Pronto: segue abaixo a resenha de "Watcmen - O Filme".
Eletrocardiograma
“Watchmen”, sem dúvida, é um triunfo da hoje denominada “nona arte”. Lançada em 1986 pela DC Comics, a obra concebida por Alan Moore e com traços de Dave Gibbons provocou, juntamente com “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, de Frank Miller, uma revolução no gênero de super-heróis. Sua repercussão e influência foram tão grandes que a revista Time colocou a obra de Moore-Gibbons entre os romances mais importantes desde o ano da criação da revista (em 1923). Vencedora de inúmeros prêmios, entre eles o mais importante do gênero quadrinhos, o Eisner Awards, tornou-se lugar-comum designá-la como “a graphic novel mais aclamada de todos os tempos”, bordão que inclusive foi utilizado na campanha promocional deste “Watchmen – O Filme”.
Há anos os estúdios de Hollywood pretendiam realizar a transposição da HQ para o cinema, empreitada que se mostrava bastante temerosa pela própria essência da trama concebida por Moore. Este pretendeu, com “Watchmen”, desmistificar a concepção de super-heróis, mostrando-os como seres humanos comuns, destituídos de poderes especiais (à exceção do Dr. Manhattan, claro), cheios de problemas, frustrações e até falhas de caráter como todos os seres humanos. Ademais, seus personagens mostravam-se extremamente bem construídos, densos, dotados não apenas de um presente, mas de toda uma história de vida, tornando-os tridimensionais. Não que neste aspecto isso fosse realmente original. A diferença está no fato de que não foram os momentos traumáticos da vida destes personagens que os levaram a viver como combatentes do crime, ou pelo menos não diretamente (como no exemplo clássico das HQs em Batman, o qual se torna um vigilante por conta do assassinato dos seus pais). É bom até mesmo dizer que um dos “heróis” de “Watchmen” está mais para um psicopata (Rorschach), enquanto outro é completamente destituído de moral (o Comediante). Como levar isso para um público totalmente acostumado com outra ideia de super-heróis, lotando salas para ver as proezas de personagens como Homem-Aranha e Super- Homem? Bom dizer que uma adaptação convincente exigiria não só um bom roteiro, mas também um investimento no melhor padrão “blockbuster”, capaz de tornar crível uma figura como a do Dr.Manhattan, por exemplo.
Depois do sucesso absoluto de “Batman – The Dark Knight”, a Warner tomou coragem e resolveu investir em mais essa adaptação de HQ soturna e, depois de uma enorme pendenga judicial com a Fox pelos direitos sobre a adaptação, tivemos o lançamento do filme no último dia 06 de março, alcançando o topo das bilheterias nos EUA, muito embora numa escala menor do que a esperada.
Devo dizer, até como um “iniciado” na obra original, que os primeiros minutos do longa-metragem realmente empolgam. O diretor Zack Snyder (o mesmo de “300”, outra adaptação de HQ) sabe como criar imagens elegantes e cheias de estilo e isso aparece logo na primeira sequência, que mostra a morte de Edward Blake, o Comediante. Snyder soube ainda utilizar, de forma marcante, músicas de grande apelo pop, pescando o espectador logo de início. Também é verdade, é bom lembrar, que basta jogar alguma música de Bob Dylan na projeção para que qualquer filme ganhe de imediato um tom cabeça-bom-gosto. Aqui, isso acontece nos créditos iniciais, com “The Times They Are A-Changin’” e confesso que comecei a ficar empolgado nesta sequência (muito bem elaborada). Entretanto, os minutos foram passando e comecei a me questionar se o espectador médio, que não tivesse lido anteriormente a matriz, estaria entendendo o que estava se passando na tela. E é nesse ponto que o filme de Snyder começa a padecer de problemas.
