domingo, 31 de outubro de 2010

Filmes Para Ver Antes de Morrer




Hiroshima, Meu Amor
(Hiroshima, Mon Amour)



Nós somos nossa memória



É difícil escrever sobre um filme como “Hiroshima, Meu Amor”, não só pela sua complexidade, mas também pela enormidade de textos já escritos sobre o mesmo. O filme de Alain Resnais, que pegou carona na Nouvelle Vague (muito embora o próprio Resnais não fizesse exatamente parte do movimento), é um dos mais debatidos de toda a história do cinema, muito devido ao potencial inovador que trouxe para a sétima arte. O longa é uma mistura de drama e documentário e sua primeira parte, sé é que podemos dizer assim, é uma das mais famosas e impactantes já vistas.

Resnais era documentarista antes deste trabalho, sendo famoso o seu “Noite e Neblina” (de 1955), sobre os campos de concentração nazistas, e havia começado “Hiroshima” não como uma ficção, mas como documentário. É daí que surgiram as imagens inesquecíveis de Hiroshima destruída, dos corpos carbonizados, dos sobreviventes miseráveis, do bebê ferido e em prantos, do memorial da bomba na cidade, cenas estas sublinhadas pela memorável frase “você não viu nada em Hiroshima”, pronunciada pelo ator japonês Eiji Okada, talvez querendo dizer que o pior ainda estaria por vir (Curiosidade: Okada não falava francês e teve que aprender o texto foneticamente). Em contraponto a esta fala, lançam-se as frases ditas pela personagem da atriz francesa Emmanuelle Riva, afirmando que “viu tudo em Hiroshima”. Esta rica contraposição foi levada a cabo pelo belo texto de Marguerite Duras, escritora francesa que faria aqui sua primeira incursão no cinema (ela posteriormente também se tornaria diretora), elaborando um roteiro baseado em experiências pessoais que já haviam sido tema de livros de sua autoria.

Este aspecto literário do longa é ainda mais realçado em sua “segunda parte”. Os personagens de Riva e Okada são amantes que se encontram em Hiroshima. Ele é um arquiteto; ela, uma atriz que está na cidade para realização de filmagens. Aos poucos, ela vai revelando fatos marcantes do seu passado na França, mais precisamente em Nevers, cidade da Bretanha ocupada pelos nazistas durante a Segunda Guerra. Aos poucos, vamos descobrindo que a mesma teve um romance com um soldado alemão, o qual acaba sendo morto no dia em que iriam fugir para viverem livremente seu amor. A família descobre a relação e a jovem sofre duríssimas consequências. Este passado da atriz em Nevers é mostrado através da reconstrução de memórias. Não sabemos como de fato os eventos aconteceram, mas somente como eles se processaram na memória da narradora. A memória, frise-se, é fugidia, escorregadia, pregando-nos peças e recriando os fatos de uma forma que, em muitas ocasiões, pode ser a mais confortável para a nossa consciência. E assim, a atriz vai narrando ao arquiteto (os personagens não possuem nomes), de maneira similar a uma sessão psicanalítica, as suas vicissitudes em Nevers, dando-nos uma visão da formação de sua personalidade, das motivações do seu comportamento. A memória, parece dizer Resnais, é a principal responsável por sermos o que somos.


Essa perspectiva pessoal também dialoga diretamente com o coletivo. Se a humanidade, como um todo, possui em sua História a memória dos fatos que delimitaram seus rumos, cada ser humano possui em si também eventos que marcaram/marcarão para sempre o seu destino. A Nevers da protagonista funciona para ela como Hiroshima funciona para o povo japonês, ou seja, um marco divisor que influencia seu comportamento mesmo após muitos anos dos eventos ocorridos. Cada ser humano possui uma Hiroshima que, no caso da personagem, é sua Nevers, como fica bem delimitado na “terceira parte” longa.

Vale salientar que, para uma narrativa calcada em memórias, a estrutura usada por Resnais foi necessariamente inovadora para o seu tempo. As palavras em off, no mencionado início, a sobreposição às imagens da guerra, o uso de flashbacks constantes, levando a uma projeção não linear, causaram um grande impacto na época, impacto hoje bastante diluído devido ao uso constante dos artifícios usados pelo diretor, os quais se tornaram comuns até mesmo na televisão. Resnais, ademais, radicalizaria esta proposta no seu filme seguinte, “O Ano Passado em Marienbad”, tornando-se quase inacessível ao grande público tal a dificuldade existente em sua compreensão.

Essa forma difícil, bem como a banalização de suas inovações, faz com que boa parte do público das novas gerações possua um certo desdém para com a obra do diretor francês. Uma pena. Resnais é um dos cineastas responsáveis pelo cinema tal como o vemos hoje. E “Hiroshima, Meu Amor”, sem dúvida, é uma obra seminal que ajudou a elevar a arte cinematográfica. Bem, no fim das contas, creio que não fui original, mas acabei escrevendo um texto sobre este grande filme! ;=)


Cotação e Nota: Obra-prima

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Trilha Sonora #14


"Cosmic Dancer" é a música que abre "Billy Elliot", em uma melhores sequências de créditos iniciais que já vi! Ela faz parte do álbum "Eletric Warrior", da banda "T-Rex" (cuja capa, inclusive, aparece na mencionada sequência), uma das bandas mais injustiçadas de todos os tempos! Curta clicando abaixo!




domingo, 24 de outubro de 2010

"Metrópolis" em São Paulo


Reproduzo abaixo matéria do UOL:



"Metrópolis" com 30 minutos a mais é atração da Mostra de SP, no Parque do Ibirapuera


A versão original de "Metrópolis", de Fritz Lang, está de volta, numa histórica sessão ao ar livre no Auditório Ibirapuera, a primeira na América Latina. A exibição será acompanhada pela Orquestra Jazz Sinfônica e será regida por João Mauricio Galindo, executando a trilha original de Gottfried Huppertz. O horário marcado para o início é 18h30.

