassino”; o segundo é que Olga era uma modelo, sem muita experiência na interpretação, o que a deixa em patamares bem inferiores ao de Eva Green, uma atriz que está bem longe de ser apenas um rosto lindo (e bota lindo nisso!). Outro aspecto positivo é o tom crítico e antenado com a geopolítica atual, mostrando os interesses espúrios de grandes corporações (as grandes vilãs do cinema atual) e de governos de países ricos (mormente os EUA da era Bush, que finalmente acabou, graças ao bom Deus!).

Alguns fãs ainda irão se queixar da ausência da famosa frase “meu nome é Bond, James Bond”, uma das marcas registradas da série ao longo de décadas. Mas não poderão reclamar da seqüência de créditos. Todos que acompanham a franquia sabem que os créditos sempre foram mostrados de forma esmerada e este novo longa não fica atrás. A canção “Another Way To Die”, composta e interpretada por Jack White e Alicia Keys, é ótima e a volta das silhuetas femininas nas imagens é muito bem-vinda.

Saldo final: o novo Bond ainda consegue entreter o espectador, tem seus bons momentos, mas ficou um pouco distante do brilhantismo de “Cassino Royale”. O que não dá para entender é porque o realizadores optaram por Marc Forster para a direção. Sabe aquela história de “em time que está ganhando não se mexe?”. Pois é, desejo que na próxima oportunidade eles lembrem de trazer Martin Campbell de volta para o cargo de “técnico”. Ah, e pra que colocar a famosa cena do tiro em direção à câmera (marca registrada da série) apenas no fim da exibição e não no início? Essa coisa de querer ser diferente só por ser diferente é atitude de adolescente chato...

Cotação: *** (três estrelas)
Nota: 7,0

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Não é sobre cinema



O blog é sobre cinema, mas acho que todos vão entender porque vou abrir uma exceção para falar de História (assim, com H maiúsculo).


Mãos Dadas

Recordando os meus tempos de pré-escola, acabei por lembrar de um colega que sempre tinha em muita conta. Era um garoto muito legal e simpático, com quem eu sempre jogava as peladas do recreio e com quem eu compartilhava o nome: Fábio. Ele me chamava de “Fábio Henrique” e eu o chamava de “Fábio Silva”, assim como o restante da turma, para não ocorrer confusão.

Entretanto, as atitudes de algumas pessoas me deixavam confuso. Fora da minha turma da escola e da minha casa, era comum ouvir de dizer que negros eram pessoas “inferiores”, que “cheiravam a macaco” ou que quando alguém fazia algo de errado isso era “coisa de nêgo”. Isso para mim não fazia o menor sentido. Eu sempre lembrava que o Fábio Silva era negro, mas era um menino legal, até mais legal do que garotos brancos como eu, e que de “inferior” e “macaco” ele não tinha nada. Os anos passaram, eu mudei de colégio e nunca mais vi Fábio Silva. De qualquer forma, as lembranças daquelas tardes em que jogava bola com meu amigo “de cor” nunca se apagaram.

Tempos mais tarde, com forte influência de uma família de orientação política de esquerda (meu avô materno é um ex-deputado estadual cassado e preso durante o regime militar), eu havia me tornado um adolescente politizado que, ademais, adorava ler livros de História, fosse geral ou do Brasil. Foi nessa época que comecei a ter mais contato com as idéias de um certo Martin Luther King Jr., um líder negro norte-americano que durante o fim dos anos 50 até 1968, ano em que foi assassinado, lutou pelos direitos civis dos afro-descendentes em sua terra, os Estados Unidos da América. “Eu tenho um sonho, o sonho de que um dia os homens possam ser julgados não pela cor de sua pele, mas pelo seu caráter” era uma das frases mais inspiradoras que um jovem como eu poderia ler e ouvir e que poderia ser aplicada às mais diversas formas de discriminação, seja de raça, etnia, sexo, classe social... O pastor acabou se tornando uma das minhas grandes referências, ao lado de nomes como Ernesto “Che” Guevara, Gandhi, os Beatles (sou fã da banda não apenas por suas lindas canções, mas porque eles também mudaram o mundo) e o homem Jesus de Nazaré (à parte as religiões, uma dos grandes revolucionários da História, sem dúvida).

Mais alguns anos se passaram, eu já estava me tornando um homem e começando a ficar descrente de que minha geração pudesse ver mudanças significativas não apenas na sociedade brasileira como na internacional, no mundo enfim (jovens são assim mesmo, imediatistas e apressados). Todavia, em 2002 algo de diferente aconteceu no Brasil. Um certo torneiro mecânico que durante anos havia tentado se eleger sem sucesso, acabou se tornando mandatário máximo da nação. A eleição de Luís Inácio Lula da Silva para a presidência da República me fez acreditar que era possível transformar a realidade dentro de um sistema democrático, sem necessariamente nos valermos de “processos revolucionários” para tanto. Mesmo que Lula não tenha atendido a todas as expectativas do povo brasileiro, o que seria humanamente impossível é bom dizer, o só fato de ver um operário num lugar que até então era cativo das classes abastadas já representou uma enorme mudança, uma transformação que, como dito acima, eu já não acreditava mais ver. “É, as coisas podem mudar, sim...”, passei a refletir.

