sexta-feira, 11 de julho de 2008

Wall - E


Wall – E


O melhor filme do ano!

A frase acima não é um exagero. Mesmo que ainda estejamos na metade de 2008, dificilmente Wall - E será superado (ou mesmo igualado) por qualquer outro longa, seja de animação ou não, em sua imensa qualidade. A estória do robozinho lixeiro, que passa seus dias compactando lixo em um planeta Terra totalmente inabitável é, simplesmente, mais uma obra-prima que os estúdios Pixar conseguiram produzir.

Gostaria até de rememorar aqui a minha resenha sobre Ratattouille, vencedor do mais recente Oscar de animação. Naquela oportunidade mencionei que é difícil qualificar um filme, de imediato, como uma obra-prima, já que muitas vezes podemos nos levar pela sensação do momento e cometer equívocos (em oportunidades posteriores, podemos perceber que o filme não era aquilo tudo, por exemplo). Sem medo de ser feliz, desafiei esta regra que costumo me impor e classifiquei o longa do ratinho Rémy como uma obra-prima. A realidade é que o estúdio criado por John Lasseter parece querer nos desafiar a cada lançamento. E me vejo de novo na situação de dar o braço a torcer e chegar à mesma conclusão a que cheguei na oportunidade anterior: estamos diante de uma obra-prima (sei que já coloquei essa afirmação mais acima, mas tornou-se inevitável repetir)! Andrew Stanton (do memorável Procurando Nemo) dirige este longa que parece ter saído da mente de um Charles Chaplin, com pitadas fortes do genial Stanley Kubrick, além de elementos típicos de Steven Spielberg. Sim, tudo isso está lá, não estou aumentando nada!

Wall – E (abreviação para Waste Allocation Load Lifter – Earth Class, que se traduz como Empilhadeira de Carga para Distribuição de Lixo – classe Terra) é um pequeno robô que tem como diretriz juntar e compactar o lixo gerado pelos humanos. O planeta já está desabitado (e inabitável também) há muito tempo (a trama se passa em 2700). Mesmo assim, ele continua cumprindo a sua função, muita embora com “peculiaridades” não programadas. Wally (é assim que o nome dele soa, afinal) costuma juntar em sua “residência” antigos objetos deixados para trás pelos humanos, mas com grande significado. Estão lá, entre as tralhas que guarda, um cubo mágico, um isqueiro de metal, uma batedeira... E também uma fita de vídeo (além do respectivo aparelho), uma cópia do clássico “Alô, Dolly!”, à qual assiste repetidas vezes, juntamente com sua baratinha de estimação. Wally parece destinado a amargar para sempre essa imensa solidão, testemunhando, com seus tristes e expressivos olhos de binóculo (observem como os traços do robô, com seus olhos grandes, pescoço comprido e “coração” luminoso, lembram o E.T. de Spielberg), o lugar lamentável em que se tornou o outrora belo planeta Terra, agora repleto de monumentos de lixo que lembram arranha-céus e pirâmides astecas.

Um belo dia, entretanto, uma nave deixa nas imediações onde vive Wally um robô feminino, Eva (qualquer semelhança com o Gênesis bíblico não é mera coincidência), dona de um “temperamento” mal-humorado, mas que logo cativa nosso solitário protagonista, o qual se utiliza do único modelo que possui de relacionamentos, aquele mostrado em “Alô, Dolly”, para conquistar a robozinha. Pausa para pensar: aqui vemos que a humanidade, a mesma responsável pela destruição do planeta, é a mesma que transmite, via arte, os mais belos sentimentos para o robô-lixeiro. O sentimento não surgiu do nada em seus circuitos, foi-lhe transmitido e adquirido por uma espécie que já esqueceu esses mesmos sentimentos. Wally é, naquele momento, mais humano que os humanos. Todavia, pouco depois Eva é retomada pela nave que a deixou e Wally encontra uma forma desesperada de segui-la (afinal, ele não pode mais “viver” sem ela). Este primeiro “ato” do filme é de um primor estético extraordinário. Com uma paleta de cores pálidas e escurecidas, temos a sensação de que Terra se transformou realmente em um lixão gigante. Ademais, a sensação de realidade é tremenda. Em várias seqüências, tinha a impressão de estar vendo um robô de verdade, e não um simulacro de animação. Também sublime o silêncio reinante. Podemos dizer que Wall – E, ao longo desta primeira metade, é praticamente um filme mudo. Não é a toa que lembra tanto os filmes de Chaplin, afinal Wally consegue uma expressividade tremenda apenas com seus olhos e movimentos de corpo. Marcante ainda a trilha sonora de Thomas Newman, que investe na melancolia, ressaltando a solidão do personagem (além da inesperada execução de uma mais do que famosa canção, na voz de um gênio do jazz que eu não vou falar qual é para não perder a graça!). Neste ato, à parte a trilha sonora, só escutamos praticamente os ruídos ambientes e dos robôs, ocasião em que o designer de som Bem Burtt dá um show (não é pra menos: ele é o criador dos efeitos sonoros de Star Wars).