Em 1927, o clássico do cinema mudo recebeu sua première mundial no cinema berlinense UFA-Palast am Zoo, em 10 de janeiro. A versão restaurada pela Fundação Murnau foi exibida no 60º Festival de Berlim, em fevereiro, no portão de Brandemburgo. Agora, o público da Mostra terá a sua vez.

A mutilação desta obra monumental começou não muito depois de sua estreia. A produtora UFA retirou a cópia original após uma temporada mal-sucedida de quatro meses no cinema, lançando mais tarde, no verão daquele ano, uma versão reduzida em meia hora. Por décadas, acreditava-se que partes importantes do filme estavam irremediavelmente perdidas. Acreditava-se que um único negativo original e várias cópias da versão menor existiam.

Após a descoberta, em 2008, de um negativo em 16 mm, na Cinemateca de Buenos Aires, e a restauração de uma versão 30 minutos mais longa do que sua antecessora, "Metrópolis" pode agora ser apresentado em uma forma que reflete quase que completamente o seu original.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

domingo, 17 de outubro de 2010

A Lenda dos Guardiões


Lendas precisam ser bem contadas


Zack Snyder vem sendo reverenciado por parte da crítica especializada de forma um tanto incompreensível. Diretor das adaptações das HQs para o cinema “300” e “Watchmen”, alguns conseguem enxergar em seus longas-metragens algo de “revolucionário”, “inovador”, que este que vos escreve sinceramente não consegue. Ou será que sua câmera-lenta seguida de câmera-acelerada é algo tão especial assim a justificar tais adjetivos? Sinceramente, não acredito que seja. Os dois filmes citados são bons, mas nada que justifique uma grande ovação. Talvez a maior virtude de “300”, pegando o exemplo, seja sua fidelidade quase canina ao material que lhe deu origem (os quadrinhos de Frank Miller já eram suficientemente cinematográficos, o que facilitou bastante o trabalho do diretor), o que, de resto, já havia sido feito por Robert Rodriguez em “Sin City”. Já a adaptação da HQ de Alan Moore resultou rasa diante do potencial reflexivo da obra original, transformando-se muitos mais em uma trama de ação/super-herói do que em algo que faça o espectador pensar.

E é dentro deste nível bom-mas-nem-tanto que foi realizado este “A Lenda dos Guardiões”, animação com técnicas de CGI que impressiona pelo realismo, mas que possui uma trama sem muita novidade. Ela conta a estória da jovem coruja Soren, que passou a vida toda ouvindo as lendas contadas por seu pai sobre os Guardiões de Ga’Hoole, um grupo de corujas responsável por manter a paz em toda a floresta, paz esta que, no presente, é ameaçada pelo grupo dos Taitos, o qual sequestra e realiza uma espécie de lavagem cerebral nas jovens corujinhas para que estas passem a servi-los como autômatos. Soren é uma destas corujas, que ainda não aprenderam a voar, que são sequestradas pelos Taitos. Nesse processo, ele conhece a corujinha Gylfie, ao lado de quem escapará das prisões dos Taitos e buscará a ajuda dos Guardiões (que antes imaginava ser mesmo apenas uma lenda). Daí em diante, eu não vou falar o que acontece, mas também não difícil imaginar.

O roteiro (escrito por John Orloff e John Collee, baseados na série literária de Kathryn Lasky), além de previsível, possui alguns furos e questões mal resolvidas. Por exemplo: os Taitos escravizam as corujinhas para que seu trabalho alimente uma espécie de campo energético cuja origem e finalidade carecem de maiores explicações. Alguns momentos do longa também se mostram muito apressados. Parece haver sempre uma pressa em seu desenrolar, talvez porque a narrativa de cunho épico exigisse mais tempo para ser bem desenvolvida. O problema é que isto exigiria, por outro lado, uma paciência maior da faixa etária alvo do longa, o que não é uma característica típica da idade. O filme também tem um tom muito sério, o que não é necessariamente um defeito. Nem sempre crianças querem apenas rir ao ir ao cinema. Querem também viajar com aventuras e estórias de heroísmo. Contudo, para que essa viagem aconteça é necessário que a estória seja bem contada, o que, como dito, não é o caso do presente longa. Talvez isso seja resultado da direção via teleconferência inventada por Snyder, que estava no Canadá durante boa parte da produção (mas é interessante como, mesmo à distância, ele não esqueceu de inserir suas cenas câmera-lenta-e-acelerada).

Os aspectos técnicos, entretanto, são realmente impressionantes. Em várias sequências parece que estamos diante de corujas de verdade, tal o realismo com que foram concebidas. Para tanto também contribui muito a recusa de se atribuir características antropomórficas às corujas, algo muito comum em animações, e que acabou exigindo maior empenho da equipe na busca por soluções de movimentos. A expressão dos olhos, algo essencial para enxergarmos realidade nas emoções dos personagens (ainda mais em se tratando de corujas), também é muito bem realizada. Assim, a empatia com Soren e seus amigos é facilmente obtida com os pequenos.

Narrativas de transição e amadurecimento como esta de “A Lenda dos Guardiões” são necessárias para a infância, sendo importantes para ajudar os pequenos a ter referências de conduta. É assim desde os primórdios da humanidade, quando essas lendas eram transmitidas de geração em geração. Contudo, é necessário que o contador de estórias seja bom, garantindo a atenção dos pequenos. Em uma próxima experiência, é importante que Snyder se lembre dessa necessidade, dando atenção ao roteiro tanto quanto dá à técnica empregada.


