Jogos Vorazes
(The Hunger Games, 2012)
Ação cabeça
Exercício interessante poder avaliar um sucesso de bilheteria algum tempo depois do seu lançamento. É possível que, ao escrever sobre um filme logo quando da sua estreia nas salas de exibição, acabemos por nos deixar influenciar pelo “oba-oba”, seja por parte dos críticos ou mesmo do público. Claro que vendo o filme em video, podemos perder o impacto que uma obra pode causar na tela grande, ambiente mais adequado para uma apreciação cinematográfica, mas vê-lo longe de influências de opiniões na internet ou de amigos pode ser tão produtivo quanto. É o que aconteceu comigo ao assistir, após 6 meses de seu lançamento, este “Jogos Vorazes”, sucesso com Jennifer Lawrence, uma das novas queridinhas de Hollywood (merecidamente, é bom frisar).
Trata-se de mais uma franquia inaugurada no cinema, baseando-se na trilogia juvenil da escritora Suzanne Collins (que continua com os volumes “Em Chamas” e “A Esperança”) e que busca, obviamente, arrebatar mais um horda de fãs que sustentem suas prováveis continuações com muito lucro. Mas é importante destacar logo que “The Hunger Games” está longe de ser uma obra anencéfala, muito embora suas premissas não sejam exatamente originais. Alguns anos atrás, o conceito de jovens gladiadores que lutam entre si até a morte em um futuro próximo já havia sido sucesso no Japão com “Batalha Real”, livro de Koshun Takami posteriormente adaptado para mangá e cinema. Há ainda um certa pitada de “O Sobrevivente” (The Running Man ,1987), filme com Arnoldão então no auge de sua popularidade oitentista. É possível ainda apontar semelhanças com “1984”, de George Orwell, e “Admirável Mundo Novo”, escrito por Aldous Huxley. Entretanto, embora traga uma nítida influência destas obras predecessoras, é possível afirmar que “Jogos Vorazes” possui uma identidade própria que o distingue de livros e produções com temáticas semelhantes.
Nesta distopia dirigida por Gary Ross (um outro filme dele é “Seabiscuit – Alma de Herói”), temos uma América do Norte dividida em treze“regiões”, sendo elas a Capital e 12 distritos. Devido a uma revolução mal sucedida no passado, os doze distritos são obrigados anualmente a enviar dois jovens entre 12 e 18 anos (um homem e uma mulher) à Capital para a disputa de um reallity show macabro onde eles deverão se digladiar até restar apenas um vencedor. Katniss Everdeen (Lawrence), protagonista da trama, é a representante feminina do distrito 12. Ela se coloca como voluntária para livrar suas irmã menor do fardo, já que esta havia sido sorteada para a participação. Com ela irá também Peeta Mellark (Josh Hutcherson), um rapaz que parece nutrir por ela uma especial afeição, muito embora sua postura se apresente constantemente ambígua.
Talvez o ponto que mais salte aos olhos quando do início da narrativa é a semelhança que a personagem de Lawrence tem com seu outro papel em “Inverno da Alma” (Winter's Bone, 2010). Em ambos o casos, ela interpreta uma jovem forte que age de maneira corajosa a fim de proteger sua família. Uma heroína na defesa da mais forte e longeva das instituições sociais, portanto. Porém, se a abordagem de “Inverno da Alma” é mais intimista, aqui a história de Katniss serve como mote para reflexões acerca de controle social e espetáculo midiático, mormente a forma como este último serve à manutença do primeiro, agindo como um dos elementos importantes da ideologia que nos faz enxergar a realidade por meio de um “filtro” que nos deixe domesticados. É justamente esse status quo que será posto em xeque a partir das atitudes de Katniss, as quais acabam por levar os responsáveis pelos jogos a mudar suas regras. É inegável que o longa induz o espectador a vários questionamentos, principalmente ao aproveitar situações recorrentes nos reality shows do dia a dia, como as conhecidas associações momentâneas entre os concorrentes visando eliminar outros tantos oponentes.
