Os Intocáveis
(The Untouchables)
Belo exemplar do poder de Hollywood
Esse é o tipo de filme “estelar”. Desde o elenco, passando pelo diretor, até o figurinista, todos são estrelas de “primeira grandeza”. O poderoso cinema americano faz esse tipo de coisa até com uma certa freqüência, mas muitas vezes os resultados são bastante medíocres. Não é o caso deste filme de 1987, que já se tornou, por que não dizer, um clássico. É um daqueles casos de “clássico instantâneo” e, como todo filme que enverga esse adjetivo, é difícil escrever alguma coisa sobre ele. São obras que marcam, não só o meio artístico como (e principalmente) o público.
Todavia, como eu disse, é um filme “estelar” e talvez a melhor forma de apresentá-lo seja tecer alguns comentários sobre cada um desses aspectos. Então, vamos a eles:
O roteiro: Escrito por David Mamet, baseado na série de TV homônima, narra a história de Eliot Ness (Kevin Costner), agente do Tesouro Federal americano e sua luta para colocar o mais famoso dos gangsters atrás das grades: Al Capone (Robert de Niro). Para isso, Eliot contará com a ajuda de três “colegas”: Malone (Sean Connery), um velho guarda de rua que Eliot conhece numa noite infeliz; Stone (Andy Garcia), um atirador de elite da polícia e Sam (Charles Martin Smith), um contador que sempre viu a melhor forma de prender Capone, sua sonegação ao Fisco, mas ninguém o leva muito a sério. Pronto! A trama é assim, simples e direta, sem aquelas conspirações, confusões e novelos intermináveis de nomes que geralmente povoam os filmes deste estilo. E essa simplicidade é uma das grandes forças da película, conseguindo envolver completamente o espectador em sua narrativa. E não se faça confusão com roteiro “simplório”, pois ele é extremamente bem amarrado e rico na caracterização dos personagens. Parabéns, Mamet!
O diretor: Brian De Palma faz parte da geração “setentista” a qual, nunca é demais lembrar, revolucionou os padrões de Hollywood na década da “disco music”. Desta geração, talvez De Palma seja o mais preocupado com o aspecto “fotográfico” dos seus filmes. Ele faz parte da vertente que alguns denominam “cinema total”. Nesta vertente, os diretores buscam transmitir o máximo de conteúdo, ações e emoções através da imagem, sempre apta a envolver o espectador com sua plástica, técnica, precisão nos detalhes e expressividade. Um bom exemplo desse tipo de cinema é o clássico “2001 – Uma Odisséia no Espaço”, do mestre Stanley Kubrick, onde enormes seqüências não possuem qualquer diálogo, sendo que as imagens e a marcante trilha sonora transmitem tudo que o cineasta pretende. Confesso que tenho uma grande simpatia por esse tipo de cinema, pois, pelo menos na minha opinião, trata-se da arte da imagem (sinto-me muitas vezes irritado quando alguns cineastas confundem cinema com teatro). Como reforço à fotografia, De Palma utiliza a edição como um mestre, sendo famosa sua técnica de apresentar duas imagens simultâneas com ações paralelas. Desta forma, o enredo acima descrito é mostrado como um espetáculo visual. Várias são as cenas memoráveis deste filme, como a seqüência em que um dos “intocáveis”... ih, essa eu não posso falar, pois nem todos viram. De qualquer forma, a seqüência mais marcante é aquela do carrinho de bebê (com o bebê) deslizando escadaria abaixo na estação de trem enquanto acontece um tiroteio. Trata-se de uma das mais geniais homenagens já feitas por um diretor a outro, no caso Serguei Eisenstein, o gênio de “O Encouraçado Potenkim”, um dos melhores filmes de todos os tempos. A cena é de aprisionar o olhar, afundar na cadeira e bater palmas depois (e de pé!). Resumindo tudo: De Palma estava mesmo em um momento inspirado!
