terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Filmes Para Ver Antes de Morrer


Pinóquio
(Pinocchio)


Uma fábula atemporal



É muito provável que você já tenha escutado uma canção chamada “When You Wish Upon A Star”, a qual se tornou um clássico do cancioneiro popular norte-americano (se não ouviu, basta clicar no display ao fim desta resenha). Pois bem, ela recebeu o Oscar de melhor canção (com justiça) em 1941, ajudando a consagrar o filme do qual é tema, “Pinóquio”, o segundo longa-metragem em animação dos estúdios Disney.

Após o estrondoso sucesso de “Branca de Neve e Os Sete Anões”, a primeira animação em longa metragem do cinema, realizada em 1937 e que, até hoje, serve como patamar de referência para os estúdios de animação, seria difícil para Walt Disney igualar o nível de sua empreitada pioneira. A começar pelo material básico. O conto “Pinocchio” de Carlo Collodi (de 1883) era muito sombrio e Disney teve que determinar à sua equipe algumas alterações para que ele se tornasse mais palatável ao grande público. Os personagens também não se mostravam tão carismáticos quanto os de “Branca de Neve”, o que levou a equipe a inserir alguns outros, como o Grilo Falante. Além disso, a trama apresentava desafios técnicos enormes, tais como a sequência envolvendo a fuga de uma baleia em alto mar. Entretanto, Disney sempre afirmou que sua grande meta era quebrar barreiras e desta vez não foi diferente. Mesmo tendo uma estreia difícil, com uma bilheteria abaixo do esperado (o mundo estava em guerra quando foi lançado), a animação, ao longo dos anos, cresceu junto aos olhos da crítica e do público, fazendo jus ao esforço de seu idealizador.

A narrativa trata de um boneco de madeira construído pelo artesão Gepeto que adquire vida por obra da Fada Azul, atendendo a um pedido do velho solitário. A partir de então, o grande desejo de Pinóquio é se tornar um menino de carne e osso. Todavia, para conseguir seu objetivo, deverá mostrar valentia, dedicação, lealdade e disciplina, entre outras virtudes necessárias. Seu objetivo começa a sofrer atropelos quando é assediado por João Honesto, um larápio que o convence de que pode ser um grande ator, apesar da insistência em contrário do Grilo Falante, o qual possui a missão de ser a sua “consciência” (e foi primeiro personagem da Disney a falar diretamente com os espectadores). O intuito de João Honesto, na verdade, é vendê-lo para o saltimbanco Stromboli, dono de um show de marionetes que vagueia pelas redondezas. É aqui que começa o lado sinistro da narrativa e percebemos o quanto o longa ainda permanece atual. A exploração da inocência continua tão frequente quanto em outros tempos (talvez tenha até aumentado) o que torna “Pinóquio” até mesmo um filme necessário, hoje, para os pequenos. Os noticiários estão repletos de casos de crianças desaparecidas, sequestradas ou abusadas sexualmente e as cenas que mostram o menino de madeira preso a uma gaiola podem, infelizmente, retratar a realidade de muitos inocentes no presente momento.


É interessante notar, ademais, como Pinóquio retrata com perfeição o comportamento infantil, mesmo levando em consideração a “esperteza” das crianças de hoje. Toda criança, em determinada fase, mente aos adultos para esconder suas peraltices e isto é mostrado com rara eficiência na clássica sequência em que o nariz de Pinóquio cresce a cada mentira que conta para a Fada Azul. A indisciplina infantil também é retratada de forma perfeita nas desventuras de Pinóquio na Ilha dos Prazeres. Mal influenciado pelo garoto Espoleta (demonstrando o quanto as más influências podem ser nocivas ao comportamento das crianças), o protagonista se entrega a toda sorte de prazeres proibidos aos pequenos, como fumar, jogar ou se entupir de guloseimas. A consequência é que os garotos, aos poucos, vão se transformando em burros, numa analogia clara com os resultados que a falta de estudo ou dedicação ao trabalho podem trazer. A passagem na Ilha dos Prazeres também possui tons bastante sinistros (tal como no cativeiro de Stromboli), mas é importante ressaltar que a equipe (com direção de Hamilton Luske e Ben Sharpsteen) soube realmente minorar o lado sombrio para torná-lo palatável ao público (principalmente às crianças).

O caráter técnico, por sua vez, é realmente impressionante. Várias sequências são de extrema beleza , com um apuro técnico capaz de impressionar até os dias hoje, dominados pela computação gráfica. Verdadeiras pinturas animadas surgem na tela, com texturas e cores que mesmo as animações produzidas atualmente dificilmente igualam (uma das cenas, inclusive, em que Gepeto procura Pinóquio em meio a uma tempestade, teve chuva real acrescentada à imagem). Custa a acreditar que essa produção é de 1940. Isso sem falar na trilha sonora, belíssima e que foi também vencedora do Oscar.

Todos esses elementos fariam de “Pinóquio” uma estória atemporal, mas há outro que talvez seja ainda mais relevante. O cerne da trama diz respeito à concretização dos sonhos, mesmo os quase impossíveis. Ao transformar-se em um garoto de verdade, Pinóquio se torna o personagem ícone da realização dos nossos mais profundos desejos, mesmo que para tanto tenhamos que trilhar, invariavelmente, caminhos dolorosos. A força de sua mensagem é tão intensa que ela reverbera ao longo das décadas, influenciando nitidamente tramas “modernas” como a de “Inteligência Artificial”, longa de Steven Spielberg. Uma fábula que não perderá jamais a sua força, soando cada vez mais contemporânea.


Cotação e nota: Obra-prima.

Abaixo escute "When You Wish Upon A Star"!


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