Cotação:

Nota: 7,0

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O Homem das Mil Caras




Faço uma pausa no cinema para postar um texto de minha autoria sobre a atual conjuntura das eleições. Não dá mais para aturar certas coisas. O texto surgiu em resposta a um e-mail que recebi com um artigo do pseudo-cineasta e pseudo-cronista Arnaldo Jabor. Segue:


Ah, mais um dos textos do Jabor, um cineasta incrível, que sempre quis ser Truffaut, mas só conseguiu ser Arnaldo Jabor... Nele, destila toda a sua veia de grande cronista (merecia o Nobel, não acham?), digna das elites paulistas virtuosas que querem voltar ao trono do qual nunca poderiam ter saído (ainda mais para colocarem um metalúrgico no lugar) via José Serra, o homem das mil caras, e o PIG, aquele grupo da imprensa (como Veja, Globo, Folha...) que só publica notícias com total isenção, sem distorcer fatos e mostrando sempre os dois lados da balança. De Erenice Guerra, 1435 manchetes, mesmo que para isso se valha de informantes com um certo Qúícoli, com condenação criminal nas costas e dono de uma suposta empresa de fundo de quintal, o qual queria um empréstimo de bilhões junto ao BNDES. O PIG argumenta que ele não recebeu o empréstimo porque não pagou propina ao filho de Erenice. Que absurdo, não é? Que coisa mais sem escrúpulos o BNDES não emprestar bilhões a uma empresa de fundo de quintal!!! Para que serve o BNDES, afinal? Apenas para emprestar a empresas sólidas, que forneçam garantias de pagamento? "Que horror", diria o Diogo Mainardi! O tal Quícoli depois desmentiu tudo, mas o Diogo e seus colegas bastiões da probidade administrativa esqueceram de divulgar esse detalhe mínimo. O que importa, se ele desmentiu muita coisa, né? O que vale é a versão, não os fatos.

O Diogo adora falar do mensalão do PT, mas esquece que esse mesmo esquema surgiu via tucanato de Minas Gerais, com um certo Eduardo Azeredo. Falando em tucanos: eles queriam colocar como vice do Serra um tal de Arruda lá do Distrito Federal que, dizem as más línguas (ou boas, quem sabe?), foi pego colocando dinheiro público na meia. Ia ser a dupla dos dois carecas, no melhor esquema vote num careca e leve dois. Mas o Diogo, que trabalha para uma certa revistinha muito popular entres aqueles da classe média que se julgam muito inteligentes (já mencionada acima), vive esquecendo de mencionar esse fato. Afinal, ficou melhor assim: antes um índio do que um careca como vice, não é verdade?

Esse Índio (melhor assim, com maiúscula, para não ofender os índios) escolhido pra vice percebeu que Serra não conseguiria enfrentar a candidata de Lula apenas com seu discurso meia-boca de que o Brasil pode mais. Daí bolou uma estratégia infalível: contatar grupos neo-nazistas para espalhar e-mails na internet jogando temas como o aborto na pauta da eleição. Afinal, ela já afirmou que era a favor da descriminalização do aborto! "Vai ficar nas cordas"! O Serra agora adicionaria mais uma cara às suas mil até então existentes: o de neo-carola! Mesmo que para isso fosse necessário esquecer que ele próprio regulamentou a prática do aborto na rede pública de saúde... Ora, mas é só mais uma cara. Uma a mais e outra a menos, não faz mal, né? 1001 dá até pra virar livro e faturar um bocado com o título: "Mil e um caras de José Serra para ver antes de morrer". Com o apoio de padres e pastores de comportamento medieval, e da ilustre esposa do careca que saiu espalhando por aí que "Dilma mata criancinhas", conseguiram levar a eleição para o segundo turno. O povo brasileiro é assim mesmo, adora um boato. Foi assim que Collor derrotou Lula em 2002, lembram? Com um monte de boatos.

Opa, mas surgiu um problema: nem todo mundo é protestante ou católico! Putz, e agora? Seguimentos como os dos homossexuais iriam deixar de votar no Zé Faz Tudo (segundo o próprio, foi ele que fez os genéricos, o celular, a dinamite, o automóvel, a luz elétrica, descobriu o Brasil e escreveu a primeira carta). Não pode, né? Então, o Zé Chirico abandona (ou não) sua carapuça de carola e diz que é favor da união de homossexuais! Ué, mas os padres e pastores não estavam dizendo que ele era o homem que iria preservar os "bons costumes"? Como ficarão os seus rebanhos agora? Nenhum problema, né? Afinal, o Zé Pedágio, mesmo sendo a favor do casamento gay, continua sendo um homem de Deus. Essa é só mais uma de suas mil faces (já são 1002), não tem problema! Um homem santo desses pode falar o que quiser, até dizer que a culpa da péssima situação da educação em São Paulo, estado que governou por 3 anos e meio (e que está há 16 anos nas mãos do seu partido), é dos nordestinos que migram para um território que só deveria ser de uma elite branca, paulista e rica. Sem espanto! Essa só mais uma cara do velho Zé, como ele gosta de ser chamado atualmente (1003). Ele mesmo já disse: "sempre convivi com nordestinos com muita normalidade"... É normal "conviver com nordestinos", né não? É que pro Zé é o seguinte: educação se resolve mandando a polícia bater nos professores quando eles fazem greve. Seu colega FHC sempre disse que o Brasil estava repleto de vagabundos e vagabundo se trata com cacetada! É isso aí! Marreta nos professores!

Os seus assessores também não achavam legal a imagem de privatista que ele adquiriu, com todo o merecimento, durante os anos de governo FHC e de seu próprio (des)governo em São Paulo. Daí começaram a dizer que ele é um grande estatista. Até o próprio Zé começou a acreditar nisso e disse que tem uma relação muito próxima com a Petrobras (que queriam transformar em Petrobrax durante a gestão tucana na presidência). Ele só não contava que seu velho amigo FHC fosse dar entrevistas por aí dizendo que ele, Zé, era o que mais insistia em privatizar as estatais durante os oito anos de seu governo! Que maldade, FHC! Por que fazer isso com seu velho companheiro de lutas? Vocês não estudaram juntos? Ah, não, esqueci! Zezinho não concluiu curso superior... Formou-se tecnólogo em um curso de Economia da Cepal e conseguiu pós graduação nos EUA porque lá não se exigia graduação para se fazer uma pós. Mas, nada de mais colocar isso no currículo! Afinal, Zezinho não se formou porque teve que fugir pro Chile (ou quis fugir) por ter integrado a AP (Ação Popular), grupo responsável por ações armadas durante o governo militar. Nada contra. Afinal, estava lutando pela democracia. Mas por que então ele critica tanto a sua adversária por ela ter participado de movimentos contra o regime militar? Ah, já sei, mais uma das caras do Zezinho! Tudo bem! Agora são 1004!

