Continuando as linhas sobres o reaproveitamento de ideias na atual crise de criatividade presente nas realizaçãoes cinematográficas (principalmente as made in Hollywood), vamos agora falar sobre outras espécies destas reciclagens. Se na primeira parte tecemos comentários sobre as duas fórmulas mais comumente usadas, quais sejam, o remake e a sequência, agora partiremos para uma apreciação de outras nem tão “badaladas”. São elas o prequel, o midquel, o interquel e o reboot. Nada muito catedrático, como podem perceber, mas acreditamos contribuir para o esclarecimento dos conceitos. Vamos a eles.
Prequel – Em terras brasileiras, não foi ainda utilizado um termo em português para traduzir esse neologismo surgido nos anos 1970. Em Portugal, utiliza-se a palavra “prequela”, o que constitui uma boa tradução, já que o termo em inglês se origina da junção de pre (antes, anterior) e sequel (sequência, sequela). Prequel é uma obra cuja trama ocorre em momento anterior à outra já lançada previamente, comumente esclarecendo a origem de personagens ou fatos que não foram totalmente desvendados durante a narrativa original. Embora o termo só tenha surgido nos anos 70, como mencionado, a origem deste tipo de obra é bem mais remota. O livro bíblico de “Rute”, que narra histórias de antepassados do rei Davi, por exemplo, é uma prequela de outros livros que tratam deste soberano hebreu. Em outra exemplificação, o genial músico Richard Wagner utilizou-se deste recurso na sua tetralogia “O Anel dos Nibelungos”, já que a ópera “Das Rheingold” é uma prequel da anterior “Siegfried”. Em termos cinematográficos, é essencial frisar que os fatos constantes da nova narrativa devem ser cronologicamente anteriores aos presentes no primeiro longa-metragem, pois que, se posteriores, não será uma prequela, mas uma sequência.
Apesar de não tão comuns quanto as sequências, podemos citar exemplos bem famosos e interessantes de prequels. Mais uma vez vamos recordar aqui o caso da saga “Star Wars”. Uma das precursoras nas sequências, ela também é referência entre as prequelas. Como é bastante conhecido, toda a série “Guerra nas Estrelas” foi concebida originariamente por George Lucas em seis episódios, mas ele resolveu filmar primeiramente o episódio IV, denominado “Uma Nova Esperança”. Décadas depois do término da trilogia que compreende este episódio e mais o V e o VI (o acima mencionado “O Império Contra-Ataca” e “O Retorno de Jedi”, respectivamente), Lucas retomou seu universo para levar às telas os três primeiros episódios que contam como Anakin Skywalker se tornou o temido Darth Vader. Ou seja, toda a segunda trilogia de “Star Wars” é uma extensa prequel do episódio IV, uma vez que suas narrativas tratam de fatos cronologicamente anteriores ao longa de 1977.
Ainda podemos elencar outras prequelas bastante conhecidas do grande público. “O Exorcista – O Início” (Exorcist: The Beginning, 2004) é prequel do clássico “O Exorcista” (The Exorcist) dirigido por William Friedkin em 1973 (e, por extensão, de toda a franquia, que inclui ainda os episódios II e III), mostrando a viagem que o Padre Merrin realiza para a África Oriental, deparando-se pela primeira vez com o demônio Pazuzu. Já “X-Men Origens: Wolverine” (X-Men Origins: Wolverine, 2009) antecede cronologicamente a trilogia dos X-Men iniciada em 2001 e revela o surgimento do popular herói Wolverine com a implantação do metal adamantium em seu esqueleto. Por sinal, ainda está em exibição nas salas de cinema, o segundo prequel da série do mutantes, o ótimo “X-Men Primeira Classe” (X-Men: First Class - 2011). Por outro lado, uma prequela já se tornou lendária entre os cinéfilos. Trata-se de “O Hobbit”, adaptação do livro de J.R.R. Tolkien que antecipa os acontecimentos de “O Senhor dos Anéis”. Há anos os fãs aguardam ansiosamente pelo filme, o qual, depois de anos de entraves jurídicos relativos aos direitos de adaptação da obra, finalmente entrou em fase de produção, tendo inclusive algumas imagens já liberadas na internet.
