É tudo uma questão de expectativas
É comum a expectativa pela nova obra de um artista aumentar logo após um grande êxito em sua carreira. Não é assim apenas no cinema. Fico até imaginando o quanto a cantora Adele Adkins deve estar se sentindo pressionada a realizar um disco depois do estrondoso sucesso que foi o seu “21”, CD que arrebatou tanto o público quanto a crítica especializada. Afinal, não é fácil estar à altura do que as pessoas estão esperando, no caso, mais um disco cheio hits impactantes emoldurados por sua belíssima voz. Este excesso de expectativa, entretanto, pode, com frequência, gerar frustrações em quem espera uma nova obra-prima. É o mesmo que sucede com este “Para Roma, Com Amor”, o novo longa-metragem de um dos maiores cineastas vivos. Não bastasse já ocorrer uma certa ansiedade por se tratar de um filme de Woody Allen, o que por si só já causa burburinho no meio cinéfilo, ele ainda gerou mais questionamentos por se seguir a “Meia-Noite Em Paris”, um dos longas do diretor que, dentro da sua extensa filmografia, será no futuro lembrado como uma de suas obras mais destacadas.
Talvez alguns apontem “Para Roma Com Amor” como um fracasso de Allen exatamente devido a esta “expectativa”, mas designá-lo desta forma seria um tanto equivocado. É certo que esta sua nova produção está abaixo de “Meia-Noite Em Paris”, pois não possui a sua coesão, inspiração e inventividade. Nem mesmo usa Roma da maneira orgânica e apaixonada com que Woody usou Paris no seu sucesso recente, onde a Cidade Luz se apresenta também como um personagem da trama e não apenas uma paisagem turística que serve como um eventual pano de fundo para a narrativa e esta talvez seja, de fato, a maior desvantagem deste novo longa em relação ao último vencedor do Oscar de melhor roteiro original. Até mesmo porque a proposta de “To Rome With Love” seria de contar histórias que supostamente só poderiam se passar na Cidade Eterna, o que não condiz com o que é visto na tela. Na verdade, qualquer das várias tramas paralelas poderia se passar em vários outros lugares do mundo, o que acaba por se tornar possivelmente um demonstração de que Allen não conhece ou não tem uma afinidade tão grande com a cultura italiana como o tem com a francesa.
Tendo como referência o “Decamerão” (não é à toa que o primeiro título para a produção era “The Bop Decameron”), Woody nos apresenta quatro narrativas paralelas que não se comunicam, a não ser pelo fato de se passarem em Roma. Como é de se imaginar, elas se mostram oscilantes na sua qualidade (como normalmente acontece nesse tipo de filme), algumas despertando maior interesse, outras menos. A mais fraca delas é a protagonizada por Roberto Benigni, o qual interpreta um homem comum que de repente se vê caçado por jornalistas e paparazzi, numa óbvia alegoria a respeito das atuais celebridades instantâneas. Benigni até convence no papel, com bons momentos cômicos, mas a mencionada obviedade da estória soa mal diante do refinamento comum nos filmes de Allen. Do lado oposto, a trama que conta com Jesse Eisenberg, Ellen Page e Alec Baldwin é, sem dúvida, a melhor. Nela, vemos um arquiteto de meia-idade (Baldwin) encontrar um jovem estudante de arquitetura (Eisenberg) que está morando em Roma. Este acaba se apaixonando pela amiga (Page) de sua namorada que vai passar uns dias no apartamento onde o casal está morando, apesar dos alertas do recente amigo mais velho. Há algo na relação entre os dois que não irei revelar, pois aqueles que não viram o longa deixariam de ganhar com a surpresa. No entanto, este é o “conto” que mais transborda inteligência e reflexão, fazendo valer a ida ao cinema.
O mais cômico deles, entretanto, é o protagonizado pelo próprio Allen (voltando a atuar, já que desde “Scoop” ele não passava para a frente das câmeras), interpretando um produtor de óperas que, aposentado, jamais obteve sucesso junto à crítica. Em viagem para Roma, pois que sua filha noivou com um italiano esquerdista, ele conhece o pai do genro, um proprietário de funerária que possui uma autêntica voz de tenor. O problema é que ele canta bem apenas no chuveiro. É a deixa para o diretor investir no humor nonsense que também o caracterizou em obras anteriores, como no seu episódio de “Contos de Nova York” (New York Stories, 1989). A trama realmente traz cenas hilárias, aptas a agradar os mais diversos sensos de humor. Também apto a agradar o grande público é a narrativa do casal provinciano que está em Roma devido a uma oportunidade de trabalho do marido (Alessandro Tiberi). Uma vez no hotel, sua esposa (Alessandra Mastronardi) sai para procurar um salão de beleza, mas acaba se perdendo. É quando ocorre uma série de coincidências que levam o rapaz a fingir que a prostituta Anna (Penélope Cruz) é sua esposa, enquanto a mulher acaba se envolvendo com um galã italiano. Esta é a mais “apimentada” das narrativas e com maior destaque feminino (Mastronardi é uma atriz muito bonita e Cruz está sensualíssima, embora não tão brilhante como em "Vicky, Cristina, Barcelona") e possui aquele toque sofisticado com que Allen costuma tratar de sexo, longe de vulgaridades.
