Ação Made In Brazil
O cinema brasileiro costuma receber fortes críticas pela enorme dificuldade que apresenta em lidar com o cinema de gênero. Nossas produções praticamente, e principalmente depois da chamada “retomada”, se limitam a apresentar comédias e filmes de caráter histórico e/ou crítica social, neste último caso com uma forte ênfase na violência urbana (vide “Cidade de Deus” e “Tropa de Elite”). A investida eu outras vertentes do cinema se limitam a espasmos como os longas de terror de um Zé do Caixão ou mesmo produções de caráter biográfico-popular como “2 Filhos de Francisco”. Parece faltar coragem aos produtores e diretores de se aventurarem em gêneros como aventura, ação ou suspense. E foi procurando suprir esta lacuna que diretor estreante João Daniel Tikhomiroff, egresso do ramo publicitário (já ganhou inúmeros prêmios no festival de publicidade de Cannes) realizou seu primeiro longa-metragem.
“Besouro” nos apresenta a história de um lendário capoeirista (interpretado no filme pelo novato Aílton Carmo, escolhido entre praticantes da arte) responsável por liderar uma revolta de negros durante os anos 20, quando estes ainda viviam em condições análogas a de escravos, sem direitos respeitados e com sua cultura ainda totalmente reprimida. A capoeira, por exemplo, era uma prática proibida por lei e reprimida com violência pelos coronéis, os quais meio que faziam a função da polícia nos rincões do país. Aqui, na versão romanceada levada à tela, o roteiro (escrito pelo próprio Tikhomiroff ao lado de Patrícia Andrade e baseado no livro “Feijoada no Paraíso”, de Marcos Carvalho) utiliza a velha ferramenta, normalmente presente nos filmes de artes-marciais, do “mestre” que ensina ao discípulo não apenas a luta em questão, mas também lições de honra, respeito, disciplina e coragem. E assim, no início, temos o pequeno protagonista ao lado de seu mentor, o mestre Alípio, o qual lhe diz que todo capoeirista deve escolher um nome pelo qual deverá ser lembrado. O pequeno não titubeia e escolhe “Besouro”. Logo em seguida com um corte que revela uma longa passagem no tempo, vemos que mestre Alípio é assassinado, o que levará o personagem-título a iniciar uma revolta contra a opressão em que ainda vivem os negros da região.
Todavia, talvez a inexperiência leve os autores a conduzir um filme que se pretende de ação/aventura de forma um tanto titubeante. Besouro mostra-se muito mais um personagem em dúvida com relação à sua “missão” do que um verdadeiro líder capaz de aglomerar seu povo em torno de um objetivo comum. Um herói que se mostra reflexivo demais, contemplativo em excesso. Suas divagações acabam sendo mais presentes que as sequências de ação. E o foco da trama ainda é desviado para um triângulo amoroso entre Besouro e seus amigos de infância Dinorá (Jéssica Barbosa) e Quero-Quero (Anderson Santos de Jesus) que pouco contribui para o desenrolar dos acontecimentos. Tikhomiroff já chegou a afirmar que um herói precisa de um amor, o que é uma assertiva boba e que talvez mostre o quanto o diretor poderia estar apegado a clichês na concepção de sua obra. Porque é isso que muitas vezes “Besouro” parece, uma sucessão de clichês aventureiros levados para um ambiente tupiniquim.
Entretanto, há aspectos muito positivos a serem ressaltados. O principal deles é a abordagem da cultura e mitologia afro-brasileiras. Estamos habituados a ver este tipo de abordagem em relação a culturas e elementos mitológicos estrangeiros, como nos casos clássicos de “O Senhor dos Anéis” e de vários filmes de artes-marciais como “Herói” e “O Clã das Adagas Voadoras”. Assim, torna-se desde logo interessante vermos a representação de divindades do candomblé como Exu, Ogum e Iansã, trabalho que é realizado de forma fluida e sem forçação de barra, de maneira perfeitamente natural. A questão técnica também é outro ponto a ser elogiado. Filmado em Igatu (BA), na Chapada Diamantina, a fotografia é primorosa, e a utilização de atores em sua maioria desconhecidos, alguns deles escolhidos entre capoeiristas locais, contribuem para a imersão do espectador na trama, emprestando-lhe maior veracidade. Os efeitos especiais também são competentes, principalmente se levarmos em conta a pouca familiaridade de nossos cineastas com esses recursos. E a vinda do coreógrafo Huen Chiu Ku, o mesmo de “Kill Bill” e “O Tigre e o Dragão”, para elaborar as cenas de luta foi extremamente bem-vinda. Essa importação de especialistas, muito frequente em Hollywood, deveria ser mais praticada pelos produtores nacionais, que não costumam fazê-lo não se sabe muito bem o porquê (nem mesmo os custos me parecem uma justificativa muito plausível). Também vale destaque a trilha sonora, com canção tema “Besouro, Cordão de Ouro” interpreta pela Nação Zumbi.