Qual será a 1005? Ah, lembrei! Ele disse que não conhecia o Paulo Preto, o tesoureiro do PSBD responsável pelo sumiço de 4 milhões do caixa 2 da campanha tucana... Mas... ele não estava do lado do Serra na inauguração do Rodoanel? Zezinho tinha esquecido dele... Aliás, a Globo também tinha esquecido disso tudo, já que só hoje lembrou-se de veicular no Jornal Nacional a existência desse "factoide absurdo contra o Zezinho". De qualquer forma, é como eu sempre venho dizendo: coisas do Zé Chirico! Ele tem muitas faces, mais de 1000! Ele pode tudo!

Zé Chirico, você não sabe o quanto eu admiro seu poder de interpretação! Como um homem pode ter 1005 faces? Ah, pode ter mais? Estou aguardando ansiosamente pelas 1006ª, 1007ª...

De um admirador que sempre acreditou que você ainda vai levar o Oscar!

Fábio Henrique Carmo.

P.S. Todas as informações acima podem ser pesquisadas na internet. Nada foi inventado por este que vos escreve. Se quiserem conferir, é só se valerem do nosso amigo Google! Abraço!




quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Quero Ver Novamente #7

Acredito que todos que frequentam espaços como o "Cinema Com Pimenta" tomaram conhecimento da morte de Tony Curtis no último dia 30 de setembro. Pois bem, para corrigir a falha de ter deixado passar em branco o registro do fato aqui no blog, segue abaixo o trailer de "Quanto Mais Quente Melhor", sem dúvida um dos filmes mais engraçados de todos os tempos! Um verdadeira obra-prima do mestre Billy Wilder! Em raras oportunidades ri tanto ao ver um filme! Confira!


sábado, 9 de outubro de 2010

Tropa de Elite 2



Doa a quem doer!


Desde “Cidade de Deus” a temática da violência urbana se tornou lugar-comum na produção cinematográfica nacional. Uma profusão de “filmes mundo cão” dominou as salas de cinema e, devido à enorme quantidade, faz-se necessário separar o joio do trigo. Se o citado longa-metragem de Fernando Meirelles causou impacto não apenas no Brasil como também internacionalmente, tivemos, por outro lado, bombas como “Última Parada 174”. Entre os pertencentes ao primeiro grupo, está “Tropa de Elite”, longa de José Padilha que, em 2007, fez o País discutir a criminalidade e a forma de combatê-la. Não é à toa que acabou levando o Urso de Ouro no Festival de Berlim, evento que costuma premiar produções vanguardistas ou que trazem à baila discussões sociais relevantes. Ademais, transformou em ícone o Capitão Nascimento, personagem interpretado magnificamente por Wagner Moura (na minha opinião, o melhor ator brasileiro em atividade) e ainda gerou vários bordões que caíram na boca do povo (como o famoso “pede pra sair”). Três anos depois deste fenômeno pop, após recusar até mesmo realizar uma série para a poderosa Rede Globo (e depois de muito disse-não-disse) eis que Padilha nos traz a aguardada continuação “Tropa de Elite 2”. E a verdade é que o autor, agora, parece querer desencavar ainda mais as caveiras de burro que estão no fundo da criminalidade que assola não apenas o Rio de Janeiro, mas todo o Brasil. Ele, quase literalmente (e com perdão da expressão), joga a merda no ventilador.

Ao mostrar a passagem do agora Coronel Nascimento para um cargo burocrático na Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, em decorrência de uma criticada ação do BOPE em uma rebelião dentro de Bangu I, Padilha chafurda na lama da corrupção existente no seio da própria polícia, um câncer responsável pela perpetuação da violência na mesma proporção do tráfico nas favelas. Se o foco do primeiro longa era a hipocrisia da classe média, a qual alimenta o tráfico com seus consumidores, aqui a mira se volta para aqueles que, antes de tudo, deveriam combater o crime, mas que no fundo se alimentam dele para assegurar a manutenção de seus interesses. Idolatrado pela população, para a qual “bandido bom é bandido morto”, mas criticado por grupos defensores dos direitos humanos e pela mídia, que o vêem com fascista, Nascimento (assim como muitos dos espectadores) vai descobrindo que o buraco é muito mais embaixo. Assim, “Tropa de Elite 2” transforma-se em uma peça ainda mais política do que sua antecessora, dona de um potencial explosivo ainda mais forte diante do quadro eleitoral em que o país vive.

Todavia, claro que o filme de Padilha sabe levar todo esse discurso politizado de uma forma palatável para as massas. Com acabamento mais uma vez hollywoodiano, o diretor dá uma verdadeira aula até mesmo aos ianques de como se fazer um filme policial. Dono de um ritmo que jamais oscila devido à edição brilhante de Daniel Rezende (indicado ao Oscar por “Cidade de Deus”), ele consegue discutir o complexo tema da violência urbana sem jamais cair na chatice, deixando o espectador grudado na cadeira ao mesmo tempo em que reflete as temáticas discutidas (sempre pontuadas, mais uma vez, pela narração em off de Nascimento). Com enquadramentos perfeitos, a fotografia também tem os seus méritos, ao mesmo tempo em que o roteiro, escrito pelo próprio José Padilha e Bráulio Mantovani, se desenvolve de forma precisa, redonda e sem concessões para possíveis finais felizes (e com uma violência talvez ainda mais brutal que na primeira parte).