Contudo, se o Brasil parecia respirar novos ares, o plano internacional se mostrava nefasto. Os EUA, a grande potência econômica e militar do globo terrestre, tinha em seu governo George W. Bush, um representante de tudo que a política norte-americana tem de pior, um retrógrado belicoso cujas atitudes lembram a de um xerife nos tempos do velho Oeste. Suas ações estapafúrdias, principalmente no Iraque, fizeram o mundo esquecer do 11 de setembro e se colocar contra o poderio ianque. A luz poderia vir nas eleições de 2004, onde todos esperavam que os americanos retirassem seu líder belicoso do poder. Qual não é a surpresa quando eles reelegem George Bush: “o problema está mesmo nesse povo estúpido”, pensei. Mais quatro anos se passaram, e, como cereja do bolo, o governo irresponsável do texano ainda mergulhou o mundo em uma crise econômica que não era vista desde 1929.

Mas eis que surge um certo Barack Obama, senador pelo estado de Illinois que, com seu carisma e discurso renovador, prometia novos parâmetros na política do Tio Sam. E duas características suas chamam a atenção: seu nome de origem islâmica (é bom lembrar os grandes desentendimentos entre americanos e islâmicos nas últimas décadas) e um outro talvez ainda mais significativo: a cor de sua pele. Barack Obama é negro (mesmo que não muito escuro, uma vez que filho de mãe branca). E logo me veio à memória o sonho de Luther King: “será que finalmente veremos um homem ser julgado pelo seu caráter e não pela cor de sua pele?”. Ao longo das prévias do Partido Democrata, em que Obama enfrentou uma dura batalha contra uma concorrente que também representaria uma grande mudança (seria a primeira mulher a ser eleita presidente dos EUA), sempre fiquei desconfiado se seria realmente possível um candidato negro ser eleito presidente ou até mesmo passar pelas ditas prévias. Há alguns meses soubemos que ele obteve a indicação do partido. Uma barreira já havia sido transposta.

E hoje acordo com a notícia de que Obama foi eleito presidente dos Estados Unidos. Na TV, pude acompanhar a festa nas ruas de Chicago (capital do Estado de Illinois) e por todo o território ianque. O que mais me chamou a atenção foi o fato de ver brancos e negros lado a lado, vibrando e sorrindo por terem ajudado a eleger aquele mestiço de nome “estrangeiro”. Além disso, a imagem de Obama e sua família ao lado do vice Joe Biden e sua respectiva esposa, ambos brancos e louros, todos de mãos dadas, é símbolo de um país transformado ou, porque não dizer, um mundo transformado, tão grande é a influência americana perante as outras nações. Sim, neste 05 de novembro senti que algo de diferente aconteceu. Se, há alguns anos, o Brasil parecia adentrar em um novo tempo, hoje o mundo inteiro parece respirar uma nova era. Talvez Barack Obama não faça um grande governo, é verdade, traga decepções (certamente as trará, pois ninguém é um messias), ponha os pés pelas mãos. Mas só o fato de ver um negro eleito presidente naquele país, onde há apenas 40 anos o famoso líder negro era assassinado por dizer que brancos e negros eram iguais, já é suficiente para fazer surgir um sorriso, mesmo que pequeno, no rosto de todos aqueles que um dia imaginaram um planeta um pouco mais justo.

Creio que realmente eu estava equivocado anos atrás. Sim, as coisas mudam... Podem demorar a acontecer, talvez não aconteçam na velocidade que esperamos (afinal, nosso tempo de vida é tão breve, não é mesmo?). Mas... mudam!

Acho que Fábio Silva, aquele meu amigo dos tempos da pré-escola, das peladas no recreio, também deve estar sorrindo neste momento...

domingo, 2 de novembro de 2008

Linha de Passe

A vida é um jogo

O futebol é uma das grandes paixões do brasileiro, disso ninguém duvida. Mas também é notável a incapacidade do cinema nacional em filmar este esporte, ou mesmo de desenvolver roteiros decentes com a temática do futebol. “Linha de Passe”, o mais recente trabalho de Walter Salles, em parceria com Daniela Thomas (a mesma dupla de “Terra Estrangeira” e “O Primeiro Dia”) na direção, talvez seja um dos raros casos de filme que envereda pela seara do esporte bretão com sucesso, mesmo que neste caso o futebol represente um elemento da trama e não o seu mote central.

O futebol, quem acompanha sabe, é uma grande metáfora da vida. Em nenhum outro esporte o imponderável se faz tão presente. Não é à toa que as “zebras” aconteçam de forma tão freqüente neste jogo que, até por isso, acaba se transformando no mais emocionante de todos. Quantas vezes você já não viu seu time perder mesmo sendo muito superior em campo ao adversário? Assim é o futebol, assim é a vida.