O espectador atento à carreira do diretor irá perceber os seus velhos temas mais uma vez abordados. Estão lá a sexualidade, as divergências políticas, o profissional frustrado que busca sucesso e realização pessoal, a crítica à cultura das celebridades (é bom lembrar que ele fez um filme apenas para tratar deste tema há alguns anos), as diferenças culturais, entre outros. Pena que desta vez o resultado não tenha sido tão primoroso, mesmo que trate as temáticas com leveza e nos faça rir em diversos momentos. Mas aí entramos de novo na tal questão das “expectativas”. Se você estiver esperando mais uma obra de excelência, certamente ficará frustrado(a). Contudo, se estiver esperando apenas rir de maneira inteligente, provavelmente sairá do cinema satisfeito(a). E, mesmo que aqui Roma tenha servido apenas como pano de fundo, dá uma baita vontade de visitar a Fontana de Trevi logo depois da sessão.
Cotação:
Nota: 8,0
6 comentários:
Como fã de cinema, que não gosta de Woody Allen, fiquei receoso de assistir esse filme.
Porém, tinha ficado com receio de Meia Noite em Paris e o resultado........foi ótimo.
Grande Fábio, como vai?
cara tenho lido ultimamente boas criticas dos filmes de Woody Allen, eu que também não sou muito fã dele após ler em algum lugar a critica de Meia Noite em Paris confesso que fiquei curioso em ver o filme, agora o mesmo ocorre após ler seu texto sobre o novo trabalho do diretor, vou providenciar os dois para esses dias de férias...
Grande abraço e parabéns pelo ótimo Texto.
Achar que Woody Allen havia voltado com tudo depois de "Meia-Noite em Paris" e manteria o mesmo nível qualitativo chega a ser ingênuo. Por que isso não ocorreu com Match Point (melhor que Meia-Noite) antes, então? Não faz muito sentido... Enfim, é sempre bom ver um diretor veterano em prática. Estou muito afim de ver Para Roma, Com Amor, que acabei perdendo no fim de semana de estreia por estar viajando.
Olá, Fábio. Confesso que não gostei muito do último filme, Meia Noite em Paris", de Woody Allen. E, acredite, estou com uma certa resistência quanto a este. No entanto, se tratando dele é importante que o veja. No mais um belo texto. Espero sentir a mesma vontade em visitar a Fontana de Trevi. Quem sabe! E, outra coisa: gostei, demasiadamente, do seu comentário no Sapere Aude a respeito do Título do Timão. Respeito as suas posições. É, realmente, difícil engolir, assim, uma equipe tão boa. Campeão do Brasileirão, Invicta na Libertadores, melhor defesa, melhor isso, melhor aquilo, ou seja, melhor em tudo. Não lembro bem a última grande conquista do seu Botafogo. Talvez a contração de Seedorf tenha sido um gol de placa. Esperemos, então. Entendo a sua insatisfação, Fábio. Mas é normal tudo isso. Nós já estamos acostumados. Nossa árvore esta carregada e hora de receber algumas pequenas pedradas. E, acredite, você não é o primeiro. Até a próxima irmão...
Maxwell,
A àrvore do Corithians pode estar com vários títulos recentes, mas há alguns frutos que ela jamais dará:
1) Sua violenta torcida, espécie de hoolingas brasileiros, jamais terá a simpatia de qualquer outra no Brasil e nem de quem não torce para time nenhum;
2) Sua diretoria, capitaneada por um presidente com laços de amizade com Ricardo Teixeira, nunca será idônea;
3) Seu estádio, construído com dinheiro público, será para sempre motivo de escárnio e mau exemplo de gestão do erário;
4) Títulos não significam bom futebol.O futebol do Corinthians é horroroso, e não é a conquista da Libertadores que vai mudar esse fato.O Chelsea vai ser campeão do mundo em dezembro, mas todos sabemos que o melhor time do mundo é o Barcelona.
Ah, e no dia que Corinthians ostentar na sua história uma coleção de craques tão grande quanto a do Bota, ou seja, no dia em que tiver mais ídolos que Rivelino, Sócrates e Ronalgordo, voltamos a conversar. Por que o Emerson, putz, bricadeira, né não?
Ah, e o filme do Woody é bom. Vale a conferida. Abraço!
Desculpe-me pelo sumiço. Estava enrolado com o lançamento de dois livros.Mas já estou de volta! Ainda não vi o novo Allen, mas juro que estou sem vontade.
O Falcão Maltês
Postar um comentário