terça-feira, 25 de junho de 2013

Eu Quero Esse Pôster # 23



Sim, o poster acima é interessante. Entretanto,  ainda no embalo do que vem acontecendo em nosso país, gostaria de tecer alguns comentários.

Tenho vista nas ruas a utilização da máscara do "Codinome V", do longa-metragem e HQ "V de Vingança" (V For Vendetta, 2006), de maneira indiscriminada. Ressalte-se que na internet estão pipocando informações que alguns grupos de extrema direita estão usando a máscara do personagem para esconder o rosto de agressores e vândalos. Não custa lembrar que a HQ foi escrita por Alan Moore durante os tempos sombrios do governo Tatcher na Inglaterra. É, antes de mais nada, uma reação ao conservadorismo. Interessante como a cultura pop por vezes começa a ser usada de maneira equivocada (ou maldosa mesmo) diante de situações atípicas como a que estamos vivendo como uma forma de trazer simpatizantes a causas duvidosas.

Ah, não, este blog não está se tornando um blog sobre política. É que o país está pegando fogo e não dá para ficar indiferente. Até a próxima!


sexta-feira, 21 de junho de 2013

Será que o Brasil realmente mudou?




Pausa no cinema.

Ontem, dia da manifestação que reuniu cerca de 20.000 pessoas aqui em Natal, eu trafegava com minha esposa em uma rua de Capim Macio, bairro de classe média alta situado na zona sul da cidade, quando avistamos um grupo de adolescentes saindo de um luxuoso edifício residencial. Estavam com os rostos pintados de verde e amarelo e carregavam a bandeira nacional. Entraram em uma picape Hillux e, obviamente, dirigiram-se ao local marcado para o protesto, situado em frente a dois shoppings centers também da zona sul.

O fato me chamou a atenção e me despertou para um dado que talvez esteja sendo pouco observado nas análises dos protestos que tomaram conta do país desde a semana passada. Este não é um movimento com participação predominante daqueles que realmente possuem legitimidade para reivindicar as bandeiras em discussão, mas de uma classe média que em muito foi beneficiada por políticas do atual governo.

Os jovens mencionados, provavelmente nunca andaram de ônibus em suas vidas, ou o fizeram apenas em situações de exceção, como de resto é o perfil de ampla parcela dos manifestantes. São jovens que, em geral, possuem planos de saúde e estudam em caras escolas privadas ou universidades respeitadas. Se observarmos bem, foram ao protesto porque, de uma hora para outra, tornou-se “cool” participar das manifestações. Estavam empunhando bandeiras não porque possuíssem uma real identificação com as causas levantadas, ou porque acreditassem no surgimento de novas forças sociais capazes de interferir no processo político. Foram ao manifesto para bater fotos de suas participações e, mais tarde ou via celular, postá-las no “Face”, Instagram ou enviá-las para os amigos. Não nos enganemos.

É assim que funcionam as relações dentro das redes sociais, as quais são de suma importância para a facilitação e surgimento de movimentos como o que estamos vivenciando, mas também são extremamente propícias a esvaziá-los de conteúdo, transformando-os tão somente em eventos semelhantes a shows, aptos a satisfazer a vaidade de uma juventude que não iria deixar seu individualismo de lado de uma hora para outra.

A verdade é que há uma tremenda perda de foco nos protestos. Tem-se a impressão que cada um vai a campo reivindicar a demanda que mais afeta seus próprios interesses, como pude perceber a partir da leitura de uma matéria do portal IG, onde uma senhora de 58 anos afirmava participar da manifestação porque esteve em Roma há pouco tempo e percebeu “o quanto é bom sair nas ruas sem medo”. Trocando em miúdos, não estava se solidarizando com os pleitos do Movimento Passe Livre (cujos líderes me parecem dotados de grade lucidez), mas simplesmente revindicando a respeito do que especificamente lhe incomoda.

Essa dispersão de objetivos, espécie de revolta generalizada contra a “situação”, apenas contribui para que alguns grupos, especialmente a mídia mais conservadora, procurem se aproveitar e tomar como seu um discurso democrático que não lhes é próprio, como é o caso exemplar da Rede Globo, a qual ontem retirou de sua grade de programação as suas novelas, onipresentes em praticamente todos os 365 dias do ano, para “realizar a cobertura dos protestos” (e sem comerciais durante mais de duas horas!). Logo ela, a Globo, que nos anos 80, durante a campanha “Diretas Já!”, escondia os gigantescos comícios que aconteciam nas grandes metrópoles brasileiras. A mesma rede que, semana passada mesmo, durante os primeiros protestos, atribuía genericamente a pecha de “vândalos” aos manifestantes do MPL. Arvorar-se como defensora da democracia e tentar tomar para si o título de “emissora que dá voz aos protestos” é, no mínimo, uma hipocrisia e já denota possíveis segundas intenções. Afinal, nada vindo da TV dos Marinho é´gratuito ou por acaso.