Tomando essas características emprestadas para sua obra, o roteiro, o qual foi escrito pela própria Daniela Thomas em parceria com Bráulio Mantovani (o mesmo de “Última Parada 174” e “Cidade de Deus”) e George Moura, nos apresenta à família de Cleuza (Sandra Corveloni, que recebeu o prêmio de melhor atriz no festival de Cannes 2008), mãe de quatro filhos, todos de pais diferentes. Dario (Vinícius de Oliveira) pretende ser jogador de futebol. O problema é que ele atingiu a idade limite para a “peneira” nos clubes, 18 anos, o que reduz muito suas chances de ser aproveitado. Dênis (João Baldasserini) é motoboy, pai ausente e apresenta uma tendência para a criminalidade. Dinho (José Geraldo Rodrigues) é evangélico, mas parece já ter tido problemas de delinqüência no passado e, finalmente, Reginaldo (Kaique de Jesus Santos), o mais novo dos quatro com seus 9 ou 10 anos de idade, passa os dias entre a escola e longas viagens de ônibus. Ele sabe que seu pai é motorista e busca encontrá-lo em um desses passeios. Vale acrescentar que Creuza está grávida de um quinto filho, cujo pai também não se sabe onde está. Dentro da dura realidade da periferia onde vivem, os personagens parecem estar o tempo inteiro “na marca do pênalti”. As dificuldades que enfrentam parecem intransponíveis e as decisões, os caminhos a serem seguidos, parecem surgir a cada novo fotograma. Decisões difíceis, diga-se de passagem. O peso de suas vidas ultrapassa a tela e atinge o espectador. Cabe destacar ainda a volta de Salles a um velho tema seu, a ausência paterna, que já havia sido explorado em “Central do Brasil” (óbvio que o fato de nenhum dos rapazes ter crescido com seus respectivos pais é gratuito).

Para retratar essa realidade asfixiante, a dupla de diretores optou por uma fotografia dessaturada (de Mauro Pinheiro Jr.), aliás, algo até comum nos filmes de Salles (como em “Central do Brasil”), contando ainda com aquele mesmo “cheiro” do neo-realismo italiano que permeia toda sua obra. Uma fotografia que transmite uma sensação de tristeza ainda mais acentuada pela trilha de Gustavo Santaolalla (que já havia trabalhado com Salles em “Diários de Motocicleta”). Todavia, o que mais se destaca em “Linha de Passe” é mesmo o elenco. Impressionante como todos parecem perfeitos em seus papéis, encarnando seus personagens com uma naturalidade tão grande que nos fazem por vezes esquecer que estamos vendo atores representando. Realmente gratificante perceber que os críticos, público e júri de Cannes perceberam isso e agraciaram o filme com o prêmio de melhor atriz. Kaíque, por exemplo, dá um banho no inconstante Michel Gomes, que interpretou Sandro do Nascimento em “Ùltima Parada 174”. Vale dizer, não apenas no quesito interpretação “Linha de Passe” se mostra superior ao longa de Bruno Barreto. É notável como a simplicidade do primeiro contrasta com a hiperdramatização do segundo, como seu teor melodramático formulado para levar o espectador às lágrimas.

Mas, acima, eu falava da relação deste longa em resenha com o futebol. Pois bem, ela se torna ainda mais clara em uma determinada seqüência, quando Dario está para cobrar uma penalidade. Se em uma partida um pênalti pode decidir o seu destino, na vida um dado momento, uma escolha, um passo dado pode alterar completamente o seu rumo. O imponderável estará sempre presente.

Muitos talvez venham a se queixar que o término de “Linha de Passe” é excessivamente aberto, pois que deixa indefinidos os destinos dos personagens. Na realidade, creio que não haveria melhor opção. Seus personagens se tornam ainda mais reais ao possuírem futuros ainda a serem escritos, assim como os nossos.

Cotação: ****1/2 (quatro estrelas e meia)
Nota: 9,5.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Filmes Para Ver Antes de Morrer


Esta semana, vi uma lista de melhores filmes do século XXI em um site (não me agradou muito). Acabei lembrando que este filme, de repente, pode mesmo vir a figurar em listas do gênero. Também lembrei que, quando escrevi esta resenha, eu ainda não tinha criado o blog, razão pela qual posto agora.

Onde Os Fracos Não Têm Vez


"Três Homens em Conflito"

Ainda nos anos 60, o genial Sergio Leone nos brindou com um clássico do gênero cinematográfico criado por ele próprio, o famoso “western spaghetti”, apelido dado devido à sua origem italiana. “Três Homens em Conflito” (The Good, The Bad and The Ugly) nos apresentava três personagens em busca de um carregamento de ouro, mostrando, com estilo e bom-humor, a luta destes três homens para obter a almejada riqueza. Por trás disso, claro, Leone nos fornecia uma visão do processo de formação dos Estados Unidos da América, tema que seria ainda melhor desenvolvido posteriormente em sua obras-primas “Era Uma Vez no Oeste” e “Era Uma Vez na América”.

Algumas décadas depois, os irmãos Joel e Ethan Coen valem-se da mesma estrutura para desenvolver um longa que trata também da sociedade americana, mas não de seu passado ou de seu processo de formação. Trata, por seu turno, do processo de degradação desta sociedade, da perda dos valores mais essenciais, a qual parece conduzi-la a um lento definhar. Da mesma forma que Leone, os Coen nos mostram três homens em busca do mesmo objetivo: recuperar uma mala cheia de dólares advindos de tráfico ilícito de entorpecentes. Contudo, se no longa de Leone, os três personagens são levados basicamente pelo mesmo sentimento (cobiça), os homens de Coen parecem imbuídos, cada um, de razões próprias e bastante distintas.

