quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Tragédia em Santa Catarina


Amigos e visitantes do Cinema com Pimenta,

Mais uma vez abro uma exceção neste espaço para deixar de falar sobre cinema. Nestes últimos dias, acredito que todos vocês devem estar acompanhando através da mídia (seja TV, internet, revistas ou jornais) a situação caótica em que se encontra Santa Catarina, principalmente o Vale do Itajaí. Pois bem, não é apenas porque tenho amigos que moram nessa região (até porque esses amigos, graças a Deus, não perderam entes queridos ou seus bens na enchurrada), mas principalmente porque devemos lembrar que somos todos brasileiros e, antes de tudo, seres humanos, que escrevo aqui este apelo para aqueles que possam e desejem contribuir com o auxílio às vítimas naquele Estado tão famoso por suas lindas praias e mulheres idem, mas que agora precisa de nossa ajuda. Abaixo, segue o número da conta bancária aberta para as contribuições:

Banco do Brasil
Agência: 0095-7
C/C: 400.000-5
(PMB – Calamidade Pública)

Também vi no Jornal Nacional de hoje que todas as Escolas técnicas do país estarão recebendo doações para os flagelados da enchente.

Um abraço a todos!

sábado, 22 de novembro de 2008

[Rec]


Romero + A Bruxa de Blair

Desde que George A. Romero criou o chamado “filme de zumbis”, ao longo dos anos acompanhamos várias e várias novas versões da temática nas telas de cinema. O próprio Romero retomou o mote em diversas oportunidades, além de outros diretores, sempre procurando colocar em seus longas um contexto de acentuada crítica social. [Rec], longa espanhol atualmente em exibição nos cinemas brasileiros, se apresenta como mais um dos herdeiros desta tradição, muito embora não se possa designar exatamente suas ameaças como “zumbis”.

Seus humanos-monstros lembram muito aqueles de “Extermínio”, produção inglesa dirigida por Danny Boyle que se tornou cult (e também mais um dos herdeiros da tradição dos filmes de zumbi). Trata-se de uma variação moderna, em que pessoas são transformadas em monstros devido a vírus, bactérias ou outras espécies de microorganismos alterados em laboratório. Outro aspecto bem presente nos filmes do gênero que também se faz presente neste é o clima claustrofóbico, de confinamento. Quase toda a ação se passa dentro de um edifício residencial, assim como em “Madrugada do Mortos”, de Zack Snyder, quase tudo acontece dentro de um shopping center. Interessante notar que [Rec] também se mostra sucessor do gênero “realidade”, o qual teve em “A Bruxa de Blair” um de seus precursores (e recentemente representado por “Cloverfield”). Afinal, [Rec] mostra a gravação de um programa de TV chamado “Enquanto Você Dorme”, onde sua apresentadora, Ângela Vidal (Manuela Velasco, gatinha espanhola), mostra o trabalho daqueles que varam as madrugadas, tal como sugere o título. Acompanhada do cinegrafista Pablo (o próprio diretor de fotografia Pablo Rosso, que nunca aparece em cena), ela acompanha o corpo de bombeiros em uma chamada durante a madrugada. Em um condomínio residencial, uma senhora idosa está causando pânico entre os vizinhos com seus gritos assustadores. O que parecia uma ocorrência fácil, apenas uma mulher com desequilíbrio mental, vai se transformando, aos poucos, em uma situação escabrosa, a qual colocará em risco a vida de todos os presentes no edifício.

Esse estilo “realidade” é sempre uma via de mão dupla. Se, por um lado, acaba passando ao espectador a sensação de que aqueles fatos estão realmente acontecendo, por outro necessita eliminar certos elementos cinematográficos que podem ser muito úteis na construção de um clima macabro ou de suspense. O mais notável destes ingredientes extirpados é a trilha sonora. Ultimamente este importante recurso vem sendo utilizado de forma sofrível pelas produções de terror. Os diretores do gênero possuem uma tendência à histeria, colocando o volume no máximo, no rumo “quanto mais invasiva a trilha melhor”. Contudo, se bem utilizada, a trilha pode ser um ótimo elemento para compor a tensão, como bem mostrava o mestre Alfred Hitchcock em suas inesquecíveis obras (alguém é capaz de imaginar a famosa cena do chuveiro em “Psicose” sem a sua famosíssima trilha?). O resultado naturalístico obtido pelo estilo “Bruxa de Blair” de filmar soa sempre, pelo menos para mim, um tanto “meio-termo”: falta alguma coisa.