A impressão que ficou é que esse objetivo não é atingido. A própria trama concebida por Moore já se mostra enigmática nos quadrinhos. Só no fim vemos tudo fazer sentido, todas as peças se encaixarem. E condensar isso no cinema não se mostrou uma das melhores experiências, mesmo que sejam cerca de 2h40min. de projeção. Vários momentos se mostram rápidos demais, dificultando o entendimento da trama. Além disso, a necessidade de se apresentar vários personagens com o tempo cronometrado acaba tirando a força deles, alguns mais do que outros. Creio que a que mais sofreu foi a personagem de Laurie (a Espectral), cuja relação com Jon (o Dr.Manhattan) foi mostrada de maneira superficial, assim como sua aproximação com Daniel Dreiberg (o Coruja) soa fútil e apressada. Aliás, apressado mostra-se todo o desenvolvimento do roteiro a partir da metade da projeção, quando os fatos vão se sucedendo sem pausas para reflexão. Até um dos melhores momentos da graphic novel, o diálogo excepcional entre Laurie e Jon em Marte, acaba rasteiro e cheio de buracos, sendo impossível que o espectador não iniciado compreenda a real dimensão do texto.
A empatia e vinculação com os personagens também sofre devido ao fator interpretação. Se Billy Crudup interpreta o Dr. Manhattan de forma eficiente, assim como Jackie Earle Haley no papel de Rorscharch e Jeffrey Dean Morgan como o Comediante (este realmente ótimo, na minha opinião o melhor do longa), alguns outros mostram-se bastante fracos, como Matthew Goode, que faz um Ozymandias por demais afetado, e Patrick Wilson, um tanto inexpressivo como o Coruja. Contudo, a Espectral acabou não sendo apenas a mais sacrificada pelo roteiro, mas também pela sua intérprete, Malin Akerman, quase uma boneca de tão inexpressiva (na mesma proporção em que é linda e saborosa).
Vale dizer também que o longa acaba por cair na necessidade de agradar o público do cinemão americano. Snyder (que de “visionário” não tem nada), relembra os seus tiques de “300”, apresentando cenas de ação em que a imagem acelera para logo em seguida aderir ao slow motion e pouco depois apertar na tecla “FF” novamente. Há ainda momentos de ação que se mostram bem mais plásticos e exagerados que nos quadrinhos. Nesse caso em especial, tal recurso mostra-se bastante equivocado, já que, como já ressaltado mais acima, uma das premissas de Watchmen é a de que aquelas pessoas são normais e não super-seres dotados de habilidades sobre-humanas.
Mas também é verdade que não só Snyder como os produtores ousaram em não eliminar do filme as cenas de extrema violência presentes na HQ, bem como algumas cenas de sexo (uma delas foi até bastante amplificada no filme, o que nos permite termos uma visão completa do corpo delicioso de Malin Akerman). Até mesmo o Dr.Manhattan é mostrado em nu frontal, como no original. Uma atitude corajosa dos envolvidos no projeto, mas que acabou por jogar uma tarja de classificação “PG-17” nos EUA (no Brasil, o filme também ganhou classificação etária máxima: 18 anos), o que também acabou contribuindo para que a bilheteria não rendesse tanto quanto desejado. Os efeitos especiais também são louváveis, principalmente aqueles aplicados na figura do Dr. Manhattan, dando-lhe uma veracidade bastante interessante.
Devo reconhecer, no fim das contas, que o esforço foi louvável. Mas a verdade é que “Watchmen” é uma obra que não comporta uma adaptação dentro de um formato tão comercial. Para que tudo fosse levado de forma realmente satisfatória, sua duração teria de ser pelo menos de umas 4h, além de abdicar ainda mais de elementos do cinema-pipoca. O final, um tanto alterado em relação à HQ, é mais um reflexo disso (muito embora não tenha ficado ruim). E a sensação que ficou ao sair da sessão foi a de ter assistido a um filme no melhor estilo eletrocardiograma: cheio de altos e baixos. E ainda saí com a pergunta na cabeça: “será que essas pessoas aí na sala entenderam o filme ou estão frustradas?”. Bem, se você nunca leu a HQ e pretende assistir (ou já tenha assistido) ao filme, favor postar nos comentários a sua impressão.