O resultado de “Besouro”, que antes de ser lançado teve uma boa divulgação na internet, com vídeos pipocando no Youtube (o que deve lhe garantir uma boa bilheteria) é uma obra irregular, mas que merece ser conferida pelo gostinho diferente que traz para o cinema nacional. Afinal, você lembra de ter visto algum filme de ação brasileiro nos últimos anos? A iniciativa é interessante e sair do marasmo é sempre uma boa ideia.
Cotação: * * * (três estrelas)
Nota: 7,0
“Besouro” nos apresenta a história de um lendário capoeirista (interpretado no filme pelo novato Aílton Carmo, escolhido entre praticantes da arte) responsável por liderar uma revolta de negros durante os anos 20, quando estes ainda viviam em condições análogas a de escravos, sem direitos respeitados e com sua cultura ainda totalmente reprimida. A capoeira, por exemplo, era uma prática proibida por lei e reprimida com violência pelos coronéis, os quais meio que faziam a função da polícia nos rincões do país. Aqui, na versão romanceada levada à tela, o roteiro (escrito pelo próprio Tikhomiroff ao lado de Patrícia Andrade e baseado no livro “Feijoada no Paraíso”, de Marcos Carvalho) utiliza a velha ferramenta, normalmente presente nos filmes de artes-marciais, do “mestre” que ensina ao discípulo não apenas a luta em questão, mas também lições de honra, respeito, disciplina e coragem. E assim, no início, temos o pequeno protagonista ao lado de seu mentor, o mestre Alípio, o qual lhe diz que todo capoeirista deve escolher um nome pelo qual deverá ser lembrado. O pequeno não titubeia e escolhe “Besouro”. Logo em seguida com um corte que revela uma longa passagem no tempo, vemos que mestre Alípio é assassinado, o que levará o personagem-título a iniciar uma revolta contra a opressão em que ainda vivem os negros da região.
Todavia, talvez a inexperiência leve os autores a conduzir um filme que se pretende de ação/aventura de forma um tanto titubeante. Besouro mostra-se muito mais um personagem em dúvida com relação à sua “missão” do que um verdadeiro líder capaz de aglomerar seu povo em torno de um objetivo comum. Um herói que se mostra reflexivo demais, contemplativo em excesso. Suas divagações acabam sendo mais presentes que as sequências de ação. E o foco da trama ainda é desviado para um triângulo amoroso entre Besouro e seus amigos de infância Dinorá (Jéssica Barbosa) e Quero-Quero (Anderson Santos de Jesus) que pouco contribui para o desenrolar dos acontecimentos. Tikhomiroff já chegou a afirmar que um herói precisa de um amor, o que é uma assertiva boba e que talvez mostre o quanto o diretor poderia estar apegado a clichês na concepção de sua obra. Porque é isso que muitas vezes “Besouro” parece, uma sucessão de clichês aventureiros levados para um ambiente tupiniquim.
Entretanto, há aspectos muito positivos a serem ressaltados. O principal deles é a abordagem da cultura e mitologia afro-brasileiras. Estamos habituados a ver este tipo de abordagem em relação a culturas e elementos mitológicos estrangeiros, como nos casos clássicos de “O Senhor dos Anéis” e de vários filmes de artes-marciais como “Herói” e “O Clã das Adagas Voadoras”. Assim, torna-se desde logo interessante vermos a representação de divindades do candomblé como Exu, Ogum e Iansã, trabalho que é realizado de forma fluida e sem forçação de barra, de maneira perfeitamente natural. A questão técnica também é outro ponto a ser elogiado. Filmado em Igatu (BA), na Chapada Diamantina, a fotografia é primorosa, e a utilização de atores em sua maioria desconhecidos, alguns deles escolhidos entre capoeiristas locais, contribuem para a imersão do espectador na trama, emprestando-lhe maior veracidade. Os efeitos especiais também são competentes, principalmente se levarmos em conta a pouca familiaridade de nossos cineastas com esses recursos. E a vinda do coreógrafo Huen Chiu Ku, o mesmo de “Kill Bill” e “O Tigre e o Dragão”, para elaborar as cenas de luta foi extremamente bem-vinda. Essa importação de especialistas, muito frequente em Hollywood, deveria ser mais praticada pelos produtores nacionais, que não costumam fazê-lo não se sabe muito bem o porquê (nem mesmo os custos me parecem uma justificativa muito plausível). Também vale destaque a trilha sonora, com canção tema “Besouro, Cordão de Ouro” interpreta pela Nação Zumbi.
O resultado de “Besouro”, que antes de ser lançado teve uma boa divulgação na internet, com vídeos pipocando no Youtube (o que deve lhe garantir uma boa bilheteria) é uma obra irregular, mas que merece ser conferida pelo gostinho diferente que traz para o cinema nacional. Afinal, você lembra de ter visto algum filme de ação brasileiro nos últimos anos? A iniciativa é interessante e sair do marasmo é sempre uma boa ideia.
Cotação: * * * (três estrelas)
Nota: 7,0
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