Outra característica marcante do dito estilo deixa sua marca em “[Rec]”. Como era de se esperar, a câmera trêmula na mão percorre toda a projeção e talvez seja o melhor do longa. A câmera, não é exagero afirmar, torna-se o principal personagem de toda a narrativa, da qual só vemos os acontecimentos enquanto o aparelho de Pablo está ligado. E isso é algo que realmente valoriza este produto. Quem costuma ler minhas resenhas já deve saber o quanto eu admiro o que se pode chamar de “cinema total”, ou seja, o cinema que utiliza a imagem como base para todo o desenvolvimento da ação, relegando o texto a um plano menor. Cinema é imagem e, mais uma vez repito, costumo me irritar com diretores que confundem a arte cinematográfica com o teatro (há grandes filmes “teatrais”, mas isso não significa que devamos aceitá-los como regra). E, no presente caso, os diretores Paco Plaza e Jaume Balagueró foram muito felizes em fazer da imagem o principal elemento de sua narrativa. E eles também não esqueceram de incluir bons momentos de crítica social, fazendo lembrar os longas de Romero.

Com relação às atuações,vale dizer que Manuela Velasco se mostrou bastante convincente no papel, muito embora não se possa afirmar se ela está interpretando ou apenas representando a si mesma (ela é estrela na TV espanhola). Os demais não têm muito a fazer, a não ser Pablo, o câmera-man, do qual, como já mencionado, só ouvimos a sua voz.

É certo que o filme fez muito sucesso na Espanha, tanto que Hollywood (como sempre) já comprou a idéia e levou adiante sua adaptação, que deve estrear em breve em terras tupiniquins com o nome “Quarentena”. Mas, fico com a minha afirmação mais acima: o terror-suspense-realidade gera sempre a impressão de que algo está faltando. Esperava levar mais sustos...

Obs. Não é que em alguns momentos o filme me lembrou “Ensaio Sobre a Cegueira”? Imagino que os mais atentos vão perceber o porquê.

Cotação: *** (três estrelas)
Nota: 7,5



terça-feira, 18 de novembro de 2008

Satisfação e revolta (parte III)


Uma notícia que me trouxe satisfação e revolta: "Vicky Cristina Barcelona", o mais novo exemplar do gênio Woody Allen teve uma excelente estréia em terras brasileiras neste último fim de semana. O filme arrecadou R$ 1,09 milhão em seus três primeiros dias de exibição, ficando em segundo lugar na arrecadação (perdeu apenas para 007, que já está chegando aos R$ 10 milhões arrecadados) e obteve, ainda, a melhor média de público por sala. Nunca imaginei que um filme de Woody Allen fosse se sair tão bem, mesmo com o elenco contando com nomes pesos-pesados como Penélope Cruz, Scarlett Jahansson e Javier Bardem. O longa, que está sendo considerado um dos mais sensuais da carreira de Allen, trata das relações amorosas estabelecidas entre duas turistas americanas (Rebecca Hall e Johansson) com um pintor (Bardem) e sua desvairada esposa (Penélope). Vale dizer que ele também vem recebendo elogios unânimes da crítica.

Mas, peraê, e a revolta do título deste post? A revolta fica por conta novamente dos exibidores de Natal, os quais mais uma vez engoliram mosca (como já havia acontecido em "Ensaio Sobre a Cegueira") e nós é que ficamos a ver navios... Paciência, é preciso ter paciência...

domingo, 16 de novembro de 2008

Recorde para Bond

007 - Quantum of Solace chegou neste fim de semana aos EUA e obteve a sua maior estréia em todos os tempos. Foram US$ 70,3 milhões, uma das maiores arrecadações para o mês de novembro. Só para se ter uma idéia, a aventura anterior de Bond, "Cassino Royale", obteve 40 milhões de dólares com uma estréia também em novembro. É, parece que os novos ares assumidos pela série fizeram muito bem à mais longeva franquia do cinema.

sábado, 15 de novembro de 2008

Clint novamente

Recentemente postei aqui no blog uma notícia sobre "Gran Torino" o próximo filme de Clint Eastwood. Pois bem, este ainda nem teve sua estréia e o senhor de 78 anos já está programando o próximo. Trata-se de um suspense ao estilo "O Sexto Sentido", segundo informações publicadas pela Variety. A Dreamworks, ainda antes da cisão com a Paramount, adquiriu os direitos sobre o roteiro de Peter Morgan intitulado "The Hereafter". E não é só: ele também estará no filme "Remembering Mark Twain", sobre a vida do famoso escritor de "As Aventuras de Tom Sawyer", não apenas dirigindo, mas também atuando. Esse homem é um exemplo! Tem toda a minha admiração.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Filmes Para Ver Antes de Morrer


Aproveito a estréia do novo 007 para recomendar a todos (mesmo para aqueles que não são fãs ou não são muito chegados em filmes de ação) a aventura anterior do famoso espião. Um clássico instantâneo! Abaixo segue a resenha que escrevi à época de seu lançamento no circuito brasileiro.


