Novela das 8
Um dos gêneros mais complicados para a arte cinematográfica, sem dúvida, é a biografia. Em verdade, o gênero já apresenta muitas complexidades na literatura devido ao fato notório de que é muito difícil sintetizar a vida de um ser humano em algumas páginas (mesmo que este “algumas” se transforme em centenas). E mais: procurar abordar todas as nuances da personalidade do biografado é algo praticamente impossível. Até porque somente cada indivíduo conhece realmente todos os meandros que habitam sua consciência, o que torna automaticamente toda tentativa de elucidá-la apenas uma cópia borrada da mesma. E, se na literatura a tarefa já não é das mais simples, quem dirá no cinema, onde a limitação de tempo gera ainda maiores obstáculos para que se atinja esse objetivo.
Para tornar a tarefa menos árdua, é comum que diretores e roteiristas optem por abordar apenas alguns ou mesmo apenas um dos vários aspetos que compõem a vida de um biografado. E a diretora Anne Fontaine, responsável por este “Coco Antes de Chanel”, não foge a este padrão. Afinal, ao longo dos 110 minutos de duração da película, praticamente só vemos a vida amorosa de Gabrielle Chanel, mais conhecida como “Coco”, a referência máxima de todos (as) os (as) estilistas que povoam o mundo da moda. Aliás, o próprio nome “Chanel” tornou-se sinônimo de moda e estilo. E talvez seja exatamente por isso que esta cinebiografia se torne tão frustrante. Quando imaginamos uma biografia de Coco Chanel logo nos vem à mente a figura de uma mulher forte, desafiando seu tempo e respectivas convenções. Claro que ela teve vida amorosa, mas não é por seus amores que nos interessamos. E este é o grande erro de Fontaine.
O roteiro (escrito pela própria diretora juntamente com Camille Fontaine) se arrasta contando as venturas e desventuras românticas de Coco (Audrey Tautou). Desde seu caso com Étienne Balsan (Benoît Poelvoorde), o qual serviu de pontapé para sua inserção na alta sociedade francesa, até seu outro romance com Boy Capel (Alessandro Nivola), que o filme dá entender ser uma espécie de “grande amor de sua vida”, um inglês sedutor de quem foi a “outra” durante muito tempo. E vamos assistindo a essa novela das 8 insossa, sendo que seu desenvolvimento profissional, suas inovações estilísticas, suas atitudes estranhas à sua época, são mostrados apenas circunstancialmente, meio que servindo tão somente, e estranhamente, de “pano de fundo” para os relacionamentos da protagonista. Ademais, alguns aspectos mais polêmicos da persona de Chanel são suavizados ou mesmo ignorados pelo longa, como sua ligação com o nazismo (que lhe rendeu o exílio e o ódio dos franceses). A Chanel que fica externada parece até mesmo uma marionete do destino ao afirmar que sempre soube que jamais casaria, meio que retirando essa circunstância do âmbito de sua vontade para atribuí-la àquela entidade abstrata (o que deve deixar muitas feministas de cabelos em pé).
Mesmo Audrey Tautou não parece especialmente interessante em sua interpretação. Falta alguma coisa, um brilho mais intenso, que torne o seu desempenho memorável. O que me faz lembrar imediatamente de Marion Cotillard e sua “Piaf”. Nesta não faltou intensidade, garra, vibração. Alguns podem afirmar que a personagem de Edith Piaf naturalmente dava margem a uma atuação mais intensa, pelo próprio fato de Piaf ser uma mulher bastante passional. Pode haver verdade nisso, mas também é verdade que se Chanel era uma pessoa tal como Tautou a representou, pode-se dizer que a mesma era uma mulher bem menos interessante do que se imagina.
Enfim, “Coco Antes de Chanel” resta bastante insatisfatório. Claro que tem uma perfeita reconstituição de época; figurinos (indicados ao Oscar) impecáveis (e tinha que ser mesmo, né?). Mas a excelência destes aspectos técnicos, dentro do cinema contemporâneo, nada mais é do que obrigatória. Ninguém mais vai ao cinema apenas para ver uma reconstituição caprichada ou uma boa trilha sonora (no caso, de Alexander Desplat). Ainda utilizando como comparação “Piaf – Um Hino ao Amor”, filme sobre outra grande mulher francesa, é interessante como o longa sobre a diva da música consegue emocionar e capturar a essência da personagem (mesmo que também seja omisso com relação a alguns aspectos mais polêmicos de sua vida), resultando em uma película diferenciada. Já este “Coco” consegue apenas igualar aquele tipo de dramaturgia que costumamos ver nas telenovelas. E telenovelas atuais, pois as velhas e ótimas telenovelas (parece que a rede dos Marinho esqueceu como fazê-las) estavam pelo menos um degrau acima desta pálida biografia.