Interquel e Midquel – São duas formas de abordagem pouco utilizadas e, por isso mesmo, menos importantes, sendo mais comum na televisão e principalmente na expansão de uma obra para outras mídias. No interquel, temos uma narrativa que se passa entre duas outras já realizadas anteriormente, desenrolando fatos que o público não tinha tomado conhecimento. Um bom exemplo deste recurso é a animação “Star Wars: The Clone Wars” (2008), longa que serviu de introdução para a série de animação televisiva com o mesmo nome. Já no midquel o roteiro é desenvolvido a partir de uma elipse ocorrida no contexto de uma obra prévia. O conceito ficará mais claro recordando “Bambi II”, animação dos estúdios Disney elaborada para o mercado de home vídeo. Nele, a narrativa se desenvolve durante o período de tempo que se passa entre a morte da mãe de Bambi e sua idade adulta, o qual não é mostrado no famoso longa de animação que leva o nome do seu personagem central. Resta claro, portanto, que interquel e midquel são formas bastante mercadológicas de se explorar personagens com grande potencial e retorno financeiro. Não é à toa que fizemos mais uma menção à série “Guerra nas Estrelas”, já que Gorge Lucas se tornou o rei deste tipo de exploração mercantilista.
Reboot (ou reinício) – Talvez seja sinal dos tempos, mas é curioso que um termo da informática seja adotado para designar um conceito de obra midiática. Para conceituar reboot vamos nos valer da definição de Thomas R. Willits: “reboot significa reiniciar um universo de entretenimento que já foi estabelecido previamente, começando uma nova história e/ou cronologia que desconsidera a história ou acontecimentos do original, tornando-o obsoleto”. Neste ponto, é fundamental frisar que o reboot não é o mesmo que um remake. Como demonstrado em linhas anteriores, a refilmagem funciona como uma adequação ou nova visão de uma obra para uma determinada plateia, seja por necessidades comerciais ou artísticas, sendo que a obra, em linhas gerais, continua a mesma, com igual trama e personagens. No reinício novos paradigmas são estabelecidos para um universo ficcional que normalmente já teve sequências, sendo que tudo que foi feito ulteriormente é ignorado na noviça produção. Assim, um outro cânone é instituído, inovando e consagrando novos parâmetros a serem seguidos.
O exemplo mais imediato que podemos utilizar para exemplificar a ideia de reboot é o longa-metragem “Batman Begins” (2005), responsável por devolver ao famoso personagem dos quadrinhos o respeito perdido com os desastrosos filmes dirigidos por Joel Schumacher (principalmente “Batman & Robin”, de 1997, assombrosamente ruim). A solução encontrada pela Warner Bros., estúdio detentor dos direitos de adaptação, foi a de “zerar” a série cinematográfica, ignorando inclusive os filmes dirigidos por Tim Burton, que também nunca foram unanimidade de crítica e público. A intenção era a de contar uma nova origem para o herói e o diretor escalado, Christopher Nolan, obteve grande sucesso na empreitada, a qual inclusive gerou uma sequência, “Batman – O Cavaleiro das Trevas” (The Dark Knight, 2008), que acabou se tornando um marco nas adaptações de HQ para a tela grande, rendendo, inclusive, um Oscar de ator coadjuvante ao saudoso Heath Ledger. Outro reinício que se mostrou bastante feliz foi o da longa série “007”, que, a partir de “Cassino Royale” (2006), de Martin Campbell, assumiu novos e surpreendentes ares, com o ator Daniel Craig encarnando o agente James Bond com uma força e competência que não se via desde os anos 60 com Sean Connery. Recentemente, tivemos ainda o reboot da saga “Star Trek” (2009), apresentando-a para uma nova geração de possíveis fãs. Vale assinalar, porém, que nem sempre os reboots são necessários. A nova adaptação do Homem-Aranha, dirigida por Marc Webb e contando com Andrew Garfield no papel de Peter Parker (tem estreia prevista para 2012), é um típico caso de desnecessidade, tendo em vista a qualidade da trilogia dirigida por Sam Raimi e protagonizada por Tobey Maguire, ainda viva na memória do público e dona de uma legião de fãs. E que fique claro mais uma vez: reinício não é refilmagem, mas uma nova maneira de abordar um universo ficcional, não estando em absoluto atrelado a uma obra lançada anteriormente.
Embora não se possa negar que essas diversas formas de abordar um universo ficcional tenham sido engendradas, em sua maioria, por motivações eminentemente comerciais, como já frisado em diversas passagens nas linhas precedentes, também não se pode olvidar, por outro lado, que em várias outras ocasiões são obtidos resultados artisticamente relevantes. Mesmo os remakes, que talvez representem melhor esta vertente de mercado, uma vez que é a menos criativa das opções de retomada de um universo ficcional, podem adquirir um valor cinematográfico relevante quando bem realizados. Concluindo, o Cinema Com Pimenta espera ter jogado um pouco de luz, mesmo que de forma tênue, sobre a zona nublada que encobre as variadas espécies de reciclagem criativa que permeiam o cinema contemporâneo. Na verdade, espera mais ainda que as mentes que fazem o cinema, sejam cineastas ou executivos, consigam deixar para trás esse marasmo criativo e consigam fazer de tais reciclagens uma exceção e não a regra, já que está última vem reinando nos últimos anos.