007 – Cassino Royale

Senhoras e Senhores: reservem seus lugares no cinema! As cartas estão na mesa!

Quem nunca assistiu a um filme de 007? Ao longo dos últimos quarenta e poucos anos, é bastante difícil encontrar alguém, mesmo com um mínimo de interesse por cinema, que nunca tenha assistido a pelo menos uma das aventuras do agente secreto britânico Bond, James Bond! Sua imagem se tornou um ícone pop, uma referência de masculinidade, o protótipo do macho: inteligente, frio, irônico, boa pinta, conquistador, humor refinado... Além de proteger a Inglaterra e o mundo dos mais inescrupulosos vilões.

Apesar de todo o peso que carrega por, como já disse, se tratar de uma referência pop, o personagem vinha sofrendo um enorme desgaste nos últimos anos. Após uma boa recuperação nos longas “Goldeneye” e “O Amanhã Nunca Morre”, estrelados por Pierce Brosnan, os produtores pareceram perder o controle ao exagerar na dose de parafernália “modernosa” e de situações inverossímeis colocadas no roteiro, até carros invisíveis surgiram (putz!). Assim, se “O Mundo Não é o Bastante” já se mostrou um fracasso, o episódio seguinte, “Um Novo Dia Para Morrer” se tornou um verdadeiro desastre, quase matando a franquia.

Mostrou-se, portanto, premente a necessidade de realizar uma renovação do personagem, adequando-o aos novos tempos. A guerra fria acabou. Ademais, a idéia de vilões megalomaníacos com vontade de dominar ou destruir o mundo já soa bastante absurda e também datada.

Os produtores tiveram, então, uma feliz iniciativa. Decidiram “zerar” a série, algo semelhante ao que foi feito com o personagem do Homem Morcego em Batman Begins. O personagem de Bond poderia, além disso, ser mostrado de uma forma mais fria, seca e direta, fazendo jus aos dois zeros que o identificam e que significam “permissão para matar”. Nos dias de hoje, o público já aceita a idéia de um herói valer-se de métodos violentos para atingir seus objetivos, vez que a agressividade muitas vezes se torna elemento de sobrevivência em um mundo tão individualista e frio.

E é sob esta nova perspectiva que nos é apresentado “Cassino Royale”, o 21º longa metragem do agente 007. Desde o início da projeção já notamos algumas diferenças. Com a imagem em preto e branco, vemos Bond assassinando friamente dois homens, feitos que o levariam, como mostrado logo após a seqüência de créditos, a adquirir o status de “00”. Até mesmo o famoso tiro em direção ao espectador, presente em todos os seus filmes, aparece renovado aqui (quem assistir perceberá de imediato a diferença). E mais: a referida seqüência de créditos mostra-se ainda inovadora. Foram-se as silhuetas de belas mulheres nuas ou seminuas e entraram animações do agente lutando contra inimigos cercados por elementos de jogos de cartas (ases, valetes, paus, damas etc.), bem de acordo com o desenvolvimento da trama (de altíssima qualidade esses créditos, com canção de Chris Cornell).

O filme, uma adaptação do primeiro romance de Ian Fleming com o personagem, dirigido por Martin Campbell (o mesmo de Goldeneye) narra toda a inexperiência, arrogância e inconseqüência de Bond (Daniel Craig) quando novato, características que o levam a cometer vários erros, os quais acabam servindo de fio condutor para a trama. Seu comportamento impulsivo deixa de cabelos em pé sua chefe, M (Jude Dench). E esse ainda inexperiente Bond terá de enfrentar um vilão adequado aos novos tempos: Le Chiffre (muito bem interpretado, sem tiques, pelo dinamarquês Mads Mikkelsen), um financiador do terrorismo e de grupos paramilitares ao redor do mundo. Um vilão sem ideologias ou convicções a defender, diga-se de passagem, tendo como único objetivo ganhar dinheiro (vale aqui mencionar que isso é metáfora direta do grande vilão dos dias atuais: o capital despersonalizado, sem pátria, aliado a indivíduos inescrupulosos).

