Agradável déjà vu
Sabe aquela sensação de já ter vivido ou visto alguma coisa antes, também conhecida como déjà vu? Os cientistas costumam explicá-la como um momento em que o cérebro ativa a região responsável pela memória logo após um fato ter sido visto ou vivenciado. No caso da arte, entretanto, principalmente do cinema norte-americano e sua atual crise de criatividade, não se trata exatamente de um fenômeno psíquico. Pelo contrário, o mais comum é realmente termos visto aquela estória narrada na tela em algum outro filme pretérito, normalmente uma produção que teve boa aceitação por parte do público no passado, mas que já não está tão fresca na mente das novas gerações, possibilitando que talvez elas aceitem a proposta como possuindo algo de original.
Essa sensação de déjà vu percorre toda a duração de “Gigantes de Aço” (Real Steel), longa que vem ocupando o topo das bilheterias norte-americanas e que teve sua estreia no Brasil na última sexta-feira. Falando sério (não confunda com a música de Roberto Carlos): seu roteiro parece uma colagem de “Rocky, Um Lutador” (Rocky, 1976), “O Campeão” (The Champ, 1979) e ainda outro com Sylvester Stallone, “Falcão - O Campeão dos Campeões” (Over The Top, 1987). Deste último, até o caminhão do personagem central está presente na trama, a qual apresenta como fio de originalidade a ideia de um futuro próximo em que as lutas esportivas entre seres humanos, como o boxe e o MMA, foram substituídas por lutas entre robôs, aptas a deixar extravasar toda a violência desejada pelas plateias. É nesse contexto que Charlie Kenton (Hugh Jackman), um ex-boxeador que chegou a ser o número 2 do mundo, tenta hoje sobreviver – sempre ajudado por Bailey Tallet (Evangeline Lilly), seu interesse romântico e filha do dono da academia onde treinava - comprando robôs de segunda mão para participar de lutas em ringues de apostas ilegais, sonhando em um dia chegar ao circuito profissional, o chamado WRB. Depois da perda de mais um robô e sem dinheiro para reconstruí-lo ou comprar um outro, Kenton recebe a notícia de que a mãe de seu filho Max (Dakota Goyo) faleceu, forçando-o a uma necessária aproximação com o garoto. Este, por sua vez, é fã das lutas de robôs, sabendo até mais do que o pai todos os detalhes do circuito profissional. Em certa oportunidade, os dois acabam encontrando em um lixão um antigo robô que servia apenas como sparring de outros lutadores e o menino, apesar da relutância do pai, cisma em transformá-lo em um campeão.
A partir desta sinopse, já dá pra perceber os caminhos que o enredo irá trilhar. Estão lá o velho drama de reaproximação de pai e filho, os quais inevitavelmente acabarão se entendendo. Também vemos a antiga história de superação de um Davi enfrentando um Golias, no melhor estilo do citado “Rocky”. Ou seja, o roteiro (escrito por John Gatins, Michael Caton-Jones e Sheldon Turner e baseado em um conto de Richard Matheson) é salpicado de clichês já previamente estabelecidos, com várias citações a clássicos do subgênero que na realidade beiram o plágio descarado. Estas circunstâncias tinham tudo para transformar “Gigantes de Aço” em um desastre, mas não é o que acontece devido à direção de Shaw Levy (responsável pelos dois “Uma Noite No Museu”) que, mesmo diante da previsibilidade da narrativa, consegue imprimir a ela um ótimo ritmo, além de nos brindar com sequências muito bem realizadas e envolventes, tanto naquelas que mostram a relação de pai e filho - onde percebemos nitidamente o dedo sentimental de Steven Spielberg, produtor executivo do longa - quanto nas fantásticas cenas de luta, coreografadas com excelência (contaram com a orientação do lendário campeão Sugar Ray Leonard) e que nos brindam com incríveis efeitos especiais que nos fazem acreditar que estamos diante de robôs de verdade, neste ponto só comparáveis aos da série “Transformers”. Desta forma, apesar de seu caráter previsível, o filme nunca se torna chato ou entendiante, mesmo que em certos momentos inevitavelmente busque emoções fáceis como ao inserir uma trilha sonora piegas e redundante.