Tudo começa quando Llewelyn Moss (interpretado por Josh Brolin), o típico texano que remonta aos tempos da conquista do Oeste, encontra, no local de uma carnificina entre traficantes de drogas, uma mala contendo uma pequena fortuna em dólares e passa a fugir dos seus perseguidores, entres eles Anton Chigurh, um maníaco homicida interpretado magistralmente por Javier Bardem (com um cabelo megafashion no melhor estilo “Beiçola”). Inicia-se, assim, um pega que lembra Papa-léguas entre os dois (aliás, o humor dos Irmãos Coen, embora atenuado, continua presente neste longa). À parte, o veterano xerife Ed Tom Bell (Tommy Lee Jones, em mais uma grande atuação) procura elucidar o caso, cuja carnificina lhe causa indagação e espanto.

Interessante notar que os Coen trouxeram, para este western moderno (o filme se passa em 1980), uma similaridade com o clássico de Leone: o três personagens possuem personalidades marcantes, tornando ainda mais importante o trabalho de atores. Todavia, se em “Três Homens em Conflito” esse elemento se torna um pouco mitigado devido ao motivo que imbui suas ações ser o mesmo (a ganância), aqui vemos três homens imbuídos de motivações bastante diferentes, assim como os mencionados irmãos diretores lhes atribuem personalidades ainda mais marcadas, buscando colocar em cada um os traços de uma América do passado, do presente e daquela que pode vir a ser.

Llewelyn, o cowboy que, podemos dizer, representa o americano médio, é um homem comum, ex-combatente do Vietnã, que leva sua vida simples e tranqüila com a esposa e, de repente, vê-se diante da tentação de enriquecer de forma fácil (ou pelo menos aparentemente fácil). É o homem comum que se deixa corromper, retrato da sociedade atual que, se está em parte corrompida, ainda apresenta alguns valores preservados. Já o xerife, homem de valores enraizados o qual, ao longo da caçada, acaba mais preocupado com a sorte de Llewelyn do que exatamente com a captura do dinheiro ou dos criminosos, representa um tempo que já não existe mais, onde os homens eram medidos antes de tudo por seu caráter e honradez. Valores estes hoje enterrados por aqueles que, como o psicótico Chigurh, são inteiramente amorais na busca de seus objetivos. Chigurh, em seu caminho, elimina, literalmente, todos que colocam a sua frente, utilizando-se de armas que, como realça o xerife em determinado ponto da projeção, são usadas para matar gado. Talvez, para o psicopata em questão, o prazer não esteja exatamente no objetivo a que se presta (o dinheiro), mas justamente nos meios dos quais se utiliza para buscá-lo. O dinheiro é o seu “MacGuffin” (expressão criada por Alfred Hitchcock para designar um elemento de roteiro que leva à ação do filme, mas que na realidade não tem grande importância para o que se quer de fato mostrar na tela). Aliás, no presente caso, Macguffin do próprio filme, pois que a mencionada corrida de “papa-léguas” é apenas o subterfúgio para que os Irmãos Coen nos mostrem um painel da degradação da América. Não há mais espaço para os velhos valores, encarnados pelo personagem de Tommy Lee Jones, idéia revelada já a partir do título original (No Country For Old Men), mal traduzido para o português (pra variar um pouco, né?). Não há mais lugar para os velhos homens.

De qualquer forma, cabe perguntar: a degradação da América de fato ocorreu ou sua deterioração reside na sua própria gênese? Afinal, Leone já mostrava, em seu já citado clássico, que a cobiça e falta de escrúpulos está na origem da sociedade americana. A famosa “conquista do Oeste” foi extremamente brutal e as marcas desse tempo residem até hoje em vários aspectos dessa sociedade. Assim, será possível falar em degradação, ou apenas reafirmação dos valores que motivaram sua formação? Bom, o que apenas consigo afirmar é que o cenário caótico traçado pelos Coen não apenas se restringe à terra do Tio Sam. O mundo inteiro não é mais um bom lugar para se viver.

Independente da resposta a essa indagação, o que cabe aqui afirmar é que o Oscar, de forma flagrante, está se tornando uma premiação realmente de arte e não de mercado. Ao entregar a estatueta careca para esta obra dos Coen, vemos que algo de fato está mudando na Academia, já que o mesmo está longe, bem longe, der ser um filme comercial. Não possui nem mesmo trilha sonora, sua fotografia remonta aos filmes do final dos 70/início dos 80 e seu final abrupto(inteiramente fiel ao livro que lhe deu origem) deve descontentar 90% da platéia presente. Sendo sincero: como 90% dos que vão a salas é de gente medíocre incapaz de desejar algo que não seja um imbecil final feliz, esses mesmos serão incapazes de entender o desfecho deste filme que talvez seja o melhor dos irmãos diretores (sempre difíceis, por sinal). E desculpem o meu mau-humor. É que paciência tem limite. Mas já pedi a Deus nesta Páscoa a graça de adquirir paciência, pois dá vontade de chamar o Chigurh em certas ocasiões...Às vezes, sonho com o dia em que todos valorizem filmes assim. Mas aí acordo!