A forma encontrada pelo serviço secreto britânico para desarticular a quadrilha seria Bond vencer Le Chiffre em um jogo de pôquer em Cassino Royale, casa de jogos que dá o título à produção. E o dinheiro que Bond necessitará será fornecido por Vesper Lynd, uma belíssima contadora do governo interpretada pela Deusa (assim mesmo, com letra maiúscula) Eva Green. Aqui cabe um aparte: a renovação da franquia foi tão abrangente que não se restringiu apenas à trama, mas até mesmo às Bond Gilrs. Se Caterina Murino ainda lembra o velho estilo, surgindo de biquíni montada em um cavalo (Aaaaaahhh, Caterina...), Eva Green imprime uma total renovação ao conceito das amantes de Bond. Culta, inteligente, dona de uma sensualidade diferenciada, invulgar, com uma beleza profunda que parece diferenciá-la dos demais simples mortais, Vesper Lynd está longe, muito longe, de ser apenas um corpo esguio, com uma bunda proeminente ou seios fartos. Ao mesmo tempo lindíssima e de personalidade forte, logo compreendemos porque Bond deixaria todas as outras mulheres para ter apenas Vesper. Os diálogos entre os dois são ótimos e muito mais interessantes do que outros que rolam em vários filmes românticos por aí. Aliás, o filme tem uma das cenas mais bonitas que já vi em filmes de ação, disputando lugar até com outras de filmes direcionados aos apaixonados (não quero contar para não perder a graça, mas acho que todos perceberão qual é ao assistirem).

Mas todo esse processo de amadurecimento dos personagens e das tramas é acompanhado por um detalhe muito importante em filmes de 007: ação vertiginosa!!!!! Em nenhum momento o roteiro (um dos autores é Paul Haggis, de “Crash” e “Menina de Ouro”) perde o ritmo. E detalhe: um dos pontos altos é o jogo de pôquer no Cassino Royale. Alguns críticos andam dizendo por aí que quem não entende de cartas pode se sentir entediado. Que bobagem! Eu mesmo, confesso, não entendo nada de baralho e fiquei totalmente vidrado nas seqüências de jogo. E a primeira grande seqüência de ação da produção, em que Bond persegue um traficante de armas em Madagascar, é brilhante. Uma perseguição a pé muito superior a qualquer racha automobilístico que se vê em outros filmes. Ah, existe ainda uma cena de tortura que vai fazer todo mundo se remexer na cadeira (ou melhor, as meninas nem tanto), além de, por mais paradoxal que possa parecer, gerar boas gargalhadas.

E, por fim, uma última questão deve ser abordada: Daniel Craig. Muitos questionaram sua escolha. Não era possível que escolhessem um Bond loiro e, ainda por cima, feio. Mas é necessário dar a mão à palmatória: o cara arrebenta. Criou um 007 que reúne características de vários outros e, ao mesmo tempo, surge totalmente novo. Um Bond frio, irônico, mas que ao mesmo tempo, sabe demonstrar seus sentimentos quando necessário. Só achei “bombado” demais, mas isso é de menor importância. No fim, saí com a sensação de que Craig é o melhor James Bond desde Sean Connery. Os produtores foram felizes na decisão e os críticos queimaram a língua.

Cassino Royale, desta forma, dá uma grande e bem-vinda repaginada na franquia. Deverá, sem dúvida alguma, conquistar novos fãs para a série, além de reaproximar os antigos. Ah, se todos os filmes blockbusters seguissem sempre este padrão qualidade... Vida longa ao novo 007 e que venha o próximo (segundo algumas informações que circulam pela net, ele já está previsto para novembro de 2008). Vale à pena conferir, mesmo para os que não são fãs da série.

Resenha escrita por Carmo. Fábio Carmo.

Cotação: ***** (cinco estrelas).
Nota: 10,00.

domingo, 9 de novembro de 2008

007 - Quantum Of Solace

Em time que está ganhando...

Em 2006, Martin Campbell dirigiu Cassino Royale, longa que promoveu uma revolução na franquia mais longeva do cinema. James Bond, o famoso agente 007, agora interpretado por Daniel Craig, uma escolha que a princípio tinha se mostrado estranha (um Bond louro?), adquiria novas características que o tornariam mais adequado ao século XXI. Bond, ao mesmo tempo em que se mostrava mais frio, fechado, duro, também passou a carregar uma aura mais humana e sensível. Apaixonou-se pela espiã Vésper Lynd (interpretada pela belíssima Eva Green) e, de quebra, ainda contou com um novo estilo de narrativa e ação, bastante influenciadas pela franquia “Bourne”, mais realistas e diretas. Empolgante, inteligente, sem deixar de lado o bom humor em momentos muito bem escolhidos, “Cassino Royale” se transformou em um dos melhores filmes de ação dos últimos anos, um clássico instantâneo que com certeza atraiu uma nova geração de fãs para o personagem.