Também para o seu sucesso colabora o elenco competente, mesmo que não excepcional. Hugh “Wolverine” Jackman pode não ser um ator excepcional, mas conta sempre com seu inegável carisma, além de possuir um físico perfeitamente adequado para encarnar um ex-lutador boxe. Já o garoto Dakota Goyo, apesar de aparentar um certa artificialidade em algumas cenas, compensa estas com outras onde demonstra que pode ter grande futuro, principalmente nas sequências finais da projeção. Por outro lado, a rapidez com que Charlie e Max resolvem seus conflitos acaba incomodando. Afinal, o garoto foi esquecido pelo pai ao longo de anos e a proximidade e cumplicidade que os dois adquirem em curto espaço de tempo terminam soando inverossímeis. Igualmente inverossímil é a capacidade de Max em consertar e rearranjar a engenharia dos robôs, algo complexo demais para um menino de 11 anos.
Destarte, é bom ter em mente o público para o qual o longa é voltado. Trata-se de um entretenimento basicamente destinado a garotos que estão justamente na faixa etária entre 10 e 13 anos e que certamente deixarão as salas bastante satisfeitos com o que viram. Se estivesse nessa idade com certeza sairia do cinema vibrando com o filme e veria diversas reprises. Todavia, como já passei dessa fase e já vi os filmes que o inspiraram, saí apenas com a sensação de ter vivido um déjà vu, ainda que muito agradável e atualizado para um público do século XXI com pouca memória cinematográfica.
Cotação:
Nota: 8,0
Sabe aquela sensação de já ter vivido ou visto alguma coisa antes, também conhecida como déjà vu? Os cientistas costumam explicá-la como um momento em que o cérebro ativa a região responsável pela memória logo após um fato ter sido visto ou vivenciado. No caso da arte, entretanto, principalmente do cinema norte-americano e sua atual crise de criatividade, não se trata exatamente de um fenômeno psíquico. Pelo contrário, o mais comum é realmente termos visto aquela estória narrada na tela em algum outro filme pretérito, normalmente uma produção que teve boa aceitação por parte do público no passado, mas que já não está tão fresca na mente das novas gerações, possibilitando que talvez elas aceitem a proposta como possuindo algo de original.
Essa sensação de déjà vu percorre toda a duração de “Gigantes de Aço” (Real Steel), longa que vem ocupando o topo das bilheterias norte-americanas e que teve sua estreia no Brasil na última sexta-feira. Falando sério (não confunda com a música de Roberto Carlos): seu roteiro parece uma colagem de “Rocky, Um Lutador” (Rocky, 1976), “O Campeão” (The Champ, 1979) e ainda outro com Sylvester Stallone, “Falcão - O Campeão dos Campeões” (Over The Top, 1987). Deste último, até o caminhão do personagem central está presente na trama, a qual apresenta como fio de originalidade a ideia de um futuro próximo em que as lutas esportivas entre seres humanos, como o boxe e o MMA, foram substituídas por lutas entre robôs, aptas a deixar extravasar toda a violência desejada pelas plateias. É nesse contexto que Charlie Kenton (Hugh Jackman), um ex-boxeador que chegou a ser o número 2 do mundo, tenta hoje sobreviver – sempre ajudado por Bailey Tallet (Evangeline Lilly), seu interesse romântico e filha do dono da academia onde treinava - comprando robôs de segunda mão para participar de lutas em ringues de apostas ilegais, sonhando em um dia chegar ao circuito profissional, o chamado WRB. Depois da perda de mais um robô e sem dinheiro para reconstruí-lo ou comprar um outro, Kenton recebe a notícia de que a mãe de seu filho Max (Dakota Goyo) faleceu, forçando-o a uma necessária aproximação com o garoto. Este, por sua vez, é fã das lutas de robôs, sabendo até mais do que o pai todos os detalhes do circuito profissional. Em certa oportunidade, os dois acabam encontrando em um lixão um antigo robô que servia apenas como sparring de outros lutadores e o menino, apesar da relutância do pai, cisma em transformá-lo em um campeão.