Palmas para a Academia. Vaias para o tal “grande público”.


Cotação: ***** (cinco estrelas)
Nota: 10,0.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Que belo poster!

Nestes dias de contagem regressiva para a estréia de "007 - Quantum Of Solace", acabo de me deparar com esse poster sensacional do longa! Olga Kurylenko é a ucraniana maia latina que deve existir no mundo. O filme estréia dia 07 de novembro na Terra Brasilis e, a julgar pelos trailers, deve ser mesmo imperdível! Ah, e esse post foi só para justificar a presença do poster mesmo! :)

domingo, 26 de outubro de 2008

Última Parada 174

Manipulação

Um antigo comercial (quem está na casa dos 30 já tem condições de lembrar dele) comparava o produto do anúncio com aqueles que tentavam copiá-lo. Seu bordão acabou se tornando imediatamente reconhecido, caindo na boca do povo: “parece, mas não é”. Todos usavam essa frase no dia a dia, sempre que surgia alguma situação em que o cidadão se deparava diante de algo que parecia ser verdade, mas não era.

E não é que esse bordão publicitário cai como uma luva para “Última Parara 174”, o novo longa do diretor Bruno Barreto? Ao longo de toda a projeção, fiquei sempre com aquela sensação de estar vendo algo que deseja ser realidade, mas que, todavia, não consegue. A impressão que fica é a de estarmos vendo um episódio televisivo de “Cidade dos Homens”, a conhecida série exibida pela Rede Globo, apenas um pouco mais violento do que o habitualmente exibido na TV dos Marinho. Infelizmente, a minha previsão (feita há algumas semanas, aqui mesmo neste blog) de que veria na tela uma ficção querendo se passar por realidade acabou se confirmando.

E isso porque toda trajetória do personagem Sandro do Nascimento (interpretado de forma vacilante pelo estreante Michel Gomes) tal como retratada nas telas não pode ser tratada por outro nome além de ficção. Como é sabido de todos, Sandro foi o principal personagem da famosa tragédia do ônibus da linha 174 do Rio de Janeiro. Todos acompanharam, ao vivo e em rede nacional, o desenrolar daqueles acontecimentos sombrios que culminaram na morte da professora Geíza, vítima não apenas de Sandro, mas também da incompetência da operação policial. Posteriormente, o país veio a saber que Sandro havia sido menor de rua, um dos sobreviventes da chacina da Candelária, o que acabou por reacender o debate sobre a responsabilidade do Estado e da sociedade diante do surgimento de criminosos como este. Claro que Sandro não poderia ser tratado apenas como uma vítima da sociedade, mas é inegável que esta lhe deu pouquíssimas oportunidades e caminhos a escolher.

Naturalmente, claro que uma história como essa seria um prato cheio para abordagens no cinema. Contudo, o seu resultado sempre estará condicionado ao talento e intenções daquele que está por trás das câmeras. Intenções, sim, porque Bruno Barreto, passando distante de tentar entender os fatos que conduziram àquele desfecho que tão bem retratou o Brasil contemporâneo, parece apenas querer “emocionar” o público, manipulando-o, fazendo-o o tempo todo sentir pena de um personagem que não precisa de manipulações para que tenhamos pena dele. A história de Sandro fala por si só. Não necessita de adornos.

O roteiro, escrito por Bráulio Mantovani (de “Cidade de Deus”) tem seus méritos. Mas estes méritos residem exatamente nos encadeamento de fatos destinados a fazer o público sair dolorido da sala de projeção. Ou seja, Mantovani fez muito bem o que pretendia o diretor. O problema está no que este pretendia ao criar fatos e personagens irreais para acentuar o melodrama ou para fazer com que o público crie laços com o protagonista. Torna-se muito desagradável assistir a um filme em que você simplesmente não sabe o que é verdade ou é simplesmente invenção dos seus mentores para lhe fazer chorar ou sair revoltado após duas horas de exibição.

Interessante que, através de um documentário, gênero que justamente relega as emoções e romantizações para um segundo plano, já que em primeiro está a busca da realidade de um fato ou pessoa objeto do estudo, José Padilha (diretor de Tropa de Elite) tenha alcançado estes dois efeitos, levando o espectador, com seu “Ônibus 174” (um dos melhores documentários a que já assisti) a se emocionar e refletir apenas tentando mostrar os fatos tal como eles realmente aconteceram. E Barreto, mesmo com toda sua manipulação, deixa muito a desejar em ambos os quesitos. Talvez tenha ainda algum sucesso na reflexão social. As seqüências que mostram os menores dormindo nas ruas logo nos fazem lembrar que uma sociedade que permite crianças e adolescentes vivendo sem eira nem beira não pode ser levada a sério. Será que alguém que cresce desta forma pode ter um destino realmente diferente daquele de Sandro do Nascimento?