Sucesso de público e crítica, a idéia de mais um episódio para a série surgiu quase que imediatamente. A premissa era de justamente retomar e até aprofundar os elementos que fizeram o sucesso do anterior. “Quantum Of Solace” (não sei o porquê de manter o título em inglês) é o resultado dessa nova empreitada, mas, embora desenvolva algumas nuances apresentadas na aventura anterior, ele se mostra um tanto abaixo do genial “Cassino Royale”.

O principal elemento desabonador deste episódio é o roteiro (escrito por Paul Haggis, Robert Wade e Neal Purvis). Confuso, traz um excesso de informações e um certo exagero em estabelecer links com o filme antecedente. O número de informações dependentes de um prévio conhecimento por parte do espectador dos acontecimentos pretéritos é tão grande que desaconselho aqueles que não viram “Cassino” a assistirem a este “Quantum”. A trama começa praticamente do fim da anterior, com um Bond sedento de vingança, procurando os responsáveis pela morte de Vésper Lynd. Nesse rumo, acaba esbarrando em uma organização criminosa tão secreta que nem mesmo agências como a M16 e a CIA sabem da sua existência, a tal Quantum do título. Ela tem como seu principal mentor Dominic Green (o sempre ótimo Mathieu Almaric, de “O Escafandro e a Borboleta”), o qual pretende lucrar com catástrofes ambientais geradas artificialmente em países sul-americanos, no caso do filme a Bolívia. Existe ainda uma subtrama política, já que os EUA pretendem apoiar um golpe de Estado em andamento, golpe este que facilitaria os planos de Green (ele receberia uma área desértica na Bolívia). Em paralelo, o agente 007 esbarra com Camille (a bela Olga Kurylenko, a ucraniana mais latina do mundo), uma outra agente em busca também de vingança. A verdade é que o filme se revela curto (apenas 105 minutos, um dos episódios mais curtos da franquia) para o desenvolvimento eficaz de um roteiro cheio de meandros, que muitas vezes lembra os chamados “filmes de máfia”, sempre repletos de nomes e acontecimentos que deixam o espectador confuso, e ainda com o “plus” já mencionado de sempre estarmos fazendo conexões com o longa de 2006 para compreendermos os objetivos de Bond.

Esse desenvolvimento ainda resta mais atropelado pela incompetência do diretor Marc Forster (de “O Caçador de Pipas” e “A Última Ceia”) em filmar cenas de ação. Quase todas as seqüências de ação possuem uma edição muito rápida, além de uma câmera trêmula, o que dificulta a compreensão da platéia, fazendo com que ela não se envolva muito com o que vê na tela. Símbolo disso é a seqüência de abertura pré-créditos, uma da mais fracas da série, sem dúvida, quando Bond destrói logo de cara um Aston Martin ao fim de uma perseguição que não entendemos muito bem. Mesmo a cena da ópera, que poderia render uma seqüência antológica, acaba insatisfatória, mostrando-se também confusa. Mas, ainda falando sobre este aspecto, nem tudo soa medíocre. A passagem da luta nas cordas de sinos é muito boa, bastante inteligente.

Por outro lado, alguns pontos positivos devem ser destacados. Daniel Craig avançou ainda mais na composição de Bond, mostrando uma introspecção ainda maior do agente que o leva inclusive a uma brutalidade e sede de vingança sem precedentes (o rastro de sangue que 007 deixa nesse episódio é algo talvez nunca visto antes). Craig, sem dúvida, já pode disputar o título de melhor agente 007 com Sean Connery, tamanha a sua adequação ao papel, além da renovação que conferiu ao personagem. Da mesma forma Jude Dench está ótima mais uma vez na pele de M, a chefe imediata de 007 no serviço secreto britânico, assim como Mathieu Almaric faz o que pode com o seu limitado vilão (não está entre os mais marcantes da série). Já Olga Kurylenko, mesmo bela, parece sofrer com sua personagem por dois motivos: o primeiro é que ele é fraco, nem de longe lembrando a enigmática Vésper de “Cassino”; o segundo é que Olga era uma modelo, sem muita experiência na interpretação, o que a deixa em patamares bem inferiores ao de Eva Green, uma atriz que está bem longe de ser apenas um rosto lindo (e bota lindo nisso!). Outro aspecto positivo é o tom crítico e antenado com a geopolítica atual, mostrando os interesses espúrios de grandes corporações (as grandes vilãs do cinema atual) e de governos de países ricos (mormente os EUA da era Bush, que finalmente acabou, graças ao bom Deus!).