Prequel – Em terras brasileiras, não foi ainda utilizado um termo em português para traduzir esse neologismo surgido nos anos 1970. Em Portugal, utiliza-se a palavra “prequela”, o que constitui uma boa tradução, já que o termo em inglês se origina da junção de pre (antes, anterior) e sequel (sequência, sequela). Prequel é uma obra cuja trama ocorre em momento anterior à outra já lançada previamente, comumente esclarecendo a origem de personagens ou fatos que não foram totalmente desvendados durante a narrativa original. Embora o termo só tenha surgido nos anos 70, como mencionado, a origem deste tipo de obra é bem mais remota. O livro bíblico de “Rute”, que narra histórias de antepassados do rei Davi, por exemplo, é uma prequela de outros livros que tratam deste soberano hebreu. Em outra exemplificação, o genial músico Richard Wagner utilizou-se deste recurso na sua tetralogia “O Anel dos Nibelungos”, já que a ópera “Das Rheingold” é uma prequel da anterior “Siegfried”. Em termos cinematográficos, é essencial frisar que os fatos constantes da nova narrativa devem ser cronologicamente anteriores aos presentes no primeiro longa-metragem, pois que, se posteriores, não será uma prequela, mas uma sequência.
Apesar de não tão comuns quanto as sequências, podemos citar exemplos bem famosos e interessantes de prequels. Mais uma vez vamos recordar aqui o caso da saga “Star Wars”. Uma das precursoras nas sequências, ela também é referência entre as prequelas. Como é bastante conhecido, toda a série “Guerra nas Estrelas” foi concebida originariamente por George Lucas em seis episódios, mas ele resolveu filmar primeiramente o episódio IV, denominado “Uma Nova Esperança”. Décadas depois do término da trilogia que compreende este episódio e mais o V e o VI (o acima mencionado “O Império Contra-Ataca” e “O Retorno de Jedi”, respectivamente), Lucas retomou seu universo para levar às telas os três primeiros episódios que contam como Anakin Skywalker se tornou o temido Darth Vader. Ou seja, toda a segunda trilogia de “Star Wars” é uma extensa prequel do episódio IV, uma vez que suas narrativas tratam de fatos cronologicamente anteriores ao longa de 1977.
Ainda podemos elencar outras prequelas bastante conhecidas do grande público. “O Exorcista – O Início” (Exorcist: The Beginning, 2004) é prequel do clássico “O Exorcista” (The Exorcist) dirigido por William Friedkin em 1973 (e, por extensão, de toda a franquia, que inclui ainda os episódios II e III), mostrando a viagem que o Padre Merrin realiza para a África Oriental, deparando-se pela primeira vez com o demônio Pazuzu. Já “X-Men Origens: Wolverine” (X-Men Origins: Wolverine, 2009) antecede cronologicamente a trilogia dos X-Men iniciada em 2001 e revela o surgimento do popular herói Wolverine com a implantação do metal adamantium em seu esqueleto. Por sinal, ainda está em exibição nas salas de cinema, o segundo prequel da série do mutantes, o ótimo “X-Men Primeira Classe” (X-Men: First Class - 2011). Por outro lado, uma prequela já se tornou lendária entre os cinéfilos. Trata-se de “O Hobbit”, adaptação do livro de J.R.R. Tolkien que antecipa os acontecimentos de “O Senhor dos Anéis”. Há anos os fãs aguardam ansiosamente pelo filme, o qual, depois de anos de entraves jurídicos relativos aos direitos de adaptação da obra, finalmente entrou em fase de produção, tendo inclusive algumas imagens já liberadas na internet.
Interquel e Midquel – São duas formas de abordagem pouco utilizadas e, por isso mesmo, menos importantes, sendo mais comum na televisão e principalmente na expansão de uma obra para outras mídias. No interquel, temos uma narrativa que se passa entre duas outras já realizadas anteriormente, desenrolando fatos que o público não tinha tomado conhecimento. Um bom exemplo deste recurso é a animação “Star Wars: The Clone Wars” (2008), longa que serviu de introdução para a série de animação televisiva com o mesmo nome. Já no midquel o roteiro é desenvolvido a partir de uma elipse ocorrida no contexto de uma obra prévia. O conceito ficará mais claro recordando “Bambi II”, animação dos estúdios Disney elaborada para o mercado de home vídeo. Nele, a narrativa se desenvolve durante o período de tempo que se passa entre a morte da mãe de Bambi e sua idade adulta, o qual não é mostrado no famoso longa de animação que leva o nome do seu personagem central. Resta claro, portanto, que interquel e midquel são formas bastante mercadológicas de se explorar personagens com grande potencial e retorno financeiro. Não é à toa que fizemos mais uma menção à série “Guerra nas Estrelas”, já que Gorge Lucas se tornou o rei deste tipo de exploração mercantilista.
