De primeira classe!
Em 2000, Bryan Singer levou os filmes baseados em histórias em quadrinhos a um novo status. A despeito das dúvidas e incredulidade de muitos, que achavam difícil transpor para as telas o universo dos “X-Men” com a qualidade técnica necessária, mas, principalmente, a carga dramática característica dos mutantes, Singer foi extremamente bem sucedido em sua adaptação. E quando falo em “carga dramática” não é à toa. Entre os tradicionais heróis tanto do universo Marvel quanto da DC (as maiores editoras de quadrinhos dos EUA), certamente os mutantes são aqueles com maior densidade psicológica, dada a questão central que permeia as suas tramas: o preconceito (acredito que apenas Batman, na DC, se equipare neste aspecto, mas com outras motivações e temáticas). Singer, todavia, encarou muito bem o desafio e nos trouxe um ótimo filme, cheio de ação, mas sem nunca perder o foco dos dramas pessoais vividos por seus personagens. O sucesso em qualidade se refletiu também em sucesso de público, catapultando Hugh Jackman, com sua caracterização perfeita de Wolverine, ao estrelato e gerando mais duas continuações diretas, além de uma prequel exclusiva do citado Wolverine. Com o segundo episódio, vale salientar, Singer conseguiu superar o primeiro, tanto em termos técnicos quanto no aprofundamento dos conflitos, fazendo de “X-Men 2” um dos melhores filmes de super-heróis até hoje realizados. Após se afastar da franquia para assumir a direção de “Superman – O Retorno” (um dos seus antigos sonhos era dirigir um filme do homem de aço), Singer retorna agora ao universo mutante, mas como produtor, deixando a direção para um dos nomes promissores da Hollywood atual, Matthew Vaughn (que dirigiu anteriormente “Kick Ass – Quebrando Tudo”). A missão de ambos era dar um novo fôlego à série, cujo terceiro episódio (“O Confronto Final”), dirigido por Brett Ratner, não teria apresentado resultado tão satisfatório quanto os seus dois predecessores (está um pouco abaixo, realmente, mas, na minha opinião, ainda é muito bom).
O conceito de “X-Men – Primeira Classe”, o qual consiste em revelar as origens dos conflitos desenvolvidos na série e de alguns dos personagens já conhecidos do público, mormente o Professor Charles Xavier e seu amigo-inimigo Magneto, teve início com um projeto para um filme solo do famoso mutante mestre do magnetismo. Felizmente, perceberam que um filme de Magneto sem a presença de Charles Xavier seria um tiro na água e a ideia evoluiu para um contexto mais amplo, qual seja, mostrar como nasceu a tal amizade-inimizade entre os dois, além da escola para jovens superdotados gerida pelo professor.
É com esse intuito que somos levados aos anos 60, não sem antes acontecer uma passagem pelos campos de concentração da Segunda Guerra Mundial. É neles que o garoto Erick Lehnsherr (interpretado já adulto pelo excelente ator alemão Michael Fassbender) vê sua mãe ser assassinada por um nazista, o cientista Sebastian Shaw (Kevin Bacon), o qual já havia percebido os poderes magnéticos do menino. A vingança torna-se, desta forma, a obsessão de sua vida e é em busca dela que Erick acaba esbarrando em Charles Xavier (o sempre ótimo James McAvoy), ainda um jovem professor estudioso das mutações genéticas. A amizade entre os dois levará à busca de jovens mutantes (à serviço da CIA, convencidos pela agente Moira MacTargget) e criação da tal escola para superdotados, ensinando-os a canalizar seus poderes e oferecendo uma convivência com outras pessoas também detentoras de habilidades especiais. A trama mutante tem como pano de fundo os fatos reais acontecidos na década de 60, principalmente a crise dos mísseis em Cuba, a qual acaba servindo também como força motora de vários aspectos da narrativa (com direito até a inserções de imagens de John Kennedy na projeção). O resultado, e isso afirmo como apreciador não só da franquia cinematográfica como também das HQs, é vibrante e, por vezes, emocionante.