Alguns fãs ainda irão se queixar da ausência da famosa frase “meu nome é Bond, James Bond”, uma das marcas registradas da série ao longo de décadas. Mas não poderão reclamar da seqüência de créditos. Todos que acompanham a franquia sabem que os créditos sempre foram mostrados de forma esmerada e este novo longa não fica atrás. A canção “Another Way To Die”, composta e interpretada por Jack White e Alicia Keys, é ótima e a volta das silhuetas femininas nas imagens é muito bem-vinda.

Saldo final: o novo Bond ainda consegue entreter o espectador, tem seus bons momentos, mas ficou um pouco distante do brilhantismo de “Cassino Royale”. O que não dá para entender é porque o realizadores optaram por Marc Forster para a direção. Sabe aquela história de “em time que está ganhando não se mexe?”. Pois é, desejo que na próxima oportunidade eles lembrem de trazer Martin Campbell de volta para o cargo de “técnico”. Ah, e pra que colocar a famosa cena do tiro em direção à câmera (marca registrada da série) apenas no fim da exibição e não no início? Essa coisa de querer ser diferente só por ser diferente é atitude de adolescente chato...

Cotação: *** (três estrelas)
Nota: 7,0

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Não é sobre cinema



O blog é sobre cinema, mas acho que todos vão entender porque vou abrir uma exceção para falar de História (assim, com H maiúsculo).


Mãos Dadas

Recordando os meus tempos de pré-escola, acabei por lembrar de um colega que sempre tinha em muita conta. Era um garoto muito legal e simpático, com quem eu sempre jogava as peladas do recreio e com quem eu compartilhava o nome: Fábio. Ele me chamava de “Fábio Henrique” e eu o chamava de “Fábio Silva”, assim como o restante da turma, para não ocorrer confusão.

Entretanto, as atitudes de algumas pessoas me deixavam confuso. Fora da minha turma da escola e da minha casa, era comum ouvir de dizer que negros eram pessoas “inferiores”, que “cheiravam a macaco” ou que quando alguém fazia algo de errado isso era “coisa de nêgo”. Isso para mim não fazia o menor sentido. Eu sempre lembrava que o Fábio Silva era negro, mas era um menino legal, até mais legal do que garotos brancos como eu, e que de “inferior” e “macaco” ele não tinha nada. Os anos passaram, eu mudei de colégio e nunca mais vi Fábio Silva. De qualquer forma, as lembranças daquelas tardes em que jogava bola com meu amigo “de cor” nunca se apagaram.

Tempos mais tarde, com forte influência de uma família de orientação política de esquerda (meu avô materno é um ex-deputado estadual cassado e preso durante o regime militar), eu havia me tornado um adolescente politizado que, ademais, adorava ler livros de História, fosse geral ou do Brasil. Foi nessa época que comecei a ter mais contato com as idéias de um certo Martin Luther King Jr., um líder negro norte-americano que durante o fim dos anos 50 até 1968, ano em que foi assassinado, lutou pelos direitos civis dos afro-descendentes em sua terra, os Estados Unidos da América. “Eu tenho um sonho, o sonho de que um dia os homens possam ser julgados não pela cor de sua pele, mas pelo seu caráter” era uma das frases mais inspiradoras que um jovem como eu poderia ler e ouvir e que poderia ser aplicada às mais diversas formas de discriminação, seja de raça, etnia, sexo, classe social... O pastor acabou se tornando uma das minhas grandes referências, ao lado de nomes como Ernesto “Che” Guevara, Gandhi, os Beatles (sou fã da banda não apenas por suas lindas canções, mas porque eles também mudaram o mundo) e o homem Jesus de Nazaré (à parte as religiões, uma dos grandes revolucionários da História, sem dúvida).

Mais alguns anos se passaram, eu já estava me tornando um homem e começando a ficar descrente de que minha geração pudesse ver mudanças significativas não apenas na sociedade brasileira como na internacional, no mundo enfim (jovens são assim mesmo, imediatistas e apressados). Todavia, em 2002 algo de diferente aconteceu no Brasil. Um certo torneiro mecânico que durante anos havia tentado se eleger sem sucesso, acabou se tornando mandatário máximo da nação. A eleição de Luís Inácio Lula da Silva para a presidência da República me fez acreditar que era possível transformar a realidade dentro de um sistema democrático, sem necessariamente nos valermos de “processos revolucionários” para tanto. Mesmo que Lula não tenha atendido a todas as expectativas do povo brasileiro, o que seria humanamente impossível é bom dizer, o só fato de ver um operário num lugar que até então era cativo das classes abastadas já representou uma enorme mudança, uma transformação que, como dito acima, eu já não acreditava mais ver. “É, as coisas podem mudar, sim...”, passei a refletir.