Cotação: *** (três estrelas)
Nota: 7,5
Eletrocardiograma
“Watchmen”, sem dúvida, é um triunfo da hoje denominada “nona arte”. Lançada em 1986 pela DC Comics, a obra concebida por Alan Moore e com traços de Dave Gibbons provocou, juntamente com “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, de Frank Miller, uma revolução no gênero de super-heróis. Sua repercussão e influência foram tão grandes que a revista Time colocou a obra de Moore-Gibbons entre os romances mais importantes desde o ano da criação da revista (em 1923). Vencedora de inúmeros prêmios, entre eles o mais importante do gênero quadrinhos, o Eisner Awards, tornou-se lugar-comum designá-la como “a graphic novel mais aclamada de todos os tempos”, bordão que inclusive foi utilizado na campanha promocional deste “Watchmen – O Filme”.
Há anos os estúdios de Hollywood pretendiam realizar a transposição da HQ para o cinema, empreitada que se mostrava bastante temerosa pela própria essência da trama concebida por Moore. Este pretendeu, com “Watchmen”, desmistificar a concepção de super-heróis, mostrando-os como seres humanos comuns, destituídos de poderes especiais (à exceção do Dr. Manhattan, claro), cheios de problemas, frustrações e até falhas de caráter como todos os seres humanos. Ademais, seus personagens mostravam-se extremamente bem construídos, densos, dotados não apenas de um presente, mas de toda uma história de vida, tornando-os tridimensionais. Não que neste aspecto isso fosse realmente original. A diferença está no fato de que não foram os momentos traumáticos da vida destes personagens que os levaram a viver como combatentes do crime, ou pelo menos não diretamente (como no exemplo clássico das HQs em Batman, o qual se torna um vigilante por conta do assassinato dos seus pais). É bom até mesmo dizer que um dos “heróis” de “Watchmen” está mais para um psicopata (Rorschach), enquanto outro é completamente destituído de moral (o Comediante). Como levar isso para um público totalmente acostumado com outra ideia de super-heróis, lotando salas para ver as proezas de personagens como Homem-Aranha e Super- Homem? Bom dizer que uma adaptação convincente exigiria não só um bom roteiro, mas também um investimento no melhor padrão “blockbuster”, capaz de tornar crível uma figura como a do Dr.Manhattan, por exemplo.
Depois do sucesso absoluto de “Batman – The Dark Knight”, a Warner tomou coragem e resolveu investir em mais essa adaptação de HQ soturna e, depois de uma enorme pendenga judicial com a Fox pelos direitos sobre a adaptação, tivemos o lançamento do filme no último dia 06 de março, alcançando o topo das bilheterias nos EUA, muito embora numa escala menor do que a esperada.
Devo dizer, até como um “iniciado” na obra original, que os primeiros minutos do longa-metragem realmente empolgam. O diretor Zack Snyder (o mesmo de “300”, outra adaptação de HQ) sabe como criar imagens elegantes e cheias de estilo e isso aparece logo na primeira sequência, que mostra a morte de Edward Blake, o Comediante. Snyder soube ainda utilizar, de forma marcante, músicas de grande apelo pop, pescando o espectador logo de início. Também é verdade, é bom lembrar, que basta jogar alguma música de Bob Dylan na projeção para que qualquer filme ganhe de imediato um tom cabeça-bom-gosto. Aqui, isso acontece nos créditos iniciais, com “The Times They Are A-Changin’” e confesso que comecei a ficar empolgado nesta sequência (muito bem elaborada). Entretanto, os minutos foram passando e comecei a me questionar se o espectador médio, que não tivesse lido anteriormente a matriz, estaria entendendo o que estava se passando na tela. E é nesse ponto que o filme de Snyder começa a padecer de problemas.