O roteiro, escrito por Ashley Miller, Zack Stentz, Jane Goldman e o próprio cineasta Matthew Vaughn , é realmente ótimo e muito feliz em realizar uma verdadeira fusão entre elementos ficcionais e verídicos. Além disso, sabe equilibrar quase à perfeição os momentos de ação e reflexão. Aliás, neste último aspecto, este é o filme ao mesmo tempo mais reflexivo e introspectivo de toda a série, onde se percebe uma verdadeira aula de como se fazer uma aventura cheia de neurônios. Se a metáfora do preconceito está presente em todos os episódios, aqui, ressalte-se, ela é trabalhada de maneira ainda mais sólida e consistente, principalmente através dos ricos diálogos entre Xavier e Magneto (que estão entre os melhores momentos do longa, vale dizer). A força deste manifesto anti-preconceito é ainda corporificada nos personagens de Mística (Jennifer Lawrence, de “Inverno da Alma”, bonita e talentosa) e Hank McCoy, o Fera (Nicholas Hoult, muito competente), cujas mutações também lhes confere uma aparência física “diferente”, o que redunda em um sentimento de exclusão ainda mais forte do que os dos outros mutantes.
Claro que toda a carga dramática do filme cairia no descrédito não fossem as ótimas atuações do elenco. Difícil afirmar quem está melhor em tela. Tanto McAvoy quanto Fassbender dão um show de competência como Charles Xavier e Erick Lehnsherr, respectivamente. Fassbender deverá, inclusive, deixar de ser um ator pouco conhecido para construir uma carreira sólida em Hollywood, não tenho dúvidas. Mesmo Kevin Bacon, um ator cheio de altos e baixos, está ótimo como o pedante Sebastian Shaw, um dos vilões mais marcantes das antigas estórias dos X-Men, quando estes viviam seus embates contra o Clube do Inferno. Por outro lado, fica a desejar a caracterização de Emma Frost, a Rainha Branca do clube e esposa de Shaw, aqui interpretada por January Jones. Lembrada nos quadrinhos não apenas por sua beleza e sensualidade, mas também por sua inteligência e personalidade manipuladora, ela aparece na projeção sem destaque para essas duas últimas características, quase se transformando em uma loira de butique, o que é uma pena.
Além da pobreza desta transposição de Emma Frost, o roteiro ainda peca por se utilizar da velha muleta de apresentar os mutantes e seus poderes de forma muito didática (um verdadeiro lugar-comum em filmes de super-heróis). O didatismo aqui se torna ainda mais acentuado até mesmo devido às técnicas de controle desenvolvidas na escola de Charles Xavier. Ademais, os efeitos especiais deixam a desejar em algumas passagens e a caracterização do Fera me pareceu um pouco artificial (creio que o uso de CGI teria sido mais feliz do que a maquiagem, neste caso).
Todavia, estes são problemas pontuais que não comprometem o conjunto. O diretor Vaughn jamais deixa a peteca cair, com um ótimo ritmo. Apesar de um pouco longo, o filme nunca se torna cansativo. Muito pelo contrário. Ele vai crescendo em envolvimento e emoção, resultando em um final sensacional e marcante, que só deixa o espectador ainda mais ansioso para ver mais um capítulo da saga. Um desfecho que, se não nos faz tomar o lado de Magneto em sua batalha, também nos leva a compreender suas motivações, fazendo com que evitemos pronunciar julgamentos acerca de suas atitudes. Uma aula de como realizar um produto voltado para as massas sem maniqueísmos. Esperemos que, tal como os alunos do Professor X aprenderam com este a dominar seus poderes, os produtores e diretores aprendam com Singer e Vaughn a usar seus altos orçamentos para gerar obras que podem ser um ótimo entretenimento com respeito à inteligência e sensibilidade do espectador. E, neste aspecto, a nova aventura dos X-Men é mesmo de primeira classe!
Obs. Há duas participações especiais no filme: Hugh Jackman (hilário!) e Rebecca Ronmjn-Stamos. Fique atento (a)!