Contudo, se o Brasil parecia respirar novos ares, o plano internacional se mostrava nefasto. Os EUA, a grande potência econômica e militar do globo terrestre, tinha em seu governo George W. Bush, um representante de tudo que a política norte-americana tem de pior, um retrógrado belicoso cujas atitudes lembram a de um xerife nos tempos do velho Oeste. Suas ações estapafúrdias, principalmente no Iraque, fizeram o mundo esquecer do 11 de setembro e se colocar contra o poderio ianque. A luz poderia vir nas eleições de 2004, onde todos esperavam que os americanos retirassem seu líder belicoso do poder. Qual não é a surpresa quando eles reelegem George Bush: “o problema está mesmo nesse povo estúpido”, pensei. Mais quatro anos se passaram, e, como cereja do bolo, o governo irresponsável do texano ainda mergulhou o mundo em uma crise econômica que não era vista desde 1929.

Mas eis que surge um certo Barack Obama, senador pelo estado de Illinois que, com seu carisma e discurso renovador, prometia novos parâmetros na política do Tio Sam. E duas características suas chamam a atenção: seu nome de origem islâmica (é bom lembrar os grandes desentendimentos entre americanos e islâmicos nas últimas décadas) e um outro talvez ainda mais significativo: a cor de sua pele. Barack Obama é negro (mesmo que não muito escuro, uma vez que filho de mãe branca). E logo me veio à memória o sonho de Luther King: “será que finalmente veremos um homem ser julgado pelo seu caráter e não pela cor de sua pele?”. Ao longo das prévias do Partido Democrata, em que Obama enfrentou uma dura batalha contra uma concorrente que também representaria uma grande mudança (seria a primeira mulher a ser eleita presidente dos EUA), sempre fiquei desconfiado se seria realmente possível um candidato negro ser eleito presidente ou até mesmo passar pelas ditas prévias. Há alguns meses soubemos que ele obteve a indicação do partido. Uma barreira já havia sido transposta.

E hoje acordo com a notícia de que Obama foi eleito presidente dos Estados Unidos. Na TV, pude acompanhar a festa nas ruas de Chicago (capital do Estado de Illinois) e por todo o território ianque. O que mais me chamou a atenção foi o fato de ver brancos e negros lado a lado, vibrando e sorrindo por terem ajudado a eleger aquele mestiço de nome “estrangeiro”. Além disso, a imagem de Obama e sua família ao lado do vice Joe Biden e sua respectiva esposa, ambos brancos e louros, todos de mãos dadas, é símbolo de um país transformado ou, porque não dizer, um mundo transformado, tão grande é a influência americana perante as outras nações. Sim, neste 05 de novembro senti que algo de diferente aconteceu. Se, há alguns anos, o Brasil parecia adentrar em um novo tempo, hoje o mundo inteiro parece respirar uma nova era. Talvez Barack Obama não faça um grande governo, é verdade, traga decepções (certamente as trará, pois ninguém é um messias), ponha os pés pelas mãos. Mas só o fato de ver um negro eleito presidente naquele país, onde há apenas 40 anos o famoso líder negro era assassinado por dizer que brancos e negros eram iguais, já é suficiente para fazer surgir um sorriso, mesmo que pequeno, no rosto de todos aqueles que um dia imaginaram um planeta um pouco mais justo.

Creio que realmente eu estava equivocado anos atrás. Sim, as coisas mudam... Podem demorar a acontecer, talvez não aconteçam na velocidade que esperamos (afinal, nosso tempo de vida é tão breve, não é mesmo?). Mas... mudam!

Acho que Fábio Silva, aquele meu amigo dos tempos da pré-escola, das peladas no recreio, também deve estar sorrindo neste momento...

domingo, 2 de novembro de 2008

Linha de Passe

A vida é um jogo

O futebol é uma das grandes paixões do brasileiro, disso ninguém duvida. Mas também é notável a incapacidade do cinema nacional em filmar este esporte, ou mesmo de desenvolver roteiros decentes com a temática do futebol. “Linha de Passe”, o mais recente trabalho de Walter Salles, em parceria com Daniela Thomas (a mesma dupla de “Terra Estrangeira” e “O Primeiro Dia”) na direção, talvez seja um dos raros casos de filme que envereda pela seara do esporte bretão com sucesso, mesmo que neste caso o futebol represente um elemento da trama e não o seu mote central.