Com relação ao elenco, tal como ocorreu no primeiro episódio, temos os seus pontos altos e baixos. O Milhem Cortaz, como o policial Fábio, continua canastrão como de hábito, muito embora o seu personagem seja um dos melhores da trama. Já André Ramiro, com o seu André Matias (que agora é capitão), mais uma vez tem participação destacada, mesmo que o foco desta oportunidade seja mais centrado em Nascimento. Falando neste último, o personagem adquiriu características ainda mais tridimensionais, principalmente na abordagem da relação com o seu filho, mostrando-se também como um pai que tem dificuldades de relacionamento com o garoto. Mostra-se também falível na sua profissão e na relação com os amigos, cometendo seus erros e omissões. Essa abordagem mais humana do personagem dá ainda mais espaço para o show habitual de Wagner Moura, que consegue imprimir uma verdade na tela poucas vezes vista na história do cinema (não só do cinema nacional). Insisto que, em certos momentos, sua atuação alcança níveis brandonianos. Seus diálogos com André Matias (com direito a closes que não permitem subterfúgios aos atores) são especialmente interessantes e memoráveis (uma em especial, que trata sobre a ida de Nascimento para a subsecretaria de inteligência, já está entre as melhore que vi esse ano). Além disso, André Mattos está hilário como apresentador e deputado Fortunato, garantindo alguns risos diante do clima tenso.

E assim, Padilha consegue desferir mais um soco no estômago dos brasileiros. Um soco dirigido para todos os lados, seja a sociedade, os governos (independente de posição partidária), políticos, mídia (há um momento em que esta é mostrada de forma realmente repugnante), polícia, ricos, pobres etc. Na realidade, a conclusão a que ele parece chegar é de que o verdadeiro embate a ser travado em nossa Nação não está entre esquerda e direita, partido A ou partido B, mas entre corruptos e não corruptos, entre os de caráter e os sem caráter. [SPOILER] Nesse ponto, é notável que coloque, ao fim do filme, do mesmo lado e com a mesma integridade, os personagens de Nascimento e do deputado defensor dos direitos humanos Flagra, em contraposição à antipatia e rivalidade primordial dos dois [FIM DE SPOILER]. Uma obra corajosa e apta a gerar ainda mais discussões do que o primeiro. Doa a quem doer!


Cotação:

Nota: 10,0

Obs. Mesmo que de forma tênue, creio que Padilha dá a entender suas posições partidárias por meio das gravatas de certos personagens. Fique atento(a)! ;=)

John Lennon: 70 anos!

Pausa no cinema!
Se vivo fosse, John Lennon, um dos maiores músicos e personalidades do século XX, estaria completando 70 anos. Abaixo, o videoclip de "Imagine", emblemático e lindo em sua simplicidade! Valeu, John! Feliz aniversário!


quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Filmes Para Ver Antes de Morrer

Tropa de Elite
Eu estava com essa carta na manga há algum tempo. Às vésperas da estreia nos cinemas de "Tropa de Elite 2", publico no "Cinema Com Pimenta" a resenha que escrevi para o filme original quando do seu lançamento, ainda inédita neste espaço. Só aviso que ela é beeeeeeeeemmm longa... Avisado(a)? Se desejar, continue abaixo!




Tropa de Elite osso duro de roer! Pega um, pega geral! Ela vai pegar você!!!!!!


Muito já foi debatido e questionado sobre “Tropa de Elite”, o filme brasileiro mais comentado do ano, não só pelo fato de ter sido amplamente pirateado, mas principalmente pela temática que carrega. Diante de tudo que já foi falado em todos os meios de comunicação (na “imprensa escrita, falada, televisionada e virtual”), não posso deixar de “meter o meu bedelho” nesta balbúrdia de opiniões que tomou a pauta nacional, seja no botequim, seja nos chamados “círculos acadêmicos”. Dada a complexidade do tema, preferi dividir este texto em duas partes distintas: na primeira, passarei a uma análise de “Tropa de Elite” enquanto obra cinematográfica. Em um segundo momento, passarei às repercussões sociais trazidos pelo longa. E vamos ao que interessa!

Tropa de Elite – O filme

Antes de adentramos especificamente na análise do filme de José Padilha, convém lembrarmos dos seus “ancestrais”, remotos e próximos, os quais parecem ter influenciado o diretor na construção de “Tropa”. Três podem ser citados como claros “avós” deste último.

O primeiro deles é Taxi Driver, obra do genial Martin Scorsese, um dos maiores diretores americanos vivos (ao lado de Clint Eastwood). Nele, Scorsese nos mostra a vida de um taxista novaiorquino, Travis Brickle, interpretado magistralmente por Robert De Niro. Travis é um pária social, um “esquecido”, ou “loser” como gosta de afirmar pejorativamente a sociedade americana. Em meio a uma Nova York pré Rudolph Giulianni, dominada por criminosos, Travis, gradualmente, vê-se imbuído de um sentimento misto de justiça e vingança, levando-o a cometer uma série de assassinatos, uma verdadeira “faxina” social. Em outras e mais claras palavras: justiça com as próprias mãos. Em sua época, suscitou reações diversas na sociedade americana, gerando discussões entre aqueles que apoiavam sua “limpeza”, e aqueles viam na sua atitude um caráter fascista. Como se pode observar, debate bem parecido com o que vivemos atualmente em nossas terras tupiniquins. Aliás, a influência é diretamente assumida por Padilha através da seqüência em o policial Neto “treina” em frente ao espelho em sua residência. Qualquer um que já tenha assistido a Taxi Driver lembrará imediatamente da cena em que Travis pratica pontaria em frente ao espelho. Qualquer semelhança não é mera coincidência.

Outra obra que vem à memória quando assistimos a “Tropa de Elite” é, sem dúvida, Apocalypse Now, dirigido por outro genial cineasta, Francis Ford Coppola. Em vários momentos, não pude deixar de associar a conduta obsessiva do capitão Nascimento com a paranóia do coronel interpretado por Robert Duvall, o qual gostava do cheiro de napalm pela manhã porque era “o cheiro da vitória”. Ou seja, vitória a qualquer custo, mesmo que para isso se valha estratégias imorais. No caso do coronel, a terrível arma química que atingia inúmeros inocentes; no caso de Nascimento, tortura e assassinatos para combater o tráfico. Este aspecto será melhor debatido no momento oportuno. De qualquer forma, a famosa frase do coronel Kurtz (este interpretado por Marlon Brando) parece cair como uma luva ao fim das duas obras: “O horror! O horror!”.

