sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

72 Horas



Hitchcock aprovaria


O gênio Alfred Hitchcock talvez tenha sido praticamente o criador do gênero de filmes em que o protagonista é envolvido e perseguido devido a fatos que normalmente fogem ao seu controle (o conceito de “homem errado”). Em sua filmografia, com algumas variações, há vários exemplos deste tipo de trama, como “O Homem Que Sabia Demais”, cuja versão norte-americana é protagonizada por James Stewart, e “Intriga Internacional”, com o astro Cary Grant. Em todos eles, o velho Hitch levava sempre a dúvida ao público sobre o sucesso das empreitadas do personagem central, geralmente tentando provar sua inocência de algum crime que não cometeu ou procurando salvar alguém. Uma fórmula de sucesso eficiente que acabou sendo imitada por muitos cineastas ao longo dos anos (a própria série Bourne se vale desse conceito de “homem errado”). Todavia, na maioria dos casos os resultados são medíocres, sendo gerados longas-metragens esquecíveis que sequer chegam a manter a atenção do público durante a exibição.

“72 Horas”, atualmente em cartaz no circuitão brasileiro, é um herdeiro desta tradição e, felizmente, não cai na referida mediocridade. Dirigido por Paul Haggis, que iniciou sua carreira no cinema como roteirista (“Menina de Ouro” é um dos seus roteiros mais lembrados pelo grande público) e depois se aventurou na direção (“Crash” acabou levando o Oscar de melhor filme), o longa é uma refilmagem do francês “Pour Elle”, mostrando a saga de um professor universitário que, cansado de tentar provar a inocência de sua esposa acusada de assassinato pelos métodos legais, decide libertá-la adotando vias não ortodoxas, mais precisamente planejando sua fuga da prisão. Como de costume nos filmes de Haggis, o roteiro se desenrola com fluidez, envolvendo o espectador e tendo o trunfo de deixar envolta na dúvida a verdade sobre o crime que levou a esposa à prisão. Mas é importante destacar que Haggis vem evoluindo em outros aspectos. O longa possui uma ótima edição, responsável pelo ritmo constante, além de uma boa fotografia, com a utilização de alguns ângulos inusitados (uma certa sequência envolvendo os personagens centrais e um automóvel é particularmente interessante).

O protagonista, John Brennan, é interpretado com certa vontade por Russell Crowe (saindo da sua apatia de filmes recentes) e sua riqueza de detalhes é um dos pontos altos da projeção. Sua personalidade, inclusive, é um dos elementos responsáveis pela dúvida sobre a verdade do crime, já que, em uma interessante referência a “Dom Quixote”, percebemos que John pode ter criado um mundo idealizado onde as verdades não correspondem exatamente às do mundo real. Esta ligação entre a personalidade do personagem e o suspense engendrado daria orgulho ao mestre Hitchcock, o qual ofereceu uma verdadeira aula neste sentido com o seu soberbo “Um Corpo Que Cai” (Vertigo).

Por outro lado, nem tudo é perfeito. Haggis faz a trama descambar para os clichês em algumas de suas vertentes, como na relação entre Lara Brennan (Elizabeth Banks) e Luke (Ty Simpkins), filho do casal, deixando entrever aos mais atentos algumas possíveis resoluções finais. Haggis, por sinal, comumente possui esses tiques de previsibilidade que, uma vez não controlados por outra mão (como no caso de Clint Eastwood em “Menina de Ouro”), descamba para o inevitável clichê (foi assim no mencionado “Crash”). Há ainda algumas ligações mal explicadas na trama, meio que colocadas a fórceps para levar adiante a narrativa, resultando em soluções artificiais.

É bom que se diga que não vi o original francês, o qual, segundo comentários que pude ler por meio da internet, parece ser melhor que essa refilmagem. Contudo, mesmo sem tal parâmetro, posso afirmar que “72 Horas” prende a atenção e leva o espectador, em alguns momentos, a duvidar da sorte dos protagonistas, bem como das verdades oferecidas inicialmente pelo roteiro. Não é nenhuma obra-prima, longe disso, mas está longe de fazer feio e o mestre Alfred Hitchcock certamente veria com bons olhos este suspense que tem tudo para agradar aos fãs do gênero.


Cotação:

Nota: 8,0
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2 comentários:

Cristiano Contreiras disse...

Eu discordo de você, quase no texto todo. Porque achei esse filme bastante fraco, com uma fórmula "batida" e só Russel Crowe empolga.

Não sou fã de Haggis - acho "Menina de ouro" superestimado ao extremo, pois é um filme normal e o roteiro não tem nada de mais. Mas sim uma mesclagem de tudo que já tinhamos vistos em diversos filmes do gênero...e ainda levou aqueles Oscars todos? tsc.

"72 horas" ainda tem uma Elizabeth Banks insossa, a atriz não convence...

E o roteiro fraquinho só melhora, levemente, nas sequencias finais - quando Haggis tenta induzir uma ação desenfreada sem noção...

abraço!

Fábio Henrique Carmo disse...

Bem, Cristiano, mais um exemplo de que a arte é subjetiva. Eu gostei do filme. Está longe de ser um grande espetáculo, mas convence. Quanto a Haggis, na minha opinião ele é cheio de altos e baixos. Gosto muito de "Menina de Ouro" (na minha opinião está longe de ser superestimado), mas considero "Crash" um filme medíocre.

Abraço!