O caminho é mais importante que o destino
A comédia romântica é o subgênero cinematográfico que provavelmente mais foi castigado ao longo dos anos, principalmente devido ao seu inescusável final feliz. Afinal, se não fosse assim, a comédia não seria “romântica”. Então, costumamos assistir àquela velha historinha que pode ser resumida como “garoto encontra garota, se apaixonam, enfrentam algumas dificuldades, mas no fim são felizes para sempre”. Simples e batido desta forma mesmo, mas o público, principalmente o feminino, parece jamais se cansar de tal fórmula. Entretanto, mesmo dentro de um esquema tão limitado, é possível adicionar novos temperos para tornar a experiência interessante, por mais que possamos vislumbrar como tudo aquilo terminará.
É isso que teve em mente o pouco conhecido diretor Will Gluck ao realizar este “Amizade Colorida” (Friends With Benefits). Não existe grande novidade no fato de Dylan Harper (Justin Timberlake) e Jamie (Mila Kunis) se encontrarem, descobrirem que se sentem atraídos um pelo outro e terminarem juntinhos no desfecho da trama (opa, não dá pra se chatear e afirmar que a última frase é um spoiler, né?). O que há de novo é o trajeto até este fim. Antenado com os novos tempos, Gluck, que também é coautor do roteiro (ao lado de Keith Merryman, David A. Newman e Harley Peyton), soube atualizar o velho conto de fadas tendo em vista as mudanças comportamentais ocorridas nas últimas décadas. Afinal, a premissa do longa se baseia no conceito de que Jamie e Dylan se sentem atraídos, mas, devido a frustrados relacionamentos anteriores, acabam por ter uma relação sustentada apenas no sexo, mas sem compromissos afetivos a não ser a amizade. Ok, sei que há um outro filme recente protagonizado por Natalie Portman que trata do mesmo tema – o que desfaz um pouco a ideia novidadeira da produção. Contudo, é inegável que os responsáveis por “Amizade Colorida”* tratam o tema de forma adulta e, ao mesmo tempo, extremamente bem-humorada, resultando em uma comédia inteligente em que não fazemos qualquer esforço para rir.
Ao contrário do que normalmente sucede no gênero, os personagens são tridimensionais, possuindo não apenas o presente, mas também um passado que explica suas atitudes. Acompanhando a narrativa, vemos que Dylan teve problemas sérios em sua família que o levam a se sentir inseguro emocionalmente, enquanto Jamie é o exato reflexo do paradoxo de boa parte das mulheres de hoje: independentes profissionalmente, mas ainda à espera de um príncipe encantado. Ela é uma caça-talentos que vê em Dylan, até então apenas um blogueiro criativo, um grande potencial para a área de criação gráfica. Assim, a moça acaba convencendo o jovem a morar em Nova York (com direito a momento “Manhattan” na tela) e trabalhar em uma importante publicação, resultando daí o surgimento da tal amizade “colorida”. É importante frisar que o enredo é recheado de ótimos diálogos e, claro, muitas passagens realmente engraçadas que usam e abusam de um humor mais adulto, cheio de tiradas picantes. Interessante que, mesmo se valendo do sexo como matéria-prima do riso, nãos sentimos que o longa apela para a vulgaridade e poucos são os autores que alcançam tal proeza. Além disso, Gluck imprime um ótimo ritmo ao filme, o qual jamais cai na monotonia, mesmo quando surgem os inevitáveis artifícios para o casal ficar junto.
Para uma comédia ter sucesso, obviamente um dos principais aspectos é o elenco escalado e a escolha deste se mostrou aqui muito feliz. Mila Kunis está demonstrando cada vez mais o seu potencial como estrela, unindo talento e carisma (curioso que ela e Portman enveredaram pelos mesmos caminhos para operar o descarrego de “Cisne Negro”). Por seu turno, Justin Timberlake vem mesmo se colocando como uma ótima surpresa. Em seu primeiro papel como protagonista, ele confirma as boas impressões de atuações em papeis coadjuvantes (como em “A Rede Social”). Sua desenvoltura é notável e ele parece se sentir muito mais à vontade do que outros atores de carreira. O rapaz tem futuro na profissão, não se pode negar. Aliás, já fazia tempo não via um casal com uma química tão boa em cena. Para colocar a cereja no bolo, ainda temos Woody Harrelson como o impagável amigo gay de Dylan, sempre divertido em todas as suas aparições.
Apesar disso, o filme ainda sofre com algumas falhas sensíveis. Existem problemas de continuidade irritantes, como em uma sequência no aeroporto em que o pai de Dylan chega de cadeira de rodas e sai andando. Ademais, o Alzheimer do personagem fica mal caracterizado, muitas vezes não parecendo que ele é doente. Em outra vertente, o momento “Manhattan” citado mais acima soa deslocado, com as homenagens e citações a Nova York meio que introduzidas a fórceps na trama. Ressalte-se, inclusive, que algumas piadas acabam por ter um gosto muito forte de hambúrguer, aptas apenas a fazer rir o público norte-americano (ou pessoas bastante conhecedoras de sua cultura).