Este deveria ser um momento para uma real mudança no Brasil, onde o cidadão se tornasse o centro das políticas públicas. Entretanto, a perda de foco demonstrada ao longo das manifestações aliada a um oportunismo barato de parte da mídia, além de alguns partidos políticos, talvez façam com que estes dias, no futuro, sejam conhecidos apenas como a “revolta do busão”, sem implicâncias maiores do processo histórico nacional. E digo mais: sempre devemos ter receio quando manifestações começam reunir famílias inteiras, como se estivessem a participar de um ato “cívico” como as comemorações do 7 de setembro. Basta lembrar que algo semelhante aconteceu em 1964, pouco antes do golpe militar que nos legou tantas heranças negativas.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Star Trek - Além da Escuridão

A evolução da Jornada


Já faz quatro anos (como o tempo passa rápido) que J.J. Abrams, cineasta egresso da televisão que ficou famoso por séries como “Lost”, levou às telas o reboot da longeva série “Star Trek”, a qual, como já tive a oportunidade de mencionar na resenha publicada à época, nunca esteve entre minhas referências pop preferidas. De qualquer forma, Abrams fez um bom trabalho no reinício da franquia. Mesmo que o “Star Trek de 2009 não chegue à excelência, seu resultado foi bastante agradável, conferindo uma roupagem rejuvenescida aos personagens capaz de trazer novos adeptos ao universo concebido por Gene Rodenberry. E, para aqueles que duvidavam (como eu) que ninguém seria capaz de incorporar o Dr. Spock tão bem quanto Leonard Nimoy, Zachary Quinto calou a boca de todo mundo roubando todas as cenas em que aparecia, alguns degraus acima do Capitão Kirk de Chris Pine.

Com este “Além da Ecuridão”, Abrams demonstra que é, inegavelmente, o grande diretor do gênero ficção-científica atualmente em atividade no cinemão norte-americano, deixando para trás os seus ídolos, o aposentado George Lucas e Steven Spielberg, que vem se dedicando a outros gêneros nos últimos anos. Este novo episódio de Star Trek pode não ser tão bom quanto seu filme anterior, o ótimo “Super 8”, mas com certeza alcança uma evolução em relação ao reboot de 2009. O diretor, agora liberto da necessidade de apresentar os personagens ao um novo público, aprofunda-se em sua psicologia e nas relações entre eles, fazendo com que o longa, mais do que uma aventura, possa ser visto como uma história de amizade. E, vale dizer, amizade não só entre os dois protagonistas Kirk e Spock, mas também entre todos os integrantes da tripulação da nave Enterprise. Aqui, quase todos os membros da equipe possuem o seu momento de destaque e ações que ajudam no desenrolar da trama, fazendo o público enxerga-los não apenas como um amontoado de personagens, mas como uma verdadeira equipe, um time que joga de maneira coletiva e vence as adversidades e os inimigos.


Em entrevistas recentes, Abrams declarou que gostava de ver filmes sem muitas informações prévias sobre o roteiro e, de preferência, até sem ver trailers ou comerciais de TV, razão pela qual a produção desse novo episódio foi cercada de mistérios. Os próprios atores foram orientados a falar o mínimo possível sobre o longa durante as entrevistas. A precaução é justificável. Quanto menos se souber a respeito do verdadeiro papel que John Harrison (Benedict Cumberbatch) terá no desenvolvimento da trama, melhor. Basta apenas saber que ele é uma espécie de terrorista estelar cuja personalidade misteriosa será responsável por testar os limites da equipe da Enterprise. De qualquer forma, embora tenha alguns “solavancos” comuns aos filmes de ação, o roteiro (de Roberto Orci, Alex Kurtzman e Damon Lindelof ) é bem estruturado, valendo destaque para os diálogos, muito mais inteligentes, fluidos e divertidos (várias são as tiradas que funcionam ao longo da projeção) que os do primeiro da série, o qual era repleto de frases pouco inteligentes e clichês, principalmente em sua primeira metade.