Além de sua vertente questionadora, a película também impressiona por trazer a brutal violência entre adolescentes. Mesmo que não seja uma ideia exatamente original, como dito mais acima, ela não deixa de ser incômoda e o diretor Gary Ross se sai muito bem ao mostrar as agressões de maneira menos gráfica, mas sem que ela perca seu impacto. Para tanto, utilizou-se de uma edição elíptica que em outros filmes poderia ser vista como defeito, mas aqui se transforma em virtude. Ross também empreende à narrativa um ótimo ritmo, jamais tornando-se cansativa e que conta ainda com um elenco de peso. A escolha de Jennifer Lawrence para o papel foi perfeita. Ela é uma das jovens atrizes mais promissoras do cinema norte-americano atual, aliando à sua beleza um talento indiscutível. Impressionante como ela consegue nos fazer torcer por seu destino desde o início do filme. Josh Hutcherson também entrega boa atuação como o dúbio Peeta, emprestando veracidade a um personagem que nunca sabemos quais são suas verdadeiras intenções. Juntando-se a eles, ainda temos nomes como Woody Harrelson, Donald Shuterland e Stanley Tucci, todos com boa presença. O ponto fraco fica para presença de Lenny Kravitz como o figurinista Cinna, um do mentores de Katniss, personagem que merecia um intérprete melhor. Outros pontos negativos infelizmente ainda podem ser apontados. O desenrolar do roteiro (escrito pelo diretor Ross e Billy Ray juntamente com a própria autora dos livros ) por vezes se mostra previsível demais, sendo possível antecipar várias das suas ações. São muitas pistas que são deixadas e o espectador termina por antever muito do que está por vir. A película também possui uma trilha sonora esquecível, que nada contribui para o clima de tensão (mais marcante nos seus silêncios), além de uma caracterização um tanto infeliz para os moradores da Capital, normalmente com um visual bastante afetado., em alguns casos beirando o ridículo.
Por outro lado, é inegável que “Jogos Vorazes” é um filme que instiga e estimula o espectador à reflexão, tanto que mal sentimos seus 137 minutos passarem. Lembrando que o seu público é principalmente o jovem, uma franquia como esta se mostra muito bem-vinda, uma vez que possui um inegável viés político e contestador. Uma aventura cabeça que por vezes nos leva à impressão de ser na verdade uma crítica com verniz de filme de ação do que um longa de ação com nuances contestadoras. A diferença entre os dois casos não é pequena, como pode parecer, e ver que uma produção com tais conotações alcançou um grande êxito nas bilheterias é revigorante. Que venham logo os próximos episódios.
Nota: 8,5
6 comentários:
Tb gostei do filme, consegue transcender o simples entretenimento e causar alguma reflexão. Espero que a continuação mantenha a mesma pegada. Abraço.
Sinceramente, a premissa é muito boa, mas o filme (leia-se, adaptado do livro que não precisamos ler, afinal o filme é lançado para um público que não precisa ser necessariamente um fã) é extremamente fraco. Não me convenceu em momento algum, de voraz nada tem. Acredito que outras abordagem promovem uma reflexão mais significativa sobre o poder do reality-show, da questão de como a humanidade pode ser "condicionada" aos olhos da mídia que manipula e dita tudo, etc etc. Mas, o filme é fraco, muito mesmo. Ainda que bem executado na direção e com atuação forte de Lawrence (atriz de grande talento, verdade seja dita), o filme é até imaturo, teme, tem receios...parece ter medo de ser mais explícito por conta de uma censura, daí chega ao nível de um filme bem blockbuster e superficial. Ao meu ver, deveriam ter ousado no sangue (a violência aqui é necessária), poderia ter tido um maior aproveitamento nas situações dos personagens de Lawrence e Hutcherson - nossa, não aguentava mais as cenas repetitivas na "floresta". Não tem jeito, acho que o livro, de fato, seja mais detalhado e que a trama transpareça uma maior reflexão nesse "viés político e contestador" dito por você, Fábio. Não costumo ser exigente assim, mas não entendi a fama do filme "Jogos Vorazes", achei bem fraco mesmo...esperava bem mais, mais articulações, mais desenvolvimento...até a duração do filme me deixou entediado. Enfim, não gostei e não comprei a ideia...quero só ver como vão aproveitar isso nos próximos. abs!
Rapaz....tenho um preconceito absurdo com esse filme. Não consigo tirar ele do peito.
Adorei o seu título Para Ver Em Um Dia de Chuva, parece que verei o filme com chuva na rua. kkk
eu li a trilogia e gostei muito do primeiro filme. o livro é todo em primeira pessoa e foi legal o modo como fizeram pra mostrar algumas coisas que só estavam na cabeça da katniss.
também achei alguns recursos legais, como a cena inicial de luta na arena, em que o diretor tirou todo o som, pra diminuir o impacto.
que venha 'em chamas' e 'a esperança'!
confesso que tb tinha um preconceito com este filme por causa da semelhança com Crepusculo, o lance do triangulo amoroso destinado a jovens... mas o filme me surpreendeu, achei muito bom!
E sim, Fábio, eu estou de volta! kkk
http://monteolimpoblog.blogspot.com.br/
Estava no Shopping com alguns amigos e eles decidiram ver esse filme, eu como nunca tinha ouvido falar fui ver junto porém com o pé atrás, kkk
Não é que gostei? e olha que é muito difícil eu sair do cinema satisfeito, a última vez tinha sido em 2010 com AVATAR.
Agora é aguardar o próximo, EM CHAMAS? é isso né?
Abração
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