A despeito desses problemas, “Friends With Benefits” traz um resultado bastante satisfatório, bem acima da média das comédias românticas que costumam entrar em cartaz. A feliz comparação empreendida pelo filme ao usar o flashmob (aquelas aglomerações de pessoas que se reúnem para uma ação determinada e se dispersam tão rapidamente quanto se juntam) como metáfora para os relacionamentos modernos é bastante inteligente e, como já falado, não é sempre que vemos boas ideias neste subgênero. Esta experiência é o típico caso em que o trajeto da viagem e suas paisagens são mais importantes que o destino, já bastante conhecido por todos. Entretanto, sem dúvida é uma viagem que faz valer à pena o preço do ingresso, mesmo que ela não vá mudar sua vida.
Cotação:
Nota: 8,0
* O título em português é o mesmo de uma antiga série da Rede Globo, o que demonstra o quanto os americanos são conservadores e estão bastante atrasados na abordagem de alguns temas.
A comédia romântica é o subgênero cinematográfico que provavelmente mais foi castigado ao longo dos anos, principalmente devido ao seu inescusável final feliz. Afinal, se não fosse assim, a comédia não seria “romântica”. Então, costumamos assistir àquela velha historinha que pode ser resumida como “garoto encontra garota, se apaixonam, enfrentam algumas dificuldades, mas no fim são felizes para sempre”. Simples e batido desta forma mesmo, mas o público, principalmente o feminino, parece jamais se cansar de tal fórmula. Entretanto, mesmo dentro de um esquema tão limitado, é possível adicionar novos temperos para tornar a experiência interessante, por mais que possamos vislumbrar como tudo aquilo terminará.
É isso que teve em mente o pouco conhecido diretor Will Gluck ao realizar este “Amizade Colorida” (Friends With Benefits). Não existe grande novidade no fato de Dylan Harper (Justin Timberlake) e Jamie (Mila Kunis) se encontrarem, descobrirem que se sentem atraídos um pelo outro e terminarem juntinhos no desfecho da trama (opa, não dá pra se chatear e afirmar que a última frase é um spoiler, né?). O que há de novo é o trajeto até este fim. Antenado com os novos tempos, Gluck, que também é coautor do roteiro (ao lado de Keith Merryman, David A. Newman e Harley Peyton), soube atualizar o velho conto de fadas tendo em vista as mudanças comportamentais ocorridas nas últimas décadas. Afinal, a premissa do longa se baseia no conceito de que Jamie e Dylan se sentem atraídos, mas, devido a frustrados relacionamentos anteriores, acabam por ter uma relação sustentada apenas no sexo, mas sem compromissos afetivos a não ser a amizade. Ok, sei que há um outro filme recente protagonizado por Natalie Portman que trata do mesmo tema – o que desfaz um pouco a ideia novidadeira da produção. Contudo, é inegável que os responsáveis por “Amizade Colorida”* tratam o tema de forma adulta e, ao mesmo tempo, extremamente bem-humorada, resultando em uma comédia inteligente em que não fazemos qualquer esforço para rir.
Ao contrário do que normalmente sucede no gênero, os personagens são tridimensionais, possuindo não apenas o presente, mas também um passado que explica suas atitudes. Acompanhando a narrativa, vemos que Dylan teve problemas sérios em sua família que o levam a se sentir inseguro emocionalmente, enquanto Jamie é o exato reflexo do paradoxo de boa parte das mulheres de hoje: independentes profissionalmente, mas ainda à espera de um príncipe encantado. Ela é uma caça-talentos que vê em Dylan, até então apenas um blogueiro criativo, um grande potencial para a área de criação gráfica. Assim, a moça acaba convencendo o jovem a morar em Nova York (com direito a momento “Manhattan” na tela) e trabalhar em uma importante publicação, resultando daí o surgimento da tal amizade “colorida”. É importante frisar que o enredo é recheado de ótimos diálogos e, claro, muitas passagens realmente engraçadas que usam e abusam de um humor mais adulto, cheio de tiradas picantes. Interessante que, mesmo se valendo do sexo como matéria-prima do riso, nãos sentimos que o longa apela para a vulgaridade e poucos são os autores que alcançam tal proeza. Além disso, Gluck imprime um ótimo ritmo ao filme, o qual jamais cai na monotonia, mesmo quando surgem os inevitáveis artifícios para o casal ficar junto.