Em terceiro lugar, podemos citar mais um filme, de mais um cineasta absoluto: Stanley Kubrick. Em seu “Nascido Para Matar”, Kubrick nos mostra o processo de brutalização a que são submetidos os soldados preparados para guerra (no caso, a do Vietnã). Kubrick nos mostra que até os mais sensíveis são condicionados a se transformarem em máquinas de matar, tornando-se indiferentes ao sofrimento alheio (e, em alguns casos, ao próprio sofrimento). Está lembrando do treinamento dos soldados do BOPE? Sim, mais uma vez qualquer semelhança não é mera coincidência. Em vários momentos, o capitão Nascimento me fez lembrar o brutal sargento responsável pelo treinamento dos soldados no filme de Kubrick. E, vejam que curioso, dois filmes de guerra citados como referências para o longa de Padilha. Uma importante conclusão, que será também melhor explicitada mais abaixo, podemos tirar dessa “semelhança”: o BOPE vê a ação nas favelas como uma guerra, mesmo que não declarada oficialmente.

Por último, o que podemos chamar não de “avô”, mas de “pai” de Tropa de Elite é, obviamente. “Cidade de Deus”, o longa de Fernando Meirelles que causou impacto não apenas nacional, mas no mundo todo. Muitos até afirmam que “Tropa de Elite” é um “Cidade de Deus” da polícia. O mesmo tema visto através de olhos opostos. E isto, em parte, é verdade. Mas não apenas no campo temático.

Padilha utiliza vários dos artifícios usados por Meirelles para prender o espectador. Primeiramente, um roteiro muito bem amarrado, pensado em detalhes, com nuances de ação e comédia que envolvem o grande público. Seus aspectos técnicos também são de primeira linha: som e edição de som com qualidade hollywoodiana, fotografia vibrante e trêmula (embora menos “estética” que a de Cidade de Deus), montagem alucinante, fazendo com que o longa jamais perca o ritmo. Há, ainda, a narrativa em “off”, realizada por um personagem que parece ser o central da trama, mas que na realidade não é (em “Cidade”, Buscapé; em “Tropa”, o capitão Nascimento).

E é inegável que “Tropa de Elite”, com a direção segura de José Padilha, constitui ótimo cinema ,tal qual seu outro longa, o documentário, brilhante é importante ressaltar, “Ônibus 174”. É bem interessante, por sinal, fazer uma leitura de “Tropa de Elite” depois de ter visto “Ônibus”. Os dois podem soar até como contraponto um do outro. No documentário, somos levados a compreender as razões e circunstância que levaram Sandro do Nascimento a cometer aquele ato de loucura dentro de um ônibus de linha urbana na cidade do Rio de Janeiro. Constatamos a vida inteira de privações e abandono a que foi submetido (passando em resumo: Sandro não teve pai, viu sua mãe ser assassinada na sua frente, viveu nas ruas, teve seus amigos chacinados na Candelária, ele próprio escapando por pouco). É impossível não nos sentirmos todos culpados por aquela tragédia, ao fim do filme. Já em “Tropa” temos a visão dos policiais, como eles enxergam o tráfico e os motivos que levam os membros do BOPE a praticarem os atos de selvageria e desrespeito à garantias civis. Mas da mesma forma, desfere um “soco no estômago” das classes mais abastadas ao colocá-la como sócia do narcotráfico. Talvez a grande “mensagem” (para utilizar um termo clichê) de ambos os longas seja a de que não existem inocentes, todos temos responsabilidade pelo atual estado de medo e conflito que aflige nosso país.





Há ainda um aspecto fundamental a ser enaltecido para a eficiência de “Tropa de Elite” como cinema: o elenco. Muito bem escolhidos pelo cineasta (e com preparação de Fátima Toledo), todos estão bem. Tanto Caio Junqueira (Neto) como André Ramiro (Matias), mostram muita competência na interpretação dos soldados iniciantes do BOPE. Todavia, quem definitivamente rouba a cena, por meio de uma atuação realmente magnífica, é Wagner Moura. O seu Capitão Nascimento entrará, sem dúvida, para o rol dos personagens mais marcantes do cinema nacional, assim como entrou o Zé Pequeno de Luís Firmino da Hora. Aliás, boa parte dos sentimentos de apoio do público talvez não existisse se o personagem não tivesse sido interpretado por um ator deste nível de excelência. É mesmo uma atuação digna de um Robert De Niro, Jack Nicholson, ou mesmo um Marlon Brando. Fosse um ator norte-americano, provavelmente o Oscar estaria em suas mãos. Seu Nascimento é brutal, mas ao mesmo tempo detém uma autoridade que pode tornar inquestionáveis seus atos mais atrozes, geralmente vistos pelo próprio como um “mal necessário”.

A trilha sonora também conduz o espectador no ritmo do que é visto na tela. Muitos apontaram a trilha como um elemento “fascista” da obra, o que me parece idéia de gente que não tem o que dizer nem o que fazer. Scorsese, por exemplo, muitas vezes utilizou rock em sua trilhas, e nem por isso foi chamado de fascista (muito pelo contrário).

Em síntese: Tropa de Elite é, de fato, um filme excelente digno de palmas. Se você está querendo ver um bom filme, independente de qual corrente “ideológica” você pertença, pode assistir sem medo, pois verá um grande. Aliás, o só fato do longa de José Padilha gerar tanta discussão demonstra que algo de bom ele deve ter, afinal, filmes que geram discussões são cada vez mais raros no meio deste mar de mediocridade que ora impera em nossas salas de cinema. E é da discussão que trataremos na segunda parte desta análise.

Tropa de Elite – A Polêmica

Fascista. Este é o principal adjetivo que vem sendo atribuído ao filme ora em debate por seus críticos. Padilha vem sendo acusado sistematicamente de defender as ações brutais do Batalhão de Elite da polícia militar do Rio de Janeiro. Mas será que o adjetivo lhe cai bem?