Cotação:
Nota: 9,5
Em 2000, Bryan Singer levou os filmes baseados em histórias em quadrinhos a um novo status. A despeito das dúvidas e incredulidade de muitos, que achavam difícil transpor para as telas o universo dos “X-Men” com a qualidade técnica necessária, mas, principalmente, a carga dramática característica dos mutantes, Singer foi extremamente bem sucedido em sua adaptação. E quando falo em “carga dramática” não é à toa. Entre os tradicionais heróis tanto do universo Marvel quanto da DC (as maiores editoras de quadrinhos dos EUA), certamente os mutantes são aqueles com maior densidade psicológica, dada a questão central que permeia as suas tramas: o preconceito (acredito que apenas Batman, na DC, se equipare neste aspecto, mas com outras motivações e temáticas). Singer, todavia, encarou muito bem o desafio e nos trouxe um ótimo filme, cheio de ação, mas sem nunca perder o foco dos dramas pessoais vividos por seus personagens. O sucesso em qualidade se refletiu também em sucesso de público, catapultando Hugh Jackman, com sua caracterização perfeita de Wolverine, ao estrelato e gerando mais duas continuações diretas, além de uma prequel exclusiva do citado Wolverine. Com o segundo episódio, vale salientar, Singer conseguiu superar o primeiro, tanto em termos técnicos quanto no aprofundamento dos conflitos, fazendo de “X-Men 2” um dos melhores filmes de super-heróis até hoje realizados. Após se afastar da franquia para assumir a direção de “Superman – O Retorno” (um dos seus antigos sonhos era dirigir um filme do homem de aço), Singer retorna agora ao universo mutante, mas como produtor, deixando a direção para um dos nomes promissores da Hollywood atual, Matthew Vaughn (que dirigiu anteriormente “Kick Ass – Quebrando Tudo”). A missão de ambos era dar um novo fôlego à série, cujo terceiro episódio (“O Confronto Final”), dirigido por Brett Ratner, não teria apresentado resultado tão satisfatório quanto os seus dois predecessores (está um pouco abaixo, realmente, mas, na minha opinião, ainda é muito bom).
O conceito de “X-Men – Primeira Classe”, o qual consiste em revelar as origens dos conflitos desenvolvidos na série e de alguns dos personagens já conhecidos do público, mormente o Professor Charles Xavier e seu amigo-inimigo Magneto, teve início com um projeto para um filme solo do famoso mutante mestre do magnetismo. Felizmente, perceberam que um filme de Magneto sem a presença de Charles Xavier seria um tiro na água e a ideia evoluiu para um contexto mais amplo, qual seja, mostrar como nasceu a tal amizade-inimizade entre os dois, além da escola para jovens superdotados gerida pelo professor.
É com esse intuito que somos levados aos anos 60, não sem antes acontecer uma passagem pelos campos de concentração da Segunda Guerra Mundial. É neles que o garoto Erick Lehnsherr (interpretado já adulto pelo excelente ator alemão Michael Fassbender) vê sua mãe ser assassinada por um nazista, o cientista Sebastian Shaw (Kevin Bacon), o qual já havia percebido os poderes magnéticos do menino. A vingança torna-se, desta forma, a obsessão de sua vida e é em busca dela que Erick acaba esbarrando em Charles Xavier (o sempre ótimo James McAvoy), ainda um jovem professor estudioso das mutações genéticas. A amizade entre os dois levará à busca de jovens mutantes (à serviço da CIA, convencidos pela agente Moira MacTargget) e criação da tal escola para superdotados, ensinando-os a canalizar seus poderes e oferecendo uma convivência com outras pessoas também detentoras de habilidades especiais. A trama mutante tem como pano de fundo os fatos reais acontecidos na década de 60, principalmente a crise dos mísseis em Cuba, a qual acaba servindo também como força motora de vários aspectos da narrativa (com direito até a inserções de imagens de John Kennedy na projeção). O resultado, e isso afirmo como apreciador não só da franquia cinematográfica como também das HQs, é vibrante e, por vezes, emocionante.