Com relação aos aspectos técnicos, nada a reclamar. Boa fotografia acompanhada de um bom som, o qual não fará os espectadores reclamarem de não terem entendido o que os personagens falavam. Afinal, um filme que já nasceu com projeto de Oscar no seu DNA não poderia pecar em seus aspectos técnicos. E aqui chegamos a mais um ponto nevrálgico deste longa. A comissão que selecionou “Última Parada 174” como o concorrente brasileiro à premiação da Academia em 2009 estava pensando exatamente em suas qualidades quando assim decidiu? Ou estaria atendendo ao lobby mais poderoso da cinematografia brasileira, o dos Barreto? Os questionamentos são pertinentes, já que “Tropa de Elite” não foi o escolhido no ano passado por se tratar de um filme “mundo cão”, bastante violento, características que não contam com a simpatia dos eleitores do Oscar na categoria filme estrangeiro. Todavia, o filme em análise compartilha com “Tropa de Elite” esses elementos “mundo-cão-violento” e nem por isso ele deixou de ser escolhido. O que resta claro é a impressionante influência da família Barreto em nosso meio cinematográfico, já que ela conseguiu emplacar até o medíocre “O Quatrilho” (e que, é bom lembrar, acabou ficando com uma das 5 indicações finais).

Dia desses, estava lendo uma matéria em uma revista semanal sobre a ausência de público para os filmes nacionais. Ora, como se pode exigir presença de espectadores nas salas com filmes dessa qualidade? “Se o filme brasileiro que concorre ao Oscar é apenas isso”, pensa o incauto assistente ao sair da sala, “que dirá o resto”. E assim, o som das pás enterrando um caixão, que se ouvem ao fim de “Ùltima Parada 174”, poderia ser o som do enterro do cinema brasileiro, um eterno morto-vivo que se levanta da cova de tempos em tempos.

Cotação: **1/2
Nota: 6,0 (estou querendo ter pelo menos um pouquinho de boa vontade com o nosso “indicado”).

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

O Incansável Clint

Clint Eastwood é mesmo incansável. Recentemente, dirigiu mais um longa, The Changeling, protagonizado por Angelina Jolie e que teve sua premiére mundial no último Festival de Cannes. Agora, lá vem ele com outro filme, "Gran Torino", onde não apenas dirige, mas também atua, interpretando o papel de um racista. Segundo as palavras do próprio Eastwood, seu personagem é "ofensivo e potencialmente controverso". Na trama, Walt Kovalski (nome do seu personagem), um veterano da guerra da Coréia, é forçado a conviver com um vizinho asiático originário da China. Mas ele se vê obrigado a criar um vínculo com o vizinho estrangeiro por causa de seu carro, um Gran Torino ano 72. Este que você vê ao lado é o primeiro cartaz do longa, que estréia em 25 de dezembro nos EUA. Pela proximidade com o fim do ano, Eastwood mais uma vez deve estar com pretensões de Oscar.

Mais uma vez na expectativa. Pelos dois filmes, já que "The Changeling" nem estreou no Brasil ainda. Eastwood vem, ano após ano, recompensando os amantes do cinema com filmes memoráveis (basta lembrar de "Menina de Ouro" e "Cartas de Iwo Jima"). Prova de que a velhice só chega se você permitir que ela chegue.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Thor

Nas últimas semanas, várias notícias foram divulgadas sobre a adaptação do poderoso Thor para as telas do cinema, idéia que me agrada muito, por sinal. Sempre considerei Thor como um dos personagens mais interessantes do quadrinhos. Um deus, punido por seu pai, que passa anos vagando entre os simples mortais sem saber de sua condição "diferenciada", vivendo como o médico Donald Blake. Thor faz com que qualquer um, seja criança, adolescente ou adulto, acabe se interessando por mitologia, não só a nórdica, mas também a grega, persa, eslava ou sei lá mais que civilização antiga. Mais uma brilhante criação (ou seria adaptação, nesse caso?) de Stan Lee e Jack Kirby.

Minhas expectativas subiram ainda mais quando foi divulgado que o diretor mais cotado para assumir o projeto é o shakespeariano Kenneth Branagh. Famoso por suas adaptações para o cinema das peças do bardo inglês (entre elas o "Hamlet" de quatro horas de duração). Não posso imaginar cineasta mais adequado para adaptar personagem tão nobre em espírito, modos e linguagem. Segundo sites especializados em teatro, Branagh já teria até abandonado a direção de mais uma montagem de "Hamlet", com Jude Law no papel principal, para se dedicar ao projeto do Marvel Studios (dinheiro...).

Boato forte também é a possibilidade de Daniel Craig, o atual James Bond, encarnar o deus do trovão. Mas ele já disse que não dá para encarar dois personagens "heróicos" ao mesmo tempo, além de sair por aí com um cabelo enorme. Quem sabe se oferecerem uns dólares (ou euros) a mais ele topa? Certo mesmo é que o filme já tem data de estréia para 4 de junho de 2010.

domingo, 19 de outubro de 2008

Ensaio Sobre a Cegueira


"Uma coisa sem nome, essa coisa é o que somos"

É muito difícil procurar analisar criticamente um filme que tem por base o texto de uma obra literária que você já leu. Como é sabido, já é longa e desgastante a discussão sobre se é válido adaptar obras literárias para tela do cinema. Muitos afirmam que muito da obra original irá se perder, uma vez que seria impossível transportá-la para a tela grande sem que o material seja mutilado. Além disso, a literatura é uma forma de expressão eminentemente imaginativa. Cada leitor concebe os personagens de uma determinada forma, além das situações apresentadas, o que acaba impregnando a obra literária de uma enorme subjetividade, enquanto que o cinema lança a subjetividade a partir de imagens já previamente concebidas pelo autor. Se isso limita até certo ponto a subjetividade da platéia, por outro lado atiça com mais facilidade suas reações e emoções. Ademais, a vida humana é repleta de imagens. Nossas vidas muitas vezes parecem ser um longo filme, das quais somos os protagonistas inafastáveis.