Cotação:
Nota: 5,5
Para tornar a tarefa menos árdua, é comum que diretores e roteiristas optem por abordar apenas alguns ou mesmo apenas um dos vários aspetos que compõem a vida de um biografado. E a diretora Anne Fontaine, responsável por este “Coco Antes de Chanel”, não foge a este padrão. Afinal, ao longo dos 110 minutos de duração da película, praticamente só vemos a vida amorosa de Gabrielle Chanel, mais conhecida como “Coco”, a referência máxima de todos (as) os (as) estilistas que povoam o mundo da moda. Aliás, o próprio nome “Chanel” tornou-se sinônimo de moda e estilo. E talvez seja exatamente por isso que esta cinebiografia se torne tão frustrante. Quando imaginamos uma biografia de Coco Chanel logo nos vem à mente a figura de uma mulher forte, desafiando seu tempo e respectivas convenções. Claro que ela teve vida amorosa, mas não é por seus amores que nos interessamos. E este é o grande erro de Fontaine.
O roteiro (escrito pela própria diretora juntamente com Camille Fontaine) se arrasta contando as venturas e desventuras românticas de Coco (Audrey Tautou). Desde seu caso com Étienne Balsan (Benoît Poelvoorde), o qual serviu de pontapé para sua inserção na alta sociedade francesa, até seu outro romance com Boy Capel (Alessandro Nivola), que o filme dá entender ser uma espécie de “grande amor de sua vida”, um inglês sedutor de quem foi a “outra” durante muito tempo. E vamos assistindo a essa novela das 8 insossa, sendo que seu desenvolvimento profissional, suas inovações estilísticas, suas atitudes estranhas à sua época, são mostrados apenas circunstancialmente, meio que servindo tão somente, e estranhamente, de “pano de fundo” para os relacionamentos da protagonista. Ademais, alguns aspectos mais polêmicos da persona de Chanel são suavizados ou mesmo ignorados pelo longa, como sua ligação com o nazismo (que lhe rendeu o exílio e o ódio dos franceses). A Chanel que fica externada parece até mesmo uma marionete do destino ao afirmar que sempre soube que jamais casaria, meio que retirando essa circunstância do âmbito de sua vontade para atribuí-la àquela entidade abstrata (o que deve deixar muitas feministas de cabelos em pé).
Mesmo Audrey Tautou não parece especialmente interessante em sua interpretação. Falta alguma coisa, um brilho mais intenso, que torne o seu desempenho memorável. O que me faz lembrar imediatamente de Marion Cotillard e sua “Piaf”. Nesta não faltou intensidade, garra, vibração. Alguns podem afirmar que a personagem de Edith Piaf naturalmente dava margem a uma atuação mais intensa, pelo próprio fato de Piaf ser uma mulher bastante passional. Pode haver verdade nisso, mas também é verdade que se Chanel era uma pessoa tal como Tautou a representou, pode-se dizer que a mesma era uma mulher bem menos interessante do que se imagina.
Enfim, “Coco Antes de Chanel” resta bastante insatisfatório. Claro que tem uma perfeita reconstituição de época; figurinos (indicados ao Oscar) impecáveis (e tinha que ser mesmo, né?). Mas a excelência destes aspectos técnicos, dentro do cinema contemporâneo, nada mais é do que obrigatória. Ninguém mais vai ao cinema apenas para ver uma reconstituição caprichada ou uma boa trilha sonora (no caso, de Alexander Desplat). Ainda utilizando como comparação “Piaf – Um Hino ao Amor”, filme sobre outra grande mulher francesa, é interessante como o longa sobre a diva da música consegue emocionar e capturar a essência da personagem (mesmo que também seja omisso com relação a alguns aspectos mais polêmicos de sua vida), resultando em uma película diferenciada. Já este “Coco” consegue apenas igualar aquele tipo de dramaturgia que costumamos ver nas telenovelas. E telenovelas atuais, pois as velhas e ótimas telenovelas (parece que a rede dos Marinho esqueceu como fazê-las) estavam pelo menos um degrau acima desta pálida biografia.
Cotação:
Nota: 5,5
4 comentários:
Ah, eu confesso que não vi, mas tenho ele aqui já. Muitos amigos e uns blogueiros me recomendaram, ler teu texto me deixou com dúvidas e um tanto descrente do filme, que pena...mas, em breve vejo e comento contigo melhor!
e adoro tudo que Alexandre Desplat faz, pra mim o atual mestre da composição...os scores dele são intensos!
abraço!
Pois é, Cristiano, achei o filme bem chato! Há um outro bom momento, mas no geral o longa se arrasta! Aguardo suas impressões! Abraço!
Achei chato e desnecessário e ainda mais depois de ver a ótima minissérie Coco Chanel que foi lançada em DVD pela Versátil, este sim vale a pena.
Valeu pela dica, Rodrigo!
Postar um comentário