O futebol, quem acompanha sabe, é uma grande metáfora da vida. Em nenhum outro esporte o imponderável se faz tão presente. Não é à toa que as “zebras” aconteçam de forma tão freqüente neste jogo que, até por isso, acaba se transformando no mais emocionante de todos. Quantas vezes você já não viu seu time perder mesmo sendo muito superior em campo ao adversário? Assim é o futebol, assim é a vida.

Tomando essas características emprestadas para sua obra, o roteiro, o qual foi escrito pela própria Daniela Thomas em parceria com Bráulio Mantovani (o mesmo de “Última Parada 174” e “Cidade de Deus”) e George Moura, nos apresenta à família de Cleuza (Sandra Corveloni, que recebeu o prêmio de melhor atriz no festival de Cannes 2008), mãe de quatro filhos, todos de pais diferentes. Dario (Vinícius de Oliveira) pretende ser jogador de futebol. O problema é que ele atingiu a idade limite para a “peneira” nos clubes, 18 anos, o que reduz muito suas chances de ser aproveitado. Dênis (João Baldasserini) é motoboy, pai ausente e apresenta uma tendência para a criminalidade. Dinho (José Geraldo Rodrigues) é evangélico, mas parece já ter tido problemas de delinqüência no passado e, finalmente, Reginaldo (Kaique de Jesus Santos), o mais novo dos quatro com seus 9 ou 10 anos de idade, passa os dias entre a escola e longas viagens de ônibus. Ele sabe que seu pai é motorista e busca encontrá-lo em um desses passeios. Vale acrescentar que Creuza está grávida de um quinto filho, cujo pai também não se sabe onde está. Dentro da dura realidade da periferia onde vivem, os personagens parecem estar o tempo inteiro “na marca do pênalti”. As dificuldades que enfrentam parecem intransponíveis e as decisões, os caminhos a serem seguidos, parecem surgir a cada novo fotograma. Decisões difíceis, diga-se de passagem. O peso de suas vidas ultrapassa a tela e atinge o espectador. Cabe destacar ainda a volta de Salles a um velho tema seu, a ausência paterna, que já havia sido explorado em “Central do Brasil” (óbvio que o fato de nenhum dos rapazes ter crescido com seus respectivos pais é gratuito).

Para retratar essa realidade asfixiante, a dupla de diretores optou por uma fotografia dessaturada (de Mauro Pinheiro Jr.), aliás, algo até comum nos filmes de Salles (como em “Central do Brasil”), contando ainda com aquele mesmo “cheiro” do neo-realismo italiano que permeia toda sua obra. Uma fotografia que transmite uma sensação de tristeza ainda mais acentuada pela trilha de Gustavo Santaolalla (que já havia trabalhado com Salles em “Diários de Motocicleta”). Todavia, o que mais se destaca em “Linha de Passe” é mesmo o elenco. Impressionante como todos parecem perfeitos em seus papéis, encarnando seus personagens com uma naturalidade tão grande que nos fazem por vezes esquecer que estamos vendo atores representando. Realmente gratificante perceber que os críticos, público e júri de Cannes perceberam isso e agraciaram o filme com o prêmio de melhor atriz. Kaíque, por exemplo, dá um banho no inconstante Michel Gomes, que interpretou Sandro do Nascimento em “Ùltima Parada 174”. Vale dizer, não apenas no quesito interpretação “Linha de Passe” se mostra superior ao longa de Bruno Barreto. É notável como a simplicidade do primeiro contrasta com a hiperdramatização do segundo, como seu teor melodramático formulado para levar o espectador às lágrimas.

Mas, acima, eu falava da relação deste longa em resenha com o futebol. Pois bem, ela se torna ainda mais clara em uma determinada seqüência, quando Dario está para cobrar uma penalidade. Se em uma partida um pênalti pode decidir o seu destino, na vida um dado momento, uma escolha, um passo dado pode alterar completamente o seu rumo. O imponderável estará sempre presente.

Muitos talvez venham a se queixar que o término de “Linha de Passe” é excessivamente aberto, pois que deixa indefinidos os destinos dos personagens. Na realidade, creio que não haveria melhor opção. Seus personagens se tornam ainda mais reais ao possuírem futuros ainda a serem escritos, assim como os nossos.

Cotação: ****1/2 (quatro estrelas e meia)
Nota: 9,5.