O roteiro, escrito por Ashley Miller, Zack Stentz, Jane Goldman e o próprio cineasta Matthew Vaughn , é realmente ótimo e muito feliz em realizar uma verdadeira fusão entre elementos ficcionais e verídicos. Além disso, sabe equilibrar quase à perfeição os momentos de ação e reflexão. Aliás, neste último aspecto, este é o filme ao mesmo tempo mais reflexivo e introspectivo de toda a série, onde se percebe uma verdadeira aula de como se fazer uma aventura cheia de neurônios. Se a metáfora do preconceito está presente em todos os episódios, aqui, ressalte-se, ela é trabalhada de maneira ainda mais sólida e consistente, principalmente através dos ricos diálogos entre Xavier e Magneto (que estão entre os melhores momentos do longa, vale dizer). A força deste manifesto anti-preconceito é ainda corporificada nos personagens de Mística (Jennifer Lawrence, de “Inverno da Alma”, bonita e talentosa) e Hank McCoy, o Fera (Nicholas Hoult, muito competente), cujas mutações também lhes confere uma aparência física “diferente”, o que redunda em um sentimento de exclusão ainda mais forte do que os dos outros mutantes.
Claro que toda a carga dramática do filme cairia no descrédito não fossem as ótimas atuações do elenco. Difícil afirmar quem está melhor em tela. Tanto McAvoy quanto Fassbender dão um show de competência como Charles Xavier e Erick Lehnsherr, respectivamente. Fassbender deverá, inclusive, deixar de ser um ator pouco conhecido para construir uma carreira sólida em Hollywood, não tenho dúvidas. Mesmo Kevin Bacon, um ator cheio de altos e baixos, está ótimo como o pedante Sebastian Shaw, um dos vilões mais marcantes das antigas estórias dos X-Men, quando estes viviam seus embates contra o Clube do Inferno. Por outro lado, fica a desejar a caracterização de Emma Frost, a Rainha Branca do clube e esposa de Shaw, aqui interpretada por January Jones. Lembrada nos quadrinhos não apenas por sua beleza e sensualidade, mas também por sua inteligência e personalidade manipuladora, ela aparece na projeção sem destaque para essas duas últimas características, quase se transformando em uma loira de butique, o que é uma pena.
Além da pobreza desta transposição de Emma Frost, o roteiro ainda peca por se utilizar da velha muleta de apresentar os mutantes e seus poderes de forma muito didática (um verdadeiro lugar-comum em filmes de super-heróis). O didatismo aqui se torna ainda mais acentuado até mesmo devido às técnicas de controle desenvolvidas na escola de Charles Xavier. Ademais, os efeitos especiais deixam a desejar em algumas passagens e a caracterização do Fera me pareceu um pouco artificial (creio que o uso de CGI teria sido mais feliz do que a maquiagem, neste caso).
Todavia, estes são problemas pontuais que não comprometem o conjunto. O diretor Vaughn jamais deixa a peteca cair, com um ótimo ritmo. Apesar de um pouco longo, o filme nunca se torna cansativo. Muito pelo contrário. Ele vai crescendo em envolvimento e emoção, resultando em um final sensacional e marcante, que só deixa o espectador ainda mais ansioso para ver mais um capítulo da saga. Um desfecho que, se não nos faz tomar o lado de Magneto em sua batalha, também nos leva a compreender suas motivações, fazendo com que evitemos pronunciar julgamentos acerca de suas atitudes. Uma aula de como realizar um produto voltado para as massas sem maniqueísmos. Esperemos que, tal como os alunos do Professor X aprenderam com este a dominar seus poderes, os produtores e diretores aprendam com Singer e Vaughn a usar seus altos orçamentos para gerar obras que podem ser um ótimo entretenimento com respeito à inteligência e sensibilidade do espectador. E, neste aspecto, a nova aventura dos X-Men é mesmo de primeira classe!
Obs. Há duas participações especiais no filme: Hugh Jackman (hilário!) e Rebecca Ronmjn-Stamos. Fique atento (a)!
Cotação:
Nota: 9,5
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