Já a segunda metade, em que Wally e Eva se encontram na nave Axioma, controlada pela mega-corporação BNL, é extremamente ácida. Ela abriga o que restou da humanidade. Uma multidão de obesos devorados pelo consumismo e pelo sedentarismo. Sua inércia é tamanha que sequer são capazes de realizar atividades da mais banais, estando constantemente a se locomover através de cadeiras flutuantes. Desconhecem até mesmo a interação com os semelhantes, apenas se comunicando através das telas que cada uma dessas cadeiras possui. É neste passo que surgem as várias referências a Kubrick, principalmente ao clássico absoluto “2001 – Uma Odisséia no Espaço”. Aqueles que conhecem a obra de Kubrick facilmente irão perceber uma nova “versão” para o computador Hall 9000. E todos devem perceber a inserção de “Assim falava Zaratustra”, peça clássica de Richard Strauss que ficou mais conhecida como “o tema de 2001”. Há ainda seqüências lindas nessa segunda metade, como a que Wall-E percorre o espaço com um... Ah, não vou contar! Muito embora, nos seus últimos minutos, a trama caia um pouco em clichês de aventura e perseguição, isso não chega a prejudicar. Afinal, em alguns momentos, desde que bem colocados, até os clichês são bem-vindos.

E assim, a Pixar nos mostra como construir uma obra relevante. Transforma um robô num dos personagens mais humanos da história do cinema recente, contrapondo-o a uma humanidade totalmente desumanizada (já dizia o saudoso Renato Russo: “a humanidade é desumana”). Elabora um filme “para crianças”, mas que na realidade só será compreendido inteiramente por adultos. Aliás, já faz um tempinho que levar crianças para as salas de cinema se tornou apenas uma desculpa para pais, tios e avós poderem se deliciar com mais um longa da Pixar. Esse estúdio, vale dizer, merece todo louvor por jamais se acomodar. Depois de tantos sucessos de público e crítica, seria fácil repetir fórmulas vencedoras. Ao contrário, tem buscado inovar a cada projeto. É bom saber que o cinema americano, na melhor acepção do termo, sobrevive nas mentes dos criadores desta grande fábrica de sucessos. É bom saber que a Disney, a mega-corporação que hoje é a principal controladora do já mencionado estúdio, não está sufocando o Wally existente nessa equipe cheia de garra e idéias, que nos entrega a cada ano filmes belos e repletos de criatividade. Chaplin, esteja onde estiver, deve estar sorrindo com as peripécias de Wally. Kubrick deve estar refletindo sobre as idéias mostradas na tela. E Spielberg, claro, provavelmente irá assistir várias vezes a esta animação que possui tantas de suas “marcas”.

Não se atreva a perder.

Classificação: ***** (cinco estrelas)

Nota: 10,0

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6 comentários:

Carolini Rossa disse...

Parabéns pelo blog, Pimenta! Eu tenho que admitir que não sou muito fã de animações (talvez seja uma falha minha, ou simplesmente falta de hábito), mas depois de ver o trailer de Wall-E fui ao cinema esperando ver um grande filme. Só não esperava que fosse tão grande assim! E, de fato, é um filme "de criança" que só pode ser compreendido inteiramente por adultos. Aliás, o que eu mais vi no cinema foram adultos com a cara emocionada hahaha. Os analistas do Oscar dizem que Wall-E vai ganhar como Melhor Animação, isso se não receber uma indicação de Melhor Filme! E eu assino embaixo!

Boa sorte com o novo blog!
:)

Fábio Henrique Carmo disse...

Obrigado pelos incentivo, Carola!

Na verdade, muitas pessoas não são fãs de animação por acreditar que elas continuam apenas voltadas para o público infantil, mas a realidade não é mais bem essa, principalmente quando o selo Pixar está presente na produção. Acho difícil que Wall-E não leve o Oscar de animação do ano que vem e, é verdade, existe até a possibilidade dele ser indicado como melhor filme mesmo. :)

Abraço e beijo pra você!

Bauducco disse...

Eu sou muito afim de assistir esse filme, mas aqui em Blumenau colocaram ele num dos cinemas ruins (temos 6 salas, todas no shopping. A 1 e a 2 são excelentes, mas as outras 4 são ruins. Foi numa dessas ruins que caiu Wall E).

Que venha logo o DVD!

Fábio Henrique Carmo disse...

Ô Padre, mas é ruim assim para você preferir ver em DVD?

Bauducco disse...

É bem ruim sim, cara. Não como o finado Cine Carlitos, mas muito inferior às duas salas decentes. Outros filmes dá até pra encarar, mas uma animação acho que vai perder muito.

Fábio Henrique Carmo disse...

Aqui em Natal são 14 salas, 7 em um shopping, 7 em outro. Só há uma sala realmente ruim (a sala 2 do Moviecom). As outras são de razoáveis a ótimas. Mas mesmo a sala do 2 do Moviecom é melhor do que ver em casa.