A verdade é que esse embate entre cinema e literatura me dominou por completo durante a sessão de “Ensaio Sobre a Cegueira”, a adaptação de Fernando Meirelles para a obra do prêmio Nobel de Literatura José Saramago, o único autor em língua portuguesa a receber a honraria até hoje. Eu, como um dos admiradores do romance do escritor português, aguardei ansiosamente, ao mesmo tempo que “medrosamente”, a adaptação para as telonas desde que o projeto foi anunciado. A promessa era boa, pois que Meirelles é um diretor descompromissado com os interesses do cinema de mercado, além de ser um cineasta que leu a obra em sua língua natural, e não através de traduções (as quais sempre acabam perdendo algo da obra original). O filme acabou tendo sua premiére mundial no festival de Cannes deste ano, gerando simpatias e antipatias imediatas. A versão que chega ao circuito comercial restou diferente da exibida em Cannes e também das pré-exibições de teste realizadas no Canadá, as quais levaram uma parte do público a se retirar da sala de exibição na seqüência do estupro coletivo.

Mas, voltando ao meu dilema pessoal: já faz algum tempo que resolvi estabelecer como parâmetro para classificar um filme que se baseia em uma obra literária como bom ou ruim não o apego excessivo do roteiro ao texto original, mas sim a fidelidade do primeiro aos sentimentos e idéias que o segundo tenta transmitir. A essência em detrimento da forma, portanto. Mesmo assim, a tarefa não é fácil. Ainda mais quando se trata de uma obra extremamente complexa como é “Ensaio Sobre a Cegueira”. De qualquer forma, prometo que até o fim desta resenha chegarei a uma conclusão.

Se você não leu o livro e nem acompanhou as notícias do filme ao longo dos últimos meses, “Ensaio Sobre a Cegueira” trata de uma epidemia de uma estranha cegueira branca (“um mar de leite”) que contamina toda uma cidade indefinida (ou talvez um país ou o mundo inteiro, não se sabe ao certo). Devido ao alto contágio da doença, as autoridades resolvem isolar os infectados em um antigo manicômio abandonado, surgindo ali um microcosmo da sociedade onde, com o passar do tempo, as relações vão se tornando cada vez mais animalizadas. Apenas uma mulher continua a enxergar e ela começa a se sentir responsável por todos os outros que se tornaram limitados pela incapacidade visual. Vários são os subtextos apontados ao longo dos anos para a trama engendrada por Saramago. Alguns falam de sua defesa do socialismo, da dominação por aqueles que encontram algum instrumento de poder, da relação masculino x feminino... Na realidade, mesmo com todas essas metáforas plausíveis, creio que Saramago busca encontrar o humano, este ser que se encontra perdido em meio a sentimentos daninhos como a ganância, egoísmo, cobiça, opressão. Existem até mesmo elementos bíblicos a serem observados, já que o apóstolo Paulo converteu-se ao cristianismo após uma cegueira momentânea gerada por uma forte luz.

Transpondo estas idéias para as telas, Meirelles optou, para imergir o espectador também em um ambiente repleto de uma cegueira branca, por usar uma fotografia onde o branco predomina de forma abundante, que restou cinematograficamente muito interessante, muito embora a cor branca transmita uma idéia de “limpeza” que destoa do mundo caótico e imundo que Saramago descreve no livro. Apenas na seqüência do estupro coletivo e em uma certa cena no depósito de um supermercado temos a predominância dos tons escuros na fotografia. Por sinal, a tão comentada seqüência do estupro, que teria sofrido cortes por afastar o público das salas (segundo declarações do próprio Meirelles), resultou menos prejudicada do que vinha imaginando. Creio que o que é mostrado é suficiente para traduzir a atrocidade da situação. Mais do que isso poderia se tornar desnecessário. O público é inteligente, não precisa de tudo escancarado para entender os fatos narrados.

Um ponto que me trouxe incômodo foi a pressa do roteiro (escrito por Don McKellar) em chegar à situação do isolamento. O filme se beneficiaria de mais alguns minutos mostrando o contágio da população e, principalmente, apresentando os personagens que, mais tarde, exercem papel de destaque, como a Rapariga dos Óculos Escuros (interpretada por Alice Braga) e o Velho da Venda Preta (Danny Glover). Mesmo o Médico (Mark Ruffalo) tem sua vida e características apresentadas de maneira muito rápida. Ao longo do filme, a força e relação entre esses personagens acabam fazendo falta. Assim, o roteiro acaba por apresentar um lado “thriller” que talvez seja um “tique” do diretor brasileiro, já que o mesmo acostumou-se demasiadamente ao gênero. Mas, se a introdução é mais comprometida, alguns outros momentos também acabaram prejudicados, como a seqüência em que as mulheres tomam banho de chuva juntas (no livro a cena é mais longa, bela e emocionante). É bom que se diga: como um todo, uma meia hora a mais de duração cairia muito bem.