Elenco: Vamos por partes! Primeiro, Kevin Costner. Interessante como ele era muito melhor quando não era pretensioso. Dá o tom certo ao paladino Eliot Ness, sem excessos. E o personagem, que no início parece muito certinho, maniqueísta até, vai aos poucos mostrando que, ao atingir seu limite, ele não é tão certinho como se supunha. Costner teria uma ascensão vertiginosa em Hollywood, atingindo o ápice em “Dança com Lobos”, para logo depois também experimentar uma decadência tão vertiginosa quanto. Já Sean Connery dá um verdadeiro show como Malone. Cínico e inteligente, ele mostra ao ainda ingênuo Eliot que, para vencer o crime, certas barreiras às vezes têm de ser transpostas, sem significar, contudo, que você passe a ser um corrupto desonesto. Emblemática a cena em que Malone mostra como arrancar confissões de um mafioso sem encostar em um fio de cabelo dele! A atuação rendeu o Oscar de ator coadjuvante ao velho James Bond. Andy Garcia não está brilhante, mas também não compromete com o seu Stone (que tem uma participação decisiva na citada seqüência da escadaria), em um de seus primeiros papéis de destaque no cinema. Charles Martin Smith como o contador está muito bem, mas o que aconteceu com ele depois desse filme (quem souber, favor informar. Parece que participou daquele filme “Querida, encolhi as crianças”, mas não lembro bem)? Fechando o elenco, não podemos esquecer, claro, de Robert De Niro como Al Capone, em mais uma das suas grandes composições. Talvez seja o melhor mafioso depois do Don Corleone de Marlom Brando. Acho até que De Niro iria demorar a se recuperar desta atuação, vez que vejo vários “tiques” de seu Al Capone na sua atuação em “Os Bons Companheiros”, de Scorcese. E é sempre bom vê-lo em boa fase, ao contrário da atual em que ninguém lembra de seus papéis. Coisa mais triste...
Trilha Sonora: Aqui eu sou até suspeito para comentar, porque o responsável pela trilha é Enio Morricone, justamente o meu compositor de trilhas favorito. O que dizer? Bem, mais uma vez seu trabalho é fantástico, não posso usar outro adjetivo. Desde o tema dos créditos inicias até o tema de conclusão, tudo é perfeito. Sem retoques. Mais uma trilha que se pode catalogar como obra-prima, na sua já extensa lista de obras-primas. Vou fazer um aparte aqui, pois talvez alguns não saibam: Morricone é o autor de trilhas memoráveis como a de “Três Homens em Conflito” (além de outros filmes de Sergio Leone). Está lembrando daquele famoso assovio dos filmes westerns? É dele mesmo! Também é o autor da trilha de “Cinema Paradiso”, uma das mais líricas e belas de todos os tempos. Morricone é sensacional!!!
Figurino: Trata-se até de uma curiosidade. Quando estava vendo o filme, já nos créditos iniciais me deparo com o nome de ninguém mais, ninguém menos que Giorgio Armani. Isso mesmo, o homem dos ternos mais bem cortados do mundo. Não que eu seja ligado em moda (sou ligado mesmo é em modelos como a Gisele e a Ana Hickman! Hehhehehehe!), mas não deixei de pensar: “caraca, as roupas são do Giorgio Armani!!!”. E isso me levou a ficar prestando atenção nos ternos que aparecem na tela, para ver o que de tão diferente existe nos modelos de Armani, mas confesso que não vi grande diferença não... Depois até pensei comigo: “ainda bem que eu não entendo tanto de moda assim!”. Hahhahahahahahhahahaha! De qualquer forma, fica o registro para quem tiver curiosidade.
E eis que chegamos à conclusão. E o mais importante, para sintetizar todos estes aspectos, é dizer que “Os Intocáveis” é um senhor filme, daqueles que passam dias na mente de quem assiste. Alguns chegam até a afirmar que é o melhor filme de Brian De Palma. Não sei se é o melhor (“Carrie, A Estranha” também é um filmão, assim como “Vestida para Matar”), mas com certeza é um dos seus grandes momentos. E, indubitavelmente, está entre as melhores realizações da década de 80. Aliás, na capa do DVD encontra-se a frase “O melhor filme de gangster desde ‘O poderoso Chefão’”. Concordo com a capa!
Cotação: ***** (cinco estrelas)
Nota: 10,0
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