segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Filmes Para Ver Antes de Morrer


A Felicidade Não Se Compra
(It's A Wonderful Life)


"Quem tem amigos nunca é um fracasso"


Há algum tempo, às vésperas do Natal, eu aguardava receber um telefonema que, naquela época, seria de grande importância. Eu estava muito interessado em uma garota e, por uma série de razões que levariam muitas linhas para explicar, receber uma ligação dela naquele momento poderia significar uma aproximação ainda maior entre nós dois. Então, precisamente no dia 23 de dezembro, o meu celular toca no momento em que eu estava assistindo a um filme que há muito vinha querendo assistir. Quem me conhece sabe que detesto ser interrompido quando estou vendo algum longa (daí minha eterna preferência por ver filmes na sala escura do cinema) e levantei para atender o telefone bastante irritado. Qual não é a minha surpresa quando vejo o nome dela na tela do aparelho e, de repente, senti-me invadido por uma onda de alegria.

O filme a que eu estava assistindo era justamente “A Felicidade Não Se Compra”, clássico absoluto do cinema norte-americano dirigido por Frank Capra, um dos mais importantes diretores de Hollywood. E talvez este seja seu longa definitivo, aquele que representa melhor o seu cinema otimista imbuído dos melhores valores que caracterizaram o sonho americano.

Hoje um tanto quanto esquecido, Capra foi um dos diretores mais populares durante o período da grande depressão e da segunda grande guerra. As pessoas costumavam aguardar ansiosamente as suas estréias, sendo seus filmes grandes sucessos de público e crítica, tais como “A Mulher Faz O Homem” e “Do Mundo Nada Se Leva”. Todavia, “A Felicidade Não Se Compra”, seu primeiro filme do pós-guerra, acabou não obtendo o sucesso esperado, principalmente junto à crítica, que o considerou exageradamente otimista num tempo em que se buscavam obras com caráter mais realista e menos “manipulador”. Ao longo dos anos, entretanto, e felizmente, o reconhecimento deste belo filme foi crescendo cada vez mais. Devido a uma série de meandros jurídicos que aqui se tornam inteiramente dispensáveis, o longa caiu em domínio público de forma prematura, o que acabou levando várias emissoras a exibirem-no durante as festas de fim de ano. Fato que, por sinal, transformou-se em algo quase religioso nos EUA. Em todo Natal ele é exibido, o que o coloca como um dos filmes mais populares em todos os tempos na terra do Tio Sam. E, é bom dizer, com todos os méritos.

A narrativa trata da vida de George Bailey, personagem interpretado por um dos atores mais carismáticos do cinema, James Stewart. George é um bom homem, querido por todos em Bedford Falls, pequena cidade onde vive desde a infância. Apesar do amor que sente pela comunidade, George tem um espírito aventureiro e sonha em viajar pelo mundo. Todavia, as obrigações e seu senso de responsabilidade parecem sempre impedir a concretização de seus desejos aventureiros. Após a morte do pai e seu casamento com Mary (Donna Reed), George passa a administrar a cooperativa habitacional de Bedford Falls, tornando-se alvo do inescrupuloso Sr. Potter (Lionel Barrymore, perfeito no papel do vilão), poderoso empresário local que pretende se tornar uma espécie de dono da cidade e, obviamente, os Bailey se tornam um obstáculo neste sentido. Fazendo de tudo para atingir seus objetivos sórdidos, Potter leva George a uma situação quase inescapável, um beco sem saída. George então vai até a ponte da cidade tentar o suicídio, em uma noite de Natal, quando Clarence (Henry Travers), um anjo de segunda classe que ainda precisa ganhar suas asas, salva Bailey, muito embora não consiga demover a sua idéia de que era melhor que nunca tivesse existido. Para convencê-lo de que está errado, o anjo faz com que George veja como seriam as vidas das pessoas que o cercam caso ele, de fato, nunca tivesse existido.