Além disso, é inegável que Abrams filma como poucos, com enquadramentos perfeitos para as cenas de ação (que são muitas, diga-se de passagem) e ótima dinâmica e edição (vou ser repetitivo e perguntar: viu, Michael Bay?). Filmar cenas de ação é uma arte e, talvez, apenas James Cameron supere hoje J.J. Abrams neste aspecto. O ritmo da película é tão bom que nem percebemos que ele tem 2h12min de duração. Entretanto, um ponto em que Abrams precisa melhorar é trilha sonora de seus filmes, geralmente esquecíveis e que pouco acrescentam à narrativa. Por outro lado, demonstra mais uma vez muita competência na direção de atores, o que é difícil em longas repletos de ação. Embora Benedict Cumberbatch tenha boa presença na pele do vilão John Harrison, não considero seu desempenho tão excepcional como alardeado por aí em alguns veículos midiáticos. Neste ponto, os maiores méritos ficam mesmo com a dupla protagonista. Chris Pine evoluiu bastante em relação ao primeiro longa, trazendo um Capitão Kirk muito mais tridimensional e que vai além de um mero garoto-irresponsável-que-precisa-amadurecer. Entretanto, Zachary Quinto, mais uma vez, rouba mesmo a cena com o seu Dr. Spock. Ele praticamente domina todas as sequências em que aparece e definitivamente calou a boca de muitos que julgavam que o rapaz não estaria à altura de Nimoy.

É verdade que “Star Trek” não chega a ser uma coca-cola gelada no deserto. Não atinge um nível de excelência como se tem propagado por aí, como de resto nenhum filme de J.J. Abrams, até hoje, pode ser classificado como “excelente”. Entretanto, “Além da Escuridão” está um degrau acima do seu antecessor, representando uma evolução da jornada. Ao mesmo tempo em que traz ação quase ininterrupta, consegue, como já frisado, aprofundar-se na psique e nas relações entre os personagens, algo que decididamente não é fácil. Isso me faz lembrar que Abrams será o diretor de Star Wars episódio VII, trazendo boas expectativas para uma franquia já desgastada. Convenhamos, diante do seu trabalho com “Star Trek” (série da qual ele nem era fã), será difícil que ele venha a cometer equívocos como “A Ameaça Fantasma” na franquia do Darth Vader.


Cotação:



Nota: 8,5

domingo, 9 de junho de 2013

Quero Ver Novamente # 23


Dia desses, estava lendo "A Magia do Cinema", livro do famoso crítico norte-ameircano  Roger Ebert, quando me deparei com o seu belíssimo texto sobre "A Doce Vida", uma das obras-primas do mestre Federico Fellini. Ebert afirma que esse é o tipo de filme sobre o qual mudamos nossa apreciação ao longo do anos, enxergando o personagem de Marcello Mastroianni de maneira diferente com o avançar da idade. E é verdade. A vontade de revê-lo foi imediata, mas ainda estou devendo. Para matar um pouco a vontade, revi no Youtube a sua sequência mais famosa, quando Silvya, a estrela interpretada por Anita Ekberg, adentra a Fontana de Trevi e convida Marcello para se banhar. Uma das cenas mais famosas de todos os tempos que nunca cansamos de rever. Veja abaixo (o video está dublado em português). E viva Fellini!




segunda-feira, 3 de junho de 2013

Faroeste Caboclo

A música é melhor


“Ei, Fábio, tem alguma notícia sobre o filme de Faroeste Caboclo?”. Ao longo de vários anos (nem me lembro exatamente quantos) ouvi muitas vezes essa frase de um amigo que, como eu, adorava a Legião Urbana e costumava me perguntar sobre a possível adaptação da música do saudoso Renato Russo para as telas de cinema (abraço, Luciano!). Na maioria das oportunidades, eu simplesmente não tinha informação nenhuma para dar e imaginava que esse era um projeto que nunca iria sair do papel. Cheguei a pensar que se tratava apenas de um boato divulgado pelo global Video Show, no tempo em que este programa ainda divulgava algumas notícias de conteúdo interessante e não apenas abobrinhas e futilidades sobre novelas e celebridades (faz uma tempão, né?). Pois bem, o tempo passou, meu amigo nem mora mais em Natal (como andam as coisas em Curitiba?) e, enfim, a canção-quase-roteiro da Legião estreou nos cinemas.

Composta ainda nos anos 70, durante a fase “Trovador Solitário” de Renato Russo (saiba mais assistindo a “Somos Tão Jovens”), o qual desejava fazer algo no estilo das canções de Bob Dylan (uma de suas maiores influências), “Faroeste Caboclo” só passou a ser conhecida do grande público com o álbum “Que País é Este?”, lançado pela Legião Urbana em 1987. Com seus quase 10 minutos de duração, ninguém imaginava que ela iria se tornar um hit radiofônico, mas foi o que sucedeu. Parece algo impensável, mas, diante dos pedidos dos ouvintes, a faixa era reproduzida inteira nas rádios, uma proeza ainda maior em uma época em que para ouvir música de graça só mesmo escutando as emissoras, as quais detinham um poder enorme sobre o que deveria ou não fazer sucesso. Se lembrarmos que a música não possui refrão, é pontuada por palavrões e não tem nada de politicamente correta – no contexto de um país que ainda estava desacostumado com a liberdade de expressão – o feito se torna ainda mais impressionante. Entretanto, realmente se trata de uma composição ímpar na música brasileira, narrando a ascensão e queda de um retirante que se torna traficante na Capital da República sob um pano de fundo sociopolítico aguçado.