Para uma comédia ter sucesso, obviamente um dos principais aspectos é o elenco escalado e a escolha deste se mostrou aqui muito feliz. Mila Kunis está demonstrando cada vez mais o seu potencial como estrela, unindo talento e carisma (curioso que ela e Portman enveredaram pelos mesmos caminhos para operar o descarrego de “Cisne Negro”). Por seu turno, Justin Timberlake vem mesmo se colocando como uma ótima surpresa. Em seu primeiro papel como protagonista, ele confirma as boas impressões de atuações em papeis coadjuvantes (como em “A Rede Social”). Sua desenvoltura é notável e ele parece se sentir muito mais à vontade do que outros atores de carreira. O rapaz tem futuro na profissão, não se pode negar. Aliás, já fazia tempo não via um casal com uma química tão boa em cena. Para colocar a cereja no bolo, ainda temos Woody Harrelson como o impagável amigo gay de Dylan, sempre divertido em todas as suas aparições.
Apesar disso, o filme ainda sofre com algumas falhas sensíveis. Existem problemas de continuidade irritantes, como em uma sequência no aeroporto em que o pai de Dylan chega de cadeira de rodas e sai andando. Ademais, o Alzheimer do personagem fica mal caracterizado, muitas vezes não parecendo que ele é doente. Em outra vertente, o momento “Manhattan” citado mais acima soa deslocado, com as homenagens e citações a Nova York meio que introduzidas a fórceps na trama. Ressalte-se, inclusive, que algumas piadas acabam por ter um gosto muito forte de hambúrguer, aptas apenas a fazer rir o público norte-americano (ou pessoas bastante conhecedoras de sua cultura).
A despeito desses problemas, “Friends With Benefits” traz um resultado bastante satisfatório, bem acima da média das comédias românticas que costumam entrar em cartaz. A feliz comparação empreendida pelo filme ao usar o flashmob (aquelas aglomerações de pessoas que se reúnem para uma ação determinada e se dispersam tão rapidamente quanto se juntam) como metáfora para os relacionamentos modernos é bastante inteligente e, como já falado, não é sempre que vemos boas ideias neste subgênero. Esta experiência é o típico caso em que o trajeto da viagem e suas paisagens são mais importantes que o destino, já bastante conhecido por todos. Entretanto, sem dúvida é uma viagem que faz valer à pena o preço do ingresso, mesmo que ela não vá mudar sua vida.
Cotação:
Nota: 8,0
* O título em português é o mesmo de uma antiga série da Rede Globo, o que demonstra o quanto os americanos são conservadores e estão bastante atrasados na abordagem de alguns temas.
7 comentários:
Não sei. Estou com pré-conceito devido ao "ator". Quem sabe quando sair em dvd.
Mas, sua nota me fez repensar a possibilidade seriamente.
Abraços
Já sabia que este filme brincava com os clichês da comédia romântica. Se você parar para pensar, temos vários filmes atualmente que estão tentando "burlar" cartilha de se fazer comédia romântica. Isso é bom, mas sinto que logo logo também se tornará um clichê dentro do subgênero, rs
Estou super afim de conferir este, mas ele ainda nem deu as caras na minha cidade...
Abs.
Eu acho que esse filme consegue dialogar bem com a juventude e às pessoas que precisam de um sentimento, mas que apegam-se a relações sexuais, talvez com medo de se frustrar. O casal é bem próximo do público, Kunis e Timberlake estão em bela sintonia. Ainda assim, é um filme regular, sem maiores surpresas, mesmo sendo mais interessante que aquele fraco "Sexo sem compromisso" com a Portman.
Ótimo texto o teu, concordei com todos os pontos analisados.
Em breve publico o meu também no Apimentário, aguarde! Abração!
Fabio, teu texto tá muito bem feito!
Amizade Colorida é um filme legal mesmo, com a vantagen de zombar dos proprios cliches do genero. Vale uma olhada mesmo, alem de ter a deliciosa Mila Kunis.
Abs!
Navegando daqui, navegando dali, acabei chegando ao seu blog e achei tudo muito interessante.
Aqui no Rio está acontecendo o Festival de Cinema e ainda não tive tempo para ir mas, certamente, assistirei a alguns desses filmes quando entrarem em cartaz.
Um abraço e parabéns pelo ótimo blog.
Roberto
Roberto, muito obrigado pelos elogios ao blog. Apareça sempre e sinta-se em casa para comentar! Ah, e que em dera eu pudesse aproveitar o Festival do Rio...
Abraço e até a próxima!
Fábio, mais uma vez, parabéns. Penso que a atuação de Justin Timberlake como ator e sua desenvoltura se deve muito por seus clipes. Afinal de contas ele é também um ator quando sobe aos palcos ou estreia um novo clipe. Ainda não vi o filme. Não do gênero que mais aprecio, muito embora já tenha visto alguns como: Alguém tem que ceder, em especial. Mas, confesso que fiquei curioso. A respeito do problema do blogger acredito tê-lo resolvido. Um abraço...
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