domingo, 11 de setembro de 2011

Planeta dos Macacos: A Origem



Macacos de todo o mundo: uni-vos!


Ao longo de meu período universitário, um dos trabalhos acadêmicos que mais me deixou recordações foi realizado dentro de disciplina de Ética, ainda no 3º período. Foi um seminário em que discutíamos se nós, seres humanos, temos o direito de impingir sofrimento ou mesmo matar outros seres vivos tidos como “irracionais”. Lembro-me que, um dos livros base para o trabalho, denominado “Ética Prática” (do polêmico filósofo Peter Singer), relatava uma experiência com macacos da espécie conhecida como bonobo, onde cientistas chegaram à conclusão que estes símios possuíam, na idade adulta, uma inteligência similar a uma criança de 6 anos, chegando a possuir consciência de si mesmos. Diante desta constatação, meu grupo defendeu a tese de que animais com tamanho desenvolvimento deveriam ter garantido seu direito à vida tal como nós, seres humanos, bem como não deveriam ser submetidos a tratamentos degradantes (como reclusão em jaulas ou experiências de caráter científico temerário). Mas por que estou relembrando esses fatos pessoais de minha vida estudantil nesta resenha? Bem, não é por mero saudosismo. A questão é que “Planeta dos Macacos: A Origem”, atualmente em exibição nos cinemas, tem como ponto central justamente o questionamento sobre os limites da postura da humanidade diante das outras espécies tidas como “irracionais”.


É a partir desta ideia, de que os animais devem se tratados com mais respeito pela humanidade, que os roteiristas Rick Jaffa e Amanda Silver desenvolvem um roteiro inteligente e que se conecta muito bem com o filme original de 1968, estrelado por Charlton Heston e dirigido por Franklin J,. Shaffner (grande diretor que deveria ser mais lembrado), longa-metragem que gerou várias sequências nos anos 70 e até série televisiva. A trama, que se passa em um futuro próximo, é amarrada a partir de uma pesquisa sobre o Mal de Alzheimer desenvolvida pelo cientista Will Rodman (James Franco, apenas competente). Símios de diversas espécies, de chimpanzés a orogotangos, são as cobaias usadas e alguns deles acabam desenvolvendo uma inteligência acima do comum. É o filhote de uma das fêmeas, Cesar (o fantástico Andy Serkis), que acaba sendo levado por Will para ser criado em casa, demonstrando, aos poucos, que tem uma compreensão sobre o mundo que o cerca semelhante a de um homem. Entretanto, Cesar vai aos poucos se sentindo inferiorizado por ser tratado como um bicho de estimação quando fora de casa, além de se sentir isolado em um mundo dominado por humanos, até que, como já subentendido pelo título do filme, alguns fatos que ocorrem que levarão não apenas Cesar, como também o grupo de símios por ele liderado, a uma revolta contra as condições degradantes em que vivem e pela liberdade.


Interessante perceber, ao longo da narrativa de um blockbuster concebido por Hollywood, a presença constante de concepções de cunho socialista, apresentando-se como um verdadeiro manifesto contra qualquer tipo de opressão, indo além da mera panfletagem ecológica. A cena em que Cesar dialoga com outro macaco mostrando que estes isolados são frágeis e que juntos podem ser fortes é puro marxismo. Só faltou surgir a frase “macacos de todo o mundo: uni-vos” para que pudéssemos sentir na tela a perfeita transposição do Manifesto Comunista escrito por Marx e Engels. Não é exagero dizer que Sergei Eisenstein poderia, caso fosse vivo, ter assumido a direção do projeto.

Não obstante este caráter social-libertário, o filme apresenta méritos excepcionais enquanto obra cinematográfica. Os efeitos usados para conceber Cesar, com aquela captação de movimentos e expressões que se tornou famosa desde a trilogia “O Senhor dos Anéis” (motion capture), são simplesmente incríveis. Em vários momentos, parece que estamos diante de um macaco real, esquecendo que se trata apenas de um artifício da tecnologia. À parte os méritos da técnica, Andy Serkis, que já se especializou neste tipo de trabalho, nos entrega mais uma atuação excepcional. Talvez um dia a Academia reconheça o mérito de suas performances e o premie com um Oscar. Vale dizer que não apenas Cesar é convincente, mas todos os outros símios também o são, consagrando o longa como mais um marco na evolução dos efeitos visuais. Na outra vertente, a dos humanos, se o citado James Franco não enche os olhos com sua atuação, John Lithgow, que faz o pai de Will, portador do Mal de Alzheimer, é o único dos “humanos” a nos estregar uma ótima atuação, já que Freida Pinto, como a namorada de Will e veterinária que ajuda nos cuidados com Cesar, não tem muito o que fazer (mas está bonita como sempre). Destarte, é surpreendente ver com um diretor praticamente desconhecido como Rupert Wyatt pode nos entregar um longa tão bem conduzido, sabendo dosar a tensão e contar sem pressa a narrativa. Além disso, mostra-se um grande diretor de sequências de ação, onde entendemos perfeitamente tudo que está acontecendo na tela (viu Michael Bay?).

Apesar da estória acabar por recorrer a situações inverossímeis (como um grupo de macacos poderia resistir tão bem a um enorme contingente de polícia e exército armados?), “Planeta dos Macacos: A Origem” se mostra como um libelo contra toda forma de opressão, seja no que diz respeito a classes sociais, sexo, raça ou mesmo contra outras espécies de seres vivos, como fica mais explicitado no longa. Ademais, ainda toca no tema da responsabilidade com pesquisas científicas que possam eventualmente gerar situações que fujam do controle, colocando em risco a própria existência humana. Um blockbuster que, além de levar ótimo entretenimento ao espectador, consegue também fazê-lo refletir é sempre muito bem-vindo. O sucesso que este longa-metragem vem obtendo nas bilheterias é bastante merecido e talvez ele possa ser inserido dentro daquela nova revolução que parece estar acontecendo no cinema comercial: a dos grandes lançamentos que também fazem o público pensar (como no exemplo de “A Origem”). Um filme que faz justiça ao mencionado original de 1968.


Cotação:

Nota: 9,0
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3 comentários:

ANTONIO NAHUD disse...

Tô louco para vê-lo...

O Falcão Maltês

renatocinema disse...

Adorei o filme.

A sua frase final é real: um filme que faz justiça ao mencionado original de 1968.

Ainda prefiro a obra original. Porém, essa atualização foi muito digna.

Abraços e obrigado pela atenção ao meu blog.

Cristiano Contreiras disse...

Seu texto é o mais detalhado e forte sobre este filme, Fábio. Eu realmente te admiro pela maneira como explana os pontos mais interessantes de um filme, tudo com uma maneira única. Eu não havia tido interesse algum nesta obra, anteriormente, tanto que dizia que eu veria mais pelo James Franco - bom ator, mas subestimado por muitos.

Parabéns pela análise, me parece um bom trabalho, além dos efeitos especiais que devem mesmo surpreender.

Abração!

Ps, devo ver amanha!