Por outro lado, não se pode negar que o cinema trouxe alguns benefícios para a obra. Meirelles é um excelente artífice de imagens. Além da “fotografia branca”, ele nos traz vários enquadramentos marcantes, que acabaram acrescentando uma maior carga emocional ou até mesmo crítica ao texto. A seqüência em que [SPOILER]o primeiro cego recupera a visão resultou belíssima (belo momento interpretativo de Yusuke Iseya, que não tinha me parecido muito convincente no restante do longa)[FIM DO SPOILER], algo que somente pode ser concebido através do cinema. E a idéia de diretor de [SPOILER] colocar as instruções apresentadas aos confinados através de uma televisão foi mesmo genial (no livro as instruções são passadas através de um sistema de som) [FIM DO SPOILER]. E, é bom ressaltar, há ocasiões em que imagens valem mais que 1000 palavras. O maior exemplo disso no longa são as cenas da cidade devastada (São Paulo como jamais alguém viu antes). Por mais que possamos imaginar ao ler o livro como é uma cidade habitada por semi-zumbis, o impacto das imagens não possui equivalente.

O filme conta ainda com boas atuações de Alice Braga, Mark Ruffalo e Gael Garcia Bernal (como o “rei” da ala 3). Mas quem rouba a cena mesmo é Julianne Moore, como a mulher do médico (até mesmo pela importância que lhe é atribuída pelo texto). Confesso que nunca fui muito fã dela (estou fugindo à regra, eu tenho consciência disso), mas Julianne realmente ficou perfeita na pele da personagem. E é interessante como sempre imaginei a personagem no livro com uma aparência semelhante à da atriz. Já Danny Glover, apesar de seu talento, acaba tendo pouca chance durante a projeção, já que o roteiro, de maneira até inexplicável, acabou diminuindo a participação do seu personagem. Uma pausa para um comentário adicional: não vi qualquer problema nas pequenas narrativas em “off” na voz de Glover em momentos específicos do longa. Alguns críticos diziam que soava “redundante” e “piegas”. Talvez por desconhecerem o livro não saibam que são trechos narrativos do mesmo. Essa implicância me pareceu coisa de “crítico chato” que, por não ter algo melhor a dizer, acabou falando bobagem (como costuma acontecer com freqüência, vale dizer).

Mas, você deve estar se perguntando, “e aí? O filme é bom ou ruim?”. Vamos à reposta que prometi algumas linhas acima: “Blindness” é um filme que tem problemas, como já salientado acima. Entretanto, antes de escrever esta resenha, conversei com algumas pessoas que viram o filme sem ter lido o livro antes. A impressão delas foi muito positiva e isso significa que o filme alcançou seu intento, qual seja, transportar o impacto e emoção do livro para a tela grande. Eu mesmo cheguei a me emocionar em algumas cenas e, se um filme consegue produzir isso mesmo em quem de antemão já conhecia todas as nuances de sua trama, ele com certeza é dotado de muitos méritos. De qualquer forma, o melhor crítico-juiz deste longa é José Saramago, sem dúvida. E é bom você saber que o Nobel de literatura chorou ao fim da sessão.

Cotação: **** (quatro estrelas).
Nota: 9,0

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Inglorious Bastards


Acima você está vendo o primeiro poster do novo filme de Quentin Tarantino: "Inglorious Bastards". Ou melhor, "Inglourious Basterds". A polêmica já se estabelece desde o título, pois Tarantino entregou o roteiro com as palavras grafadas desta última forma, com erros ortográficos e tudo (a sinopse oficial também trazia o título com os erros). Falando em sinopse oficial, confiram abaixo:

"Inglourious Basterds começa na França ocupada pelos nazistas, onde Shosanna Dreyfus (Mélanie Laurent) testemunha a execução de sua família pelas mãos do coronel nazista Hans Landa (Christoph Waltz). Shosanna consegue escapar e foge para Paris, onde cria uma nova identidade como dona de um cinema. Enquanto isso, também na Europa, o tenente Aldo Raine (Brad Pitt) organiza um grupo de soldados judeus para atacar alvos localizados. Conhecido por seus inimigos como Os Bastardos, o esquadrão de Raine se junta à atriz alemã e agente infiltrada Bridget Von Hammersmark (Diane Kruger) em uma missão para derrubar os líderes do Terceiro Reich. Os destinos convergem para o cinema onde Shosanna está planejando a sua própria vingança."

Como já ficou dito acima, Brad Pitt encabeça o elenco, que ainda conta com Mike Myers, Eli Roth e Daniel Brühl (o protagosnista de "Adeus, Lênin", lembram-se?).

Há muito tempo Tarantino prometia o seu "filme de guerra". Sabendo do gosto do diretor por cenas de violência, já dá para ter uma idéia de como será esta sua próxima realização que, por sinal, ele está prometendo a estréia para o festival de Cannes de 2009. As filmagens começaram esta semana e terão locações em Berlim e Paris. Mais um filme que todos devem acompanhar com atenção.

Mas, vou aqui repetir a pergunta: quando veremos "Death Proof" no Brasil??????!!!!!!!!!