Talvez seja um tanto exagerada. É bem verdade que somos apresentados aos fatos, durante a projeção, pela visão, um tanto de distorcida (pelo menos pra mim) do capitão Nascimento, através de sua narrativa em “off”. E isso induz a platéia, pelo menos a sua parcela mais “influenciável”, ou menos conhecedora da temática da criminalidade, ou simplesmente mais reacionária, a aceitar como necessários os métodos brutais, que incluem tortura e assassinatos, usados pelo Batalhão de Operações Policiais Especiais – BOPE. Mas, se há verdade nessa afirmação, além da forma vibrante como o filme é narrado (o que pode fazer com que os mais exaltados saiam por aí gritando “faca na caveira”), também é falsa a afirmação de que a postura do capitão de não sentir “remorso”, de que o filme não retrata os conflitos psicológicos a que os soldados do batalhão são submetidos. Ora, o personagem do capitão, ao longo de toda a narrativa, procura justamente encontrar um substituto por não suportar mais o stress a que é submetido. Ademais, mostra-se que se sentiu culpado em ter matado um “fogueteiro” em uma de suas ações na favela. “Eu senti remorso e um policial do BOPE não pode ter remorso”, afirma a certa altura. Por outro lado, acusar Padilha de ser um radical de direita soa um tanto ridículo, principalmente ao lembrarmos de uma das feridas cutucadas pelo longa: a participação das classes altas como financiadora do tráfico. Olhando por este prisma, talvez alguns o considerem um “radical de esquerda”, pecha que lhe foi atribuída por muitos após “Ônibus 174”.

Na realidade, discutir se a obra cinematográfica é fascista, ou não, é de uma pobreza sem tamanho. Um artista expõe em sua obra a sua visão de mundo e o fato de alguns não concordarem com esta visão de mundo não diminui o valor da obra. Sergei Eisenstein era membro do partido comunista soviético e isso não impede que sua obra seja reconhecida como genial mesmo pelos norte-americanos. Da mesma forma, Leni Riefensthal fez documentários divulgadores do partido nazista e de sua tosca ideologia, o que também não impediu o mundo de reconhecer seus méritos cinematográficos.

Mais interessante que perquirir se o filme é ou não fascista, é perguntar se as idéias do capitão Nascimento, mostradas na tela, são ou não são válidas dentro da contingência atualmente enfrentada pela sociedade brasileira.

Para responder a esta pergunta, é necessário fazermos antes um novo questionamento: a sociedade brasileira vive hoje um estado de guerra? A pergunta é pertinente devido às conseqüências que uma resposta afirmativa pode gerar. Se admitirmos que vivemos uma situação de guerra poderemos admitir a suspensão de garantias individuais e encararmos os atos bárbaros do capitão da tropa como admissíveis (ou pelo menos uma destes atos), tendo em vista que uma guerra comporta medidas de exceção. Se, por outro lado, não reconhecermos a existência de um estado de guerra em nossas ruas, jamais poderemos admitir que o Estado (e os membros do BOPE são agentes do Estado, não podemos esquecer esse detalhe) atinja as regras que garantem a sua própria existência enquanto Estado democrático.

Todavia, se a resposta for “sim”, a suspensão dos direitos individuais não pode ser admitida apenas para “os outros”, para a parcela pobre e marginalizada da população, como parece defender o decepcionante apresentador Luciano Huck em seu lamentável artigo para a Folha de São Paulo. É bom lembrar o verdadeiro soco no estômago da classe média que é desferido pelo filme de José Padilha. Os extratos mais abastados da “hierarquia” social têm enorme responsabilidade pela manutenção do tráfico. Da mesma forma que a Coca-Cola tornou-se uma multinacional com sede em todos os lugares do globo porque tem muitos consumidores para o seu produto, o tráfico também só é um ramo muito “rentável” porque existe um enorme número de consumidores para as drogas, a maior parte deles de classes abastadas.

O “tapa na cara” dado na classe média é tão forte que muitos apressadinhos e pseudo-intelectuais de plantão já “colocaram na pauta” das discussões do país a descriminalização das drogas como “principal fator” para combater a violência reinante nas favelas. Nada mais hipócrita. Isso não passa de uma tentativa de, desculpem a expressão, livrar o rabo da classe média da seringa, pois ao comprar drogas de forma legal ela estaria se eximindo da responsabilidade pelo tráfico. Trata-se porém de uma falácia em várias vertentes. Fernandinho Beira-Mar jamais venderia sua droga pagando imposto, e a própria classe média não iria querer comprar sua droga mais cara. Eu fico estarrecido com argumentos como “o álcool é mais nocivo do que várias drogas ilegais”. Mentira! Um copo de vinho não faz mal a ninguém. O mesmo não pode se dizer de um cigarro de maconha ou de uma “carreira” de cocaína, como já muito divulgado pelos especialistas da área. É impressionante até que ponto pode ir a burguesia em defesa de seu hedonismo desmedido.

Vale dizer que, dentro das reações que o filme me despertou, não deixei de sentir uma certa satisfação ao ver o personagem de Matias dando uns tabefes nos playboyzinhos colegas no seu curso de Direito. São pessoas que possuem todas as escolhas, mas preferem se associar ao crime, chegando a alegações absurdas de que traficantes “possuem consciência social”. Eu sinto faltar toda a minha paciência, sendo bem sincero.

Assim, caso admitamos a existência do Capitão Nascimento temos que admitir que ele também invada nossas próprias casas e não apenas a do outro. Deveremos admitir também que ele torture nossos parentes, mesmo que talvez eles não saibam o paradeiro de determinado delinqüente. O que talvez exista de mais nefasto no Brasil não é a violência absurda que aparece todos os dias nas capas dos jornais e em filmes como este, mas maldita divisão da sociedade em castas, onde alguns parecem ser imunes a qualquer ação do Estado, por mais nocivo que seja seu comportamento. Como diz o lema da tropa, transcrito no início deste texto: “pega um, pega geral”. Nada de “discriminações”.