Reboot (ou reinício) – Talvez seja sinal dos tempos, mas é curioso que um termo da informática seja adotado para designar um conceito de obra midiática. Para conceituar reboot vamos nos valer da definição de Thomas R. Willits: “reboot significa reiniciar um universo de entretenimento que já foi estabelecido previamente, começando uma nova história e/ou cronologia que desconsidera a história ou acontecimentos do original, tornando-o obsoleto”. Neste ponto, é fundamental frisar que o reboot não é o mesmo que um remake. Como demonstrado em linhas anteriores, a refilmagem funciona como uma adequação ou nova visão de uma obra para uma determinada plateia, seja por necessidades comerciais ou artísticas, sendo que a obra, em linhas gerais, continua a mesma, com igual trama e personagens. No reinício novos paradigmas são estabelecidos para um universo ficcional que normalmente já teve sequências, sendo que tudo que foi feito ulteriormente é ignorado na noviça produção. Assim, um outro cânone é instituído, inovando e consagrando novos parâmetros a serem seguidos.
O exemplo mais imediato que podemos utilizar para exemplificar a ideia de reboot é o longa-metragem “Batman Begins” (2005), responsável por devolver ao famoso personagem dos quadrinhos o respeito perdido com os desastrosos filmes dirigidos por Joel Schumacher (principalmente “Batman & Robin”, de 1997, assombrosamente ruim). A solução encontrada pela Warner Bros., estúdio detentor dos direitos de adaptação, foi a de “zerar” a série cinematográfica, ignorando inclusive os filmes dirigidos por Tim Burton, que também nunca foram unanimidade de crítica e público. A intenção era a de contar uma nova origem para o herói e o diretor escalado, Christopher Nolan, obteve grande sucesso na empreitada, a qual inclusive gerou uma sequência, “Batman – O Cavaleiro das Trevas” (The Dark Knight, 2008), que acabou se tornando um marco nas adaptações de HQ para a tela grande, rendendo, inclusive, um Oscar de ator coadjuvante ao saudoso Heath Ledger. Outro reinício que se mostrou bastante feliz foi o da longa série “007”, que, a partir de “Cassino Royale” (2006), de Martin Campbell, assumiu novos e surpreendentes ares, com o ator Daniel Craig encarnando o agente James Bond com uma força e competência que não se via desde os anos 60 com Sean Connery. Recentemente, tivemos ainda o reboot da saga “Star Trek” (2009), apresentando-a para uma nova geração de possíveis fãs. Vale assinalar, porém, que nem sempre os reboots são necessários. A nova adaptação do Homem-Aranha, dirigida por Marc Webb e contando com Andrew Garfield no papel de Peter Parker (tem estreia prevista para 2012), é um típico caso de desnecessidade, tendo em vista a qualidade da trilogia dirigida por Sam Raimi e protagonizada por Tobey Maguire, ainda viva na memória do público e dona de uma legião de fãs. E que fique claro mais uma vez: reinício não é refilmagem, mas uma nova maneira de abordar um universo ficcional, não estando em absoluto atrelado a uma obra lançada anteriormente.
Embora não se possa negar que essas diversas formas de abordar um universo ficcional tenham sido engendradas, em sua maioria, por motivações eminentemente comerciais, como já frisado em diversas passagens nas linhas precedentes, também não se pode olvidar, por outro lado, que em várias outras ocasiões são obtidos resultados artisticamente relevantes. Mesmo os remakes, que talvez representem melhor esta vertente de mercado, uma vez que é a menos criativa das opções de retomada de um universo ficcional, podem adquirir um valor cinematográfico relevante quando bem realizados. Concluindo, o Cinema Com Pimenta espera ter jogado um pouco de luz, mesmo que de forma tênue, sobre a zona nublada que encobre as variadas espécies de reciclagem criativa que permeiam o cinema contemporâneo. Na verdade, espera mais ainda que as mentes que fazem o cinema, sejam cineastas ou executivos, consigam deixar para trás esse marasmo criativo e consigam fazer de tais reciclagens uma exceção e não a regra, já que está última vem reinando nos últimos anos.
2 comentários:
Belo comentário sobre um assunto importante no cinema atual.
Star Wars, versão nova, é a prova do quanto uma obra original pode ser "machucada" com essas idéias insanas, a meu ver. Matrix é outro que seguiu em minha visão a mesma loucura.
Batman escapou, graças a deus e mereceu meus aplauso.
Mas, respeito e adoro quem é original no cinema. Mesmo que não acerte. É melhor o erro por ação do que por inanição (ou cópia).
Renato, as continuações de Matrix são tão ruins que conseguiram estragar o primeiro filme. E acho incrível como George Lucas não consegue ter respeito pela própria obra. Um dinheirista, sem dúvida!
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