Esta alegoria do “O que aconteceria se...” mostra-se extremamente eficaz e emocionante. Copiada muitas vezes ao longo dos anos, ela revela o quanto as ações de um ser humano, por mais banal que a vida deste possa parecer, podem afetar a vivência de outras pessoas. Ademais, Capra parece extremamente preocupado com a importância dos pequenos sonhos. Afinal, Bailey tem lá seus devaneios aventureiros, mas é naquela comunidade e no seio de sua família que ele de fato se realiza, se torna um homem feliz.

É interessante também perceber o viés crítico que Capra demonstra com relação a certos elementos do capitalismo que viriam a se tornar dominantes nas décadas seguintes, mormente na sociedade americana. O personagem de Potter representa claramente aquilo que a América viria a ser: o símbolo do dinheiro como um fim em si mesmo, ideário que se mostrou um fracasso diante da atual crise mundial do sistema. Contrapondo-se a isso, temos o personagem de Bailey, o qual representa o que poderíamos chamar de “capitalismo ideal”, em que o individual não suplanta o coletivo. Neste aspecto, é mais interessante ainda notar que o filme realmente não envelheceu, permanecendo bastante relevante (curioso como o sonho da casa própria continua sendo tão difícil depois de décadas). Cabe também destacar que o longa muitas vezes se mostra como uma comédia de costumes, tendo várias tiradas de conotação sexual.

Além de suas matizes temáticas, “A Felicidade Não Se Compra” mostra-se uma aula de cinema em seus aspectos técnicos. Com uma interessante narrativa em flashback, a qual nos mostra a infância e juventude de George até chegarmos ao momento crucial de seu desejo de suicídio, Capra demonstra como contar uma boa história prendendo o espectador do início ao fim, com um roteiro primoroso (suas eventuais elipses devem ser creditadas à edição que chegou aos nossos dias, que não é a mesma da original). As atuações também são impecáveis. James Stewart está brilhante e Lionel Barrymore, como ressaltado acima, empresta uma caracterização perfeita para o vilão Sr. Potter, mesmo que possam alguns taxá-la de caricatural, o que neste caso não é um problema. A intenção de Capra é mesmo colocar o preto-no-branco. Seus personagens são arquétipos sociais e estão postos ali para compreendermos claramente a mensagem que o diretor pretende passar.

Bem, o mais importante ao concluir esta resenha é afirmar: este é um filme realmente emocionante, daqueles capazes de fazer chorar o mais cético dos corações. Se você não se emocionar, talvez seja porque está faltando algo de humano em sua pessoa. Uma obra para a posteridade, para ser vista através de gerações, o tipo de filme que gostaríamos de ter a oportunidade de mostrar para os nossos filhos. Portanto, se você está procurando um filme “família” para ver neste Natal, não tenha dúvidas: “It’s a Wonderful Life” é insuperável neste quesito. Garanto que no próximo Natal todos desejarão revê-lo.

Ah, mas e aquela história que eu contei no início da resenha, como terminou? Bem, deu tudo errado. Hoje, praticamente nem nos falamos mais, trocando no máximo frios cumprimentos “por educação”. Mas... o que realmente importa é que naquele dia tive a real sensação de que a felicidade, verdadeiramente, não se compra (por mais clichê que isso possa parecer). Nenhum dinheiro do mundo compensaria a alegria daquele telefonema...

Obs. Frank Capra, em visita ao Brasil alguns anos depois do lançamento do filme, acabou se surpreendendo com o título brasileiro, considerando-o melhor que o original. Creio que ele tinha razão. ;)

Cotação e nota: Obra-prima.

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Um ótimo Natal e um 2009 repleto de realizações para todos!

Um abraço do tamanho de sua felicidade!

Fábio Henrique Carmo!
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3 comentários:

Anônimo disse...

Eu lembro rs. Excelente filme tb. Feliz Natal, Fábio!!

Luciana.

Anônimo disse...

Fábio, vi a indicação do livro "1001 filmes...". Preciso comentar que vi esse livro há duas semanas na livraria e só me lembrei de você pq, além do motivo óbvio, tem o Indiana Jones na capa hehehehe!!


Luciana.

Fábio Henrique Carmo disse...

Feliz Natal, Luciana!

E realmente amo o Indiana Jones!

Ah, e um grande 2009 também!