A partir desta sinopse, já dá pra perceber os caminhos que o enredo irá trilhar. Estão lá o velho drama de reaproximação de pai e filho, os quais inevitavelmente acabarão se entendendo. Também vemos a antiga história de superação de um Davi enfrentando um Golias, no melhor estilo do citado “Rocky”. Ou seja, o roteiro (escrito por John Gatins, Michael Caton-Jones e Sheldon Turner e baseado em um conto de Richard Matheson) é salpicado de clichês já previamente estabelecidos, com várias citações a clássicos do subgênero que na realidade beiram o plágio descarado. Estas circunstâncias tinham tudo para transformar “Gigantes de Aço” em um desastre, mas não é o que acontece devido à direção de Shaw Levy (responsável pelos dois “Uma Noite No Museu”) que, mesmo diante da previsibilidade da narrativa, consegue imprimir a ela um ótimo ritmo, além de nos brindar com sequências muito bem realizadas e envolventes, tanto naquelas que mostram a relação de pai e filho - onde percebemos nitidamente o dedo sentimental de Steven Spielberg, produtor executivo do longa - quanto nas fantásticas cenas de luta, coreografadas com excelência (contaram com a orientação do lendário campeão Sugar Ray Leonard) e que nos brindam com incríveis efeitos especiais que nos fazem acreditar que estamos diante de robôs de verdade, neste ponto só comparáveis aos da série “Transformers”. Desta forma, apesar de seu caráter previsível, o filme nunca se torna chato ou entendiante, mesmo que em certos momentos inevitavelmente busque emoções fáceis como ao inserir uma trilha sonora piegas e redundante.
Também para o seu sucesso colabora o elenco competente, mesmo que não excepcional. Hugh “Wolverine” Jackman pode não ser um ator excepcional, mas conta sempre com seu inegável carisma, além de possuir um físico perfeitamente adequado para encarnar um ex-lutador boxe. Já o garoto Dakota Goyo, apesar de aparentar um certa artificialidade em algumas cenas, compensa estas com outras onde demonstra que pode ter grande futuro, principalmente nas sequências finais da projeção. Por outro lado, a rapidez com que Charlie e Max resolvem seus conflitos acaba incomodando. Afinal, o garoto foi esquecido pelo pai ao longo de anos e a proximidade e cumplicidade que os dois adquirem em curto espaço de tempo terminam soando inverossímeis. Igualmente inverossímil é a capacidade de Max em consertar e rearranjar a engenharia dos robôs, algo complexo demais para um menino de 11 anos.
Destarte, é bom ter em mente o público para o qual o longa é voltado. Trata-se de um entretenimento basicamente destinado a garotos que estão justamente na faixa etária entre 10 e 13 anos e que certamente deixarão as salas bastante satisfeitos com o que viram. Se estivesse nessa idade com certeza sairia do cinema vibrando com o filme e veria diversas reprises. Todavia, como já passei dessa fase e já vi os filmes que o inspiraram, saí apenas com a sensação de ter vivido um déjà vu, ainda que muito agradável e atualizado para um público do século XXI com pouca memória cinematográfica.
Cotação:
Nota: 8,0
5 comentários:
Dejavu, as vezes, para relaxar é bom. kkk
Eu gostei do trailer. E apesar de ser um filme para 10 ou 13 anos, acho que vou arriscar uma diversão. kkk
impressionante como este filme vem tendo boas críticas, não esperava essa recepção tão positiva.
quero ver!!
to afim de ver esse tb, acho q verei essa semana!
Não gosto muito de filmes tão previsíveis, Fábio. Esperarei, sim, chegar em DVD. Não vou arriscar a perdeu meu tão precioso tempo. Um abraço...
Meu interesse maior é mais em Hugh Jackman, acho um bom ator, mas ainda limitado por filmes que não exploram seu pontencial. Mas, este filme deve ser um bom entretenimento. Sua nota foi alta, hein? Mas, teu texto me animou a ver, mesmo deixando claro que é um roteiro 'clichento', rs.
Abs
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