Talvez o que o longa de José Padilha queira mesmo nos passar seja exatamente essa idéia, já anteriormente presente em “Ônibus 174”: por favor, chega de hipocrisia! Somos todos integrantes de um grupo social e, portanto, responsáveis pelas mazelas deste grupo. Está na hora de encararmos nossas responsabilidades para que, assim, não precisemos mais de homens como o capitão Nascimento.

Ah, já quase me esquecia de dar a nota ao filme.


Cotação:

Nota: 10,0

Em tempo: Acho que vou chamar o Capitão Nascimento para pegar o Diogo Mainardi! Hahhahahhahahahhahhaha!

Eu Quero Esse Pôster #10


Na imagem acima, um belo poster de um filme mais belo ainda, "A Aventura", clássico atemporal do mestre Michelangelo Antonioni!

sábado, 2 de outubro de 2010

Comer, Rezar, Amar




Auto-Ajuda na Telona


Antes de tudo, devo adiantar que eu não tenho muita simpatia por Julia Roberts. Desde sua explosão, com o mais do que reprisado na TV “Uma Linda Mulher”, acredito que Roberts vem sempre fazendo o mesmo papel, apenas com algumas variações. Além disso, sua presença se tornou sinônimo de cinema comercial programado para agradar às massas classe média que frequentam salas de cinema, constituindo aquele típico produto formulaico para comer com pipoca. Ou seja, Roberts personifica aquele lado mais criticável do cinema americano, qual seja, a acomodação que garante resultados financeiros.

Confesso que este seu novo trabalho, “Comer, Rezar, Amar” me inspirava a mesma expectativa. E, de fato, ela foi, ao menos em parte, confirmada. Julia Roberts continua a mesma, não fazendo nada além do que a sua costumeira performance sem sal. O que torna este novo longa-metragem algo um tanto diferente da média de seus projetos é o texto que serve de base para o seu roteiro, uma adaptação do best-seller homônimo de Elizabeth Gilbert, que já vendeu milhões de exemplares em todo o mundo. Não que eu seja fã de auto-ajuda, longe disso. Sequer li a obra literária, mas não se pode negar que vemos em tela a abordagem de algumas questões interessantes.

Liz Gilbert é uma mulher que procura superar o trauma de um divórcio após um casamento de 8 anos, cujo fracasso ela própria atribui à sua inconstância e falta de auto-conhecimento. Parte, assim, para uma jornada que a levará a pontos diversos do globo terrestre, entre eles Itália, Índia e Indonésia. Em outras palavras, trata-se daqueles filmes de “transformação”, em que a protagonista passará a compreender e enxergar a vida com novos parâmetros, resultando em maior amadurecimento. Possui conexões, assim, com obras como “Amor Sem Escalas” e com muitos road movies que volta e meia baixam nas salas de cinema. A diferença é que, apesar de Liz viajar muito, sua trajetória não se dá através de uma única viagem, ao longo de uma estrada quase interminável. Variados serão os destinos da sua trajetória, todos alcançados por meios aéreos (o que deixa este longa mais próximo do citado filme com George Clooney). É ao longo dessas viagens que o três verbos que constituem o título serão conjugados pela personagem. E mais não digo, pois poderá comprometer alguns dos prazeres do longa. Liz sintetiza, desta froma, as angústias da mulher moderna (não é à toa que seu livro se tornou um sucesso absoluto no meio feminino), que procura descobrir o que realmente quer da vida e, principalmente, dos relacionamentos, já que, ao mesmo tempo em que nunca consegue estar sozinha, jamais permanece feliz por muito tempo com os seus companheiros.

Não se pode negar que há uma comunicação muito maior da trama com o público feminino, em detrimento do masculino, até pelo próprio material que lhe deu origem. Contudo, mesmo para a plateia mais cheia de testosterona o filme não se torna desinteressante. Afinal, algumas das questões levantadas são próprias de seres humanos, não sendo exclusivas das mulheres, e o filme é muito bem conduzido por Ryan Murphy (diretor da série televisiva “Glee”), com imagens belíssimas que irão levar muitos direto da sala de cinema para a agência de viagens mais próxima. Murphy erra, porém, ao estender um pouco demais o longa, que passa a impressão de começar a se arrastar a certa altura, muito embora seu terceiro ato seja um tanto apressado (talvez exatamente porque se tenha perdido muito tempo nos anteriores), o que acaba dificultando a conexão do espectador com a intensidade dos sentimentos do personagens.

Outro problema diz respeito à forma como vemos os diversos momentos de Liz. Não sei se por culpa da mesmice de Julia Roberts ou do diretor, todos os momentos de Liz aparecem da mesma forma amena, mesmo os mais duros. Tudo fica muito pasteurizado e acaba representando pouco da transformação que vive a personagem (principalmente ao lembrarmos que ela é real). Elizabeth Gilbert, a autora, não deve ter muito a ver com a Julia Roberts da tela, sempre Julia Roberts. O personagem de Javier Bardem, por outro lado, surge como aquele homem dos sonhos de boa parte das mulheres no mundo, encarnando muito do que elas concebem hoje como um “príncipe encantado”. Não sei se Gilbert encontrou um homem assim na realidade, mas isso leva o filme a cair em um grande clichê, sem dúvida.

E assim, percebe-se que “Comer, Rezar, Amar” poderia ter se tornado um produto bem mais denso se não fosse voltado para um público que espera ver Julia Roberts de novo em ação nas telas. Tivesse sido adaptado na Europa, poderia render até um longa de arte. Mas isso é Hollywood, no fim das contas, a qual pode até surpreender em alguns casos, mas no geral transforma tudo em algo para se ver comendo pipoca. Salvam-se as indagações da verdadeira Elizabeth Gilbert, as quais conseguem deixar o longa numa honrosa nota 7,0.

Obs. Há elementos especiais na exibição para nós brasileiros, mas não vou estragar o prazer dos que ainda não viram o filme ou não leram o livro.


Cotação:

Nota: 7,0