A impressão que ficou é que esse objetivo não é atingido. A própria trama concebida por Moore já se mostra enigmática nos quadrinhos. Só no fim vemos tudo fazer sentido, todas as peças se encaixarem. E condensar isso no cinema não se mostrou uma das melhores experiências, mesmo que sejam cerca de 2h40min. de projeção. Vários momentos se mostram rápidos demais, dificultando o entendimento da trama. Além disso, a necessidade de se apresentar vários personagens com o tempo cronometrado acaba tirando a força deles, alguns mais do que outros. Creio que a que mais sofreu foi a personagem de Laurie (a Espectral), cuja relação com Jon (o Dr.Manhattan) foi mostrada de maneira superficial, assim como sua aproximação com Daniel Dreiberg (o Coruja) soa fútil e apressada. Aliás, apressado mostra-se todo o desenvolvimento do roteiro a partir da metade da projeção, quando os fatos vão se sucedendo sem pausas para reflexão. Até um dos melhores momentos da graphic novel, o diálogo excepcional entre Laurie e Jon em Marte, acaba rasteiro e cheio de buracos, sendo impossível que o espectador não iniciado compreenda a real dimensão do texto.
A empatia e vinculação com os personagens também sofre devido ao fator interpretação. Se Billy Crudup interpreta o Dr. Manhattan de forma eficiente, assim como Jackie Earle Haley no papel de Rorscharch e Jeffrey Dean Morgan como o Comediante (este realmente ótimo, na minha opinião o melhor do longa), alguns outros mostram-se bastante fracos, como Matthew Goode, que faz um Ozymandias por demais afetado, e Patrick Wilson, um tanto inexpressivo como o Coruja. Contudo, a Espectral acabou não sendo apenas a mais sacrificada pelo roteiro, mas também pela sua intérprete, Malin Akerman, quase uma boneca de tão inexpressiva (na mesma proporção em que é linda e saborosa).
Vale dizer também que o longa acaba por cair na necessidade de agradar o público do cinemão americano. Snyder (que de “visionário” não tem nada), relembra os seus tiques de “300”, apresentando cenas de ação em que a imagem acelera para logo em seguida aderir ao slow motion e pouco depois apertar na tecla “FF” novamente. Há ainda momentos de ação que se mostram bem mais plásticos e exagerados que nos quadrinhos. Nesse caso em especial, tal recurso mostra-se bastante equivocado, já que, como já ressaltado mais acima, uma das premissas de Watchmen é a de que aquelas pessoas são normais e não super-seres dotados de habilidades sobre-humanas.
Mas também é verdade que não só Snyder como os produtores ousaram em não eliminar do filme as cenas de extrema violência presentes na HQ, bem como algumas cenas de sexo (uma delas foi até bastante amplificada no filme, o que nos permite termos uma visão completa do corpo delicioso de Malin Akerman). Até mesmo o Dr.Manhattan é mostrado em nu frontal, como no original. Uma atitude corajosa dos envolvidos no projeto, mas que acabou por jogar uma tarja de classificação “PG-17” nos EUA (no Brasil, o filme também ganhou classificação etária máxima: 18 anos), o que também acabou contribuindo para que a bilheteria não rendesse tanto quanto desejado. Os efeitos especiais também são louváveis, principalmente aqueles aplicados na figura do Dr. Manhattan, dando-lhe uma veracidade bastante interessante.
Devo reconhecer, no fim das contas, que o esforço foi louvável. Mas a verdade é que “Watchmen” é uma obra que não comporta uma adaptação dentro de um formato tão comercial. Para que tudo fosse levado de forma realmente satisfatória, sua duração teria de ser pelo menos de umas 4h, além de abdicar ainda mais de elementos do cinema-pipoca. O final, um tanto alterado em relação à HQ, é mais um reflexo disso (muito embora não tenha ficado ruim). E a sensação que ficou ao sair da sessão foi a de ter assistido a um filme no melhor estilo eletrocardiograma: cheio de altos e baixos. E ainda saí com a pergunta na cabeça: “será que essas pessoas aí na sala entenderam o filme ou estão frustradas?”. Bem, se você nunca leu a HQ e pretende assistir (ou já tenha assistido) ao filme, favor postar nos comentários a sua impressão.
Cotação: *** (três estrelas)
Nota: 7,5
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