 A direção do longa coube a René Sampaio, o qual se mostra bem competente para um diretor estreante. Ele sabe manter o ritmo e tem ótimas referências imagéticas, como o clímax no duelo entre João do Santo Cristo (Fabrício Boliveira) e o traficante Jeremias (Felipe Abib), onde usa das marcas do genial Sergio Leone, contrapondo closes e planos abertos para estabelecer a tensão do momento. Há também muito do estilo tarantinesco, com uma certa dose de hiperviolência que acaba soando pertinente diante do universo de criminalidade abordado. Contudo, o roteiro (de Marcos Bernstein, o mesmo de “Somos Tão Jovens”, e Victor Atherino, com participação de Paulo Lins, o autor de “Cidade de Deus”) realiza alterações no texto original que me incomodaram bastante.

Primeiramente, nota-se que a adaptação quase eliminou da narrativa as origens de João do Santo Cristo. Não sabemos quase nada sobre sua infância, restando apenas as informações de que vivia na miséria e o pai foi morto a tiros por um policial. Só. Seus sonhos e expectativas com uma vida diferente da que levava, tão bem delineados por Renato em sua letra, são podados do enredo do longa, o que é uma pena. Afinal, a trama concebida pelo músico é uma versão pop da velha história do retirante que busca na cidade grande uma vida melhor, onde suas aspirações podem se tornar realidade. A partir desta concepção, o fim de João, em um duelo televisionado, torna-se ainda mais trágico e irônico. Algo semelhante ao fim de Zé do Burro em “O Pagador de Promessas”, a peça de Dias Gomes mais tarde transformada em filme vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes por Anselmo Duarte, o qual sempre me pareceu ser uma das fontes em que Renato bebeu para conceber o texto de “Faroeste”. É a tragédia do homem simples transformada em espetáculo midiático. Ao retirar de João o seu passado e sua ingenuidade, uma vez que no roteiro da película ele não vai a Brasília para “falar com o presidente”, Sampaio praticamente o coloca tão somente como um bandido comum, alguém que entrou na criminalidade por mera ambição e oportunidade, empobrecendo o personagem. É possível imaginar que a opção de diretor e roteiristas foi atribuir um tom menos fantástico que desfecho original, este talvez com um efeito poético condizente apenas com a linguagem musical e que causaria estranheza nas telas. Contudo, pensar de tal forma apenas resulta em estabelecer limites artificiais à linguagem do cinema, fronteiras estas que na realidade não existem (já imaginaram se Fellini ficasse adstrito a “padrões”?).


Se João não se torna apenas mais um lugar-comum entre os criminosos de filmes de gangster, isso se deve em muito à atuação de Fabrício Boliveira. Ele está ótimo, conferindo uma aura introspectiva ao emigrante e, tendo em vista que se trata de um ator negro, contribuindo para que a questão racial se torne ainda mais forte no filme do que na música (e isso é um elogio), já que o tema étnico é apenas pincelado por Renato na sua letra. Aliás, não só Boliveira, mas todo o elenco se apresenta com garra e competência. Ísis Valverde encarna Maria Lúcia com alma, mostrando que pode ir muito além dos papeis de “periguetes” que fizeram a sua fama recentemente na TV. Além disso, temos as boas participações de Antônio Calloni, como um policial corrupto, e Marcos Paulo como o senador pai de Maria Lúcia, em uma de suas últimas aparições nas telas, seja do cinema ou da televisão. Somente Felipe Abib, no papel de Jeremias, destoa do restante do elenco, trazendo alguns excessos a um tipo que tem muito do Tony Montana de “Scarface” (1983, de Brian De Palma).

Nos créditos finais, quando finalmente ouvimos a canção adaptada, a impressão que tive foi a de que Renato Russo conseguiu contar melhor a história de João de Santo Cristo em 10 minutos de música e letra do que René Sampaio em 105 minutos de projeção. Advirto que não estou querendo ser irônico ou afirmando que o longa-metragem seja uma droga, mas, se sobra verve ao elenco e técnica na direção, faltou abordar com mais apuro a riqueza de um personagem que encarna várias facetas do povo brasileiro. Depois de tantos anos de espera, o gostinho de “poderia ser melhor” acabou deixando um certo incômodo.


